Wednesday 23 June 2021

Letter from Pero Vaz de Caminha to King Manuel I of Portugal Announcing the Brazil's Discovery (in Portuguese)

 Senhor:

 

Posto que o Capitão-mor desta vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a nova do achamento desta vossa terra nova, que ora nesta navegação se achou, não deixarei também de dar disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que -para o bem contar e falar- o saiba pior que todos fazer.

Tome Vossa Alteza, porém, minha ignorância por boa vontade, e creia bem por certo que, para aformosear nem afear, não porei aqui mais do que aquilo que vi e me pareceu.

Da marinhagem e singraduras do caminho não darei aqui conta a Vossa Alteza, porque o não saberei fazer, e os pilotos devem ter esse cuidado. Portanto, Senhor, do que hei de falar começo e digo:

A partida de Belém, como Vossa Alteza sabe, foi segunda-feira, 9 de março. Sábado, 14 do dito mês, entre as oito e nove horas, nos achamos entre as Canárias, mais perto da Grã Canária, e ali andamos todo aquele dia em calma, à vista delas, obra de três a quatro léguas. E domingo, 22 do dito mês, às dez horas, pouco mais ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo Verde, ou melhor, da ilha de S. Nicolau, segundo o dito de Pero Escolar, piloto.

Na noite seguinte, segunda-feira, ao amanhecer, se perdeu da frota Vasco de Ataíde com sua nau, sem haver tempo forte nem contrário para que tal acontecesse. Fez o capitão suas diligências para o achar, a uma e outra parte, mas não apareceu mais!

E assim seguimos nosso caminho, por este mar, de longo, até que, terça-feira das Oitavas de Páscoa, que foram 21 dias de abril, estando da dita Ilha obra de 660 ou 670 léguas, segundo os pilotos diziam, topamos alguns sinais de terra, os quais eram muita quantidade de ervas compridas, a que os mareantes chamam botelho, assim como outras a que dão o nome de rabo-de-asno. E quarta-feira seguinte, pela manhã, topamos aves a que chamam fura-buxos.

Neste dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! Primeiramente dum grande monte, mui alto e redondo; e doutras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos: ao monte alto o capitão pôs nome -o Monte Pascoal e à terra- a Terra da Vera Cruz.

Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças; e ao sol posto, obra de seis léguas da terra, surgimos âncoras, em dezenove braças -ancoragem limpa. Ali permanecemos toda aquela noite. E à quinta-feira, pela manhã, fizemos vela e seguimos em direitos à terra, indo os navios pequenos diante, por dezessete, dezesseis, quinze, catorze, treze, doze, dez e nove braças, até meia légua da terra, onde todos lançamos âncoras em frente à boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem às dez horas pouco mais ou menos.

Dali avistamos homens que andavam pela praia, obra de sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos, por chegarem primeiro.

Então lançamos fora os batéis e esquifes, e vieram logo todos os capitães das naus a esta nau do Capitão-mor, onde falaram entre si.

E o Capitão-mor mandou em terra no batel a Nicolau Coelho para ver aquele rio. E tanto que ele começou de ir para lá, acudiram pela praia homens, quando aos dois, quando aos três, de maneira que, ao chegar o batel à boca do rio, já ali havia dezoito ou vinte homens.

Eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Nas mãos traziam arcos com suas setas. Vinham todos rijos sobre o batel; e Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os pousaram.

Ali não pôde deles haver fala, nem entendimento de proveito, por o mar quebrar na costa. Somente deu-lhes um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça e um sombreiro preto. Um deles deu-lhe um sombreiro de penas de ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas como de papagaio; e outro deu-lhe um ramal grande de continhas brancas, miúdas, que querem parecer de aljaveira, as quais peças creio que o Capitão manda a Vossa Alteza, e com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder haver deles mais fala, por causa do mar.

Na noite seguinte, ventou tanto sueste com chuvaceiros que fez caçar as naus, e especialmente a capitânia. E sexta pela manhã, às oito horas, pouco mais ou menos, por conselho dos pilotos, mandou o Capitão levantar âncoras e fazer vela; e fomos ao longo da costa, com os batéis e esquifes amarrados à popa na direção do norte, para ver se achávamos alguma abrigada e bom pouso, onde nos demorássemos, para tomar água e lenha. Não que nos minguasse, mas por aqui nos acertarmos.

Quando fizemos vela, estariam já na praia assentados perto do rio obra de sessenta ou setenta homens que se haviam juntado ali poucos e poucos. Fomos de longo, e mandou o Capitão aos navios pequenos que seguissem mais chegados à terra e, se achassem pouso seguro para as naus, que amainassem.

, velejando nós pela costa, obra de dez léguas do sítio donde tínhamos levantado ferro, acharam os ditos navios pequenos um recife com um porto dentro, muito bom e muito seguro, com uma mui larga entrada. E meteram-se dentro e amainaram. As naus arribaram sobre eles; e um pouco antes do sol posto amainaram também, obra de uma légua do recife, e ancoraram em onze braças.

E estando Afonso Lopes, nosso piloto, em um daqueles navios pequenos, por mandado do Capitão, por ser homem vivo e destro para isso, meteu-se logo no esquife a sondar o porto dentro; e tomou dois daqueles homens da terra, mancebos e de bons corpos, que estavam numa almadia. Um deles trazia um arco e seis ou sete setas; e na praia andavam muitos com seus arcos e setas; mas de nada lhes serviram. Trouxe-os logo, já de noite, ao Capitão, em cuja nau foram recebidos com muito prazer e festa.

A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem-feitos. Andam nus, sem nenhuma cobertura. Nem estimam de cobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocência como em mostrar o rosto. Ambos traziam os beiços de baixo furados e metidos neles seus ossos brancos e verdadeiros, de comprimento duma mão travessa, da grossura dum fuso de algodão, agudos na ponta como um furador. Metem-nos pela parte de dentro do beiço; e a parte que lhes fica entre o beiço e os dentes é feita como roque de xadrez, ali encaixado de tal sorte que não os molesta, nem os estorva no falar, no comer ou no beber.

Os cabelos seus são corredios. E andavam tosquiados, de tosquia alta, mais que de sobrepente, de boa grandura e rapados até por cima das orelhas. E um deles trazia por baixo da solapa, de fonte a fonte para detrás, uma espécie de cabeleira de penas de ave amarelas, que seria do comprimento de um coto, mui basta e mui cerrada, que lhe cobria o toutiço e as orelhas. E andava pegada aos cabelos, pena e pena, com uma confeição branda como cera (mas não o era), de maneira que a cabeleira ficava mui redonda e mui basta, e mui igual, e não fazia míngua mais lavagem para a levantar.

O Capitão, quando eles vieram, estava sentado em uma cadeira, bem vestido, com um colar de ouro mui grande ao pescoço, e aos pés uma alcatifa por estrado. Sancho de Tovar, Simão de Miranda, Nicolau Coelho, Aires Correia, e nós outros que aqui na nau com ele vamos, sentados no chão, pela alcatifa. Acenderam-se tochas. Entraram. Mas não fizeram sinal de cortesia, nem de falar ao Capitão nem a ninguém. Porém um deles pôs olho no colar do Capitão, e começou de acenar com a mão para a terra e depois para o colar, como que nos dizendo que ali havia ouro. Também olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e novamente para o castiçal como se lá também houvesse prata.

Mostraram-lhes um papagaio pardo que o Capitão traz consigo; tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como quem diz que os havia ali. Mostraram-lhes um carneiro: não fizeram caso. Mostraram-lhes uma galinha, quase tiveram medo dela: não lhe queriam pôr a mão; e depois a tomaram como que espantados.

Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, fartéis, mel e figos passados. Não quiseram comer quase nada daquilo; e, se alguma coisa provaram, logo a lançaram fora. Trouxeram-lhes vinho numa taça; mal lhe puseram a boca; não gostaram nada, nem quiseram mais. Trouxeram-lhes a água em uma albarrada. Não beberam. Mal a tomaram na boca, que lavaram, e logo a lançaram fora.

Viu um deles umas contas de rosário, brancas; acenou que lhas dessem, folgou muito com elas, e lançou-as ao pescoço. Depois tirou-as e enrolou-as no braço e acenava para a terra e de novo para as contas e para o colar do Capitão, como dizendo que dariam ouro por aquilo.

Isto tomávamos nós assim por assim o desejarmos. Mas se ele queria dizer que levaria as contas e mais o colar, isto não o queríamos nós entender, porque não lho havíamos de dar. E depois tornou as contas a quem lhas dera.

Então estiraram-se de costas na alcatifa, a dormir, sem buscarem maneira de cobrirem suas vergonhas, as quais não eram fanadas; e as cabeleiras delas estavam bem rapadas e feitas. O Capitão lhes mandou pôr por baixo das cabeças seus coxins; e o da cabeleira esforçava-se por não a quebrar. E lançaram-lhes um manto por cima; e eles consentiram, quedaram-se e dormiram.

Ao sábado pela manhã mandou o Capitão fazer vela, e fomos demandar a entrada, a qual era mui larga e alta de seis a sete braças. Entraram todas as naus dentro; e ancoraram em cinco ou seis braças, ancoragem dentro tão grande, tão formosa e tão segura, que podem abrigar-se nela mais de duzentos navios e naus. E tanto que as naus quedaram ancoradas, todos os capitães vieram a esta nau do Capitão-mor. E daqui mandou o Capitão a Nicolau Coelho e Bartolomeu Dias que fossem em terra e levassem aqueles dois homens e os deixassem ir com seu arco e setas, e isto depois que fez dar a cada um sua camisa nova, sua carapuça vermelha e um rosário de contas brancas de osso, que eles levaram nos braços, seus cascavéis e suas campainhas. E mandou com eles, para lá ficar, um mancebo degredado, criado de D. João Telo, a que chamam Afonso Ribeiro, para lá andar com eles e saber de seu viver e maneiras. E a mim mandou que fosse com Nicolau Coelho.

Fomos assim de frecha direitos à praia. Ali acudiram logo obra de duzentos homens, todos nus, e com arcos e setas nas mãos. Aqueles que nós levávamos acenaram-lhes que se afastassem e pousassem os arcos; e eles os pousaram, mas não se afastaram muito. E mal pousaram os arcos, logo saíram os que nós levávamos, e o mancebo degredado com eles. E saídos não pararam mais; nem esperavam um pelo outro, mas antes corriam a quem mais corria. E passaram um rio que por ali corre, de água doce, de muita água que lhes dava pela braga; e outros muitos com eles. E foram assim correndo, além do rio, entre umas moitas de palmas onde estavam outros. Ali pararam. Entretanto foi-se o degredado com um homem que, logo ao sair do batel, o agasalhou e o levou até lá. Mas logo tornaram a nós; e com ele vieram os outros que nós leváramos, os quais vinham já nus e sem carapuças.

Então se começaram de chegar muitos. Entravam pela beira do mar para os batéis, até que mais não podiam; traziam cabaços de água, e tomavam alguns barris que nós levávamos: enchiam-nos de água e traziam-nos aos batéis. Não que eles de todos chegassem à borda do batel. Mas junto a ele, lançavam os barris que nós tomávamos; e pediam que lhes dessem alguma coisa. Levava Nicolau Coelho cascavéis e manilhas. E a uns dava um cascavel, a outros uma manilha, de maneira que com aquele engodo quase nos queriam dar a mão. Davam-nos daqueles arcos e setas por sombreiros e carapuças de linho ou por qualquer coisa que homem lhes queria dar.

Dali se partiram os outros dois mancebos, que os não vimos mais.

Muitos deles ou quase a maior parte dos que andavam ali traziam aqueles bicos de osso nos beiços. E alguns, que andavam sem eles, tinham os beiços furados e nos buracos uns espelhos de pau, que pareciam espelhos de borracha; outros traziam três daqueles bicos, a saber, um no meio e os dois nos cabos. Aí andavam outros, quartejados de cores, a saber, metade deles da sua própria cor, e metade de tintura preta, a modos de azulada; e outros quartejados de escaques. Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem moças e bem gentis, com cabelos muito pretos, compridos pelas espáduas, e suas vergonhas tão altas, tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as muito bem olharmos, não tínhamos nenhuma vergonha.

Ali por então não houve mais fala ou entendimento com eles, por a barbaria deles ser tamanha, que se não entendia nem ouvia ninguém.

Acenamos-lhes que se fossem; assim o fizeram e passaram-se além do rio. Saíram três ou quatro homens nossos dos batéis, e encheram não sei quantos barris de água que nós levávamos e tornamo-nos às naus. Mas quando assim vínhamos, acenaram-nos que tornássemos. Tornamos e eles mandaram o degredado e não quiseram que ficasse lá com eles. Este levava uma bacia pequena e duas ou três carapuças vermelhas para lá as dar ao senhor, se o lá houvesse. Não cuidaram de lhe tomar nada, antes o mandaram com tudo. Mas então Bartolomeu Dias o fez outra vez tornar, ordenando que lhes desse aquilo. E ele tornou e o deu, à vista de nós, àquele que da primeira vez agasalhara. Logo voltou e nós trouxemo-lo.

Esse que o agasalhou era já de idade, e andava por louçainha todo cheio de penas, pegadas pelo corpo, que parecia asseteado como S. Sebastião. Outros traziam carapuças de penas amarelas; outros, de vermelhas; e outros de verdes. E uma daquelas moças era toda tingida, de baixo a cima daquela tintura; e certo era tão bem-feita e tão redonda, e sua vergonha (que ela não tinha) tão graciosa, que a muitas mulheres da nossa terra, vendo-lhe tais feições, fizera vergonha, por não terem a sua como ela. Nenhum deles era fanado, mas, todos assim como nós. E com isto nos tornamos e eles foram-se.

À tarde saiu o Capitão-mor em seu batel com todos nós outros e com os outros capitães das naus em seus batéis a folgar pela baía, em frente da praia. Mas ninguém saiu em terra, porque o Capitão o não quis, sem embargo de ninguém nela estar. Somente saiu -ele com todos nós- em um ilhéu grande, que na baía está e que na baixa-mar fica mui vazio. Porém é por toda a parte cercado de água, de sorte que ninguém lá pode ir, a não ser de barco ou a nado. Ali folgou ele e todos nós outros, bem uma hora e meia. E alguns marinheiros, que ali andavam com um chinchorro, pescaram peixe miúdo, não muito. Então volvemo-nos às naus, já bem de noite.

Ao domingo de Pascoela pela manhã, determinou o Capitão de ir ouvir missa e pregação naquele ilhéu. Mandou a todos os capitães que se aprestassem nos batéis e fossem com ele. E assim foi feito. Mandou naquele ilhéu armar um esperavel, e dentro dele um altar mui bem corregido. E ali com todos nós outros fez dizer missa, a qual foi dita pelo padre frei Henrique, em voz entoada, e oficiada com aquela mesma voz pelos outros padres e sacerdotes, que todos eram ali. A qual missa, segundo meu parecer, foi ouvida por todos com muito prazer e devoção.

Ali era com o Capitão a bandeira de Cristo, com que saiu de Belém, a qual esteve sempre levantada, da parte do Evangelho.

Acabada a missa, desvestiu-se o padre e subiu a uma cadeira alta; e nós todos lançados por essa areia. E pregou uma solene e proveitosa pregação da história do Evangelho, ao fim da qual tratou da nossa vinda e do achamento desta terra, conformando-se com o sinal da Cruz, sob cuja obediência viemos, o que foi muito a propósito e fez muita devoção.

Enquanto estivemos à missa e à pregação, seria na praia outra tanta gente, pouco mais ou menos como a de ontem, com seus arcos e setas, a qual andava folgando. E olhando-nos, sentaram-se. E, depois de acabada a missa, assentados nós à pregação, levantaram-se muitos deles, tangeram corno ou buzina, e começaram a saltar e dançar um pedaço. E alguns deles se metiam em almadias -duas ou três que aí tinham- as quais não são feitas como as que eu já vi; somente são três traves, atadas entre si. E ali se metiam quatro ou cinco, ou esses que queriam não se afastando quase nada da terra, senão enquanto podiam tomar pé.

Acabada a pregação, voltou o Capitão, com todos nós, para os batéis, com nossa bandeira alta. Embarcamos e fomos todos em direção à terra para passarmos ao longo por onde eles estavam, indo, na dianteira, por ordem do Capitão, Bartolomeu Dias em seu esquife, com um pau de uma almadia que lhes o mar levara, para lho dar; e nós todos, obra de tiro de pedra, atrás dele.

Como viram o esquife de Bartolomeu Dias, chegaram-se logo todos à água, metendo-se nela até onde mais podiam. Acenaram-lhes que pousassem os arcos; e muitos deles os iam logo pôr em terra; e outros não.

Andava aí um que falava muito aos outros que se afastassem, mas não que a mim me parecesse que lhe tinham acatamento ou medo. Este que os assim andava afastando trazia seu arco e setas, e andava tinto de tintura vermelha pelos peitos, espáduas, quadris, coxas e pernas até baixo, mas os vazios com a barriga e estômago eram de sua própria cor. E a tintura era assim vermelha que a água a não comia nem desfazia, antes, quando saía da água, parecia mais vermelha.

Saiu um homem do esquife de Bartolomeu Dias e andava entre eles, sem implicarem nada com ele para fazer-lhe mal. Antes lhe davam cabaças de água, e acenavam aos do esquife que saíssem em terra.

Com isto se volveu Bartolomeu Dias ao Capitão; e viemo-nos às naus, a comer, tangendo gaitas e trombetas, sem lhes dar mais opressão. E eles tornaram-se a assentar na praia e assim por então ficaram.

Neste ilhéu, onde fomos ouvir missa e pregação, a água espraia muito, deixando muita areia e muito cascalho a descoberto. Enquanto aí estávamos, foram alguns buscar marisco e apenas acharam alguns camarões grossos e curtos, entre os quais vinha um tão grande e tão grosso, como em nenhum tempo vi tamanho. Também acharam cascas de berbigões e amêijoas, mas não toparam com nenhuma peça inteira.

E tanto que comemos, vieram logo todos os capitães a esta nau, por ordem do Capitão-mor, com os quais ele se apartou, e eu na companhia. E perguntou a todos se nos parecia bem mandar a nova do achamento desta terra a Vossa Alteza pelo navio dos mantimentos, para a melhor a mandar descobrir e saber dela mais do que nós agora podíamos saber, por irmos de nossa viagem.

E entre muitas falas que no caso se fizeram, foi por todos ou a maior parte dito que seria muito bem. E nisto concluíram. E tanto que a conclusão foi tomada, perguntou mais se lhes parecia bem tomar aqui por força um par destes homens para os mandar a Vossa Alteza, deixando aqui por eles outros dois destes degredados.

Sobre isto acordaram que não era necessário tomar por força homens, porque era geral costume dos que assim levavam por força para alguma parte dizerem que há ali de tudo quanto lhes perguntam; e que melhor e muito melhor informação da terra dariam dois homens destes degredados que aqui deixassem, do que eles dariam se os levassem, por ser gente que ninguém entende. Nem eles tão cedo aprenderiam a falar para o saberem tão bem dizer que muito melhor estoutros o não digam, quando Vossa Alteza cá mandar. E que, portanto, não cuidassem de aqui tomar ninguém por força nem de fazer escândalo, para de todo mais os amansar e apacificar, senão somente deixar aqui os dois degredados, quando daqui partíssemos.

E assim, por melhor a todos parecer, ficou determinado.

Acabado isto, disse o Capitão que fôssemos nos batéis em terra e ver-se-ia bem como era o rio, e também para folgarmos.

Fomos todos nos batéis em terra, armados e a bandeira conosco. Eles andavam ali na praia, à boca do rio, para onde nós íamos; e, antes que chegássemos, pelo ensino que dantes tinham, puseram todos os arcos, e acenavam que saíssemos. Mas, tanto que os batéis puseram as proas em terra, passaram-se logo todos além do rio, o qual não é mais largo que um jogo de mancal. E mal desembarcamos, alguns dos nossos passaram logo o rio, e meteram-se entre eles. Alguns aguardavam; outros afastavam-se. Era, porém, a coisa de maneira que todos andavam misturados. Eles ofereciam desses arcos com suas setas por sombreiros e carapuças de linho ou por qualquer coisa que lhes davam.

Passaram além tantos dos nossos, e andavam assim misturados com eles, que eles se esquivavam e afastavam-se. E deles alguns iam-se para cima onde outros estavam.

Então o Capitão fez que dois homens o tomassem ao colo, passou o rio, e fez tornar a todos. A gente que ali estava não seria mais que a costumada. E tanto que o Capitão fez tornar a todos, vieram a ele alguns daqueles, não porque o conhecessem por Senhor, pois me parece que não entendem, nem tomavam disso conhecimento, mas porque a gente nossa passava já para aquém do rio.

Ali falavam e traziam muitos arcos e continhas daquelas já ditas, e resgatavam-nas por qualquer coisa, em tal maneira que os nossos trouxeram dali para as naus muitos arcos e setas e contas.

Então tornou-se o Capitão aquém do rio, e logo acudiram muitos à beira dele.

Ali veríeis galantes, pintados de preto e vermelho, e quartejados, assim nos corpos, como nas pernas, que, certo, pareciam bem assim.

Também andavam, entre eles, quatro ou cinco mulheres moças, nuas como eles, que não pareciam mal. Entre elas andava uma com uma coxa, do joelho até o quadril, e a nádega, toda tinta daquela tintura preta; e o resto, tudo da sua própria cor. Outra trazia ambos os joelhos, com as curvas assim tintas, e também os colos dos pés; e suas vergonhas tão nuas e com tanta inocência descobertas, que nisso não havia nenhuma vergonha.

Também andava aí outra mulher moça com um menino ou menina ao colo, atado com um pano (não sei de quê) aos peitos, de modo que apenas as perninhas lhe apareciam. Mas as pernas da mãe e o resto não traziam pano algum.

Depois andou o Capitão para cima ao longo do rio, que corre sempre chegado à praia. Ali esperou um velho, que trazia na mão uma pá de almadia. Falava, enquanto o Capitão esteve com ele, perante nós todos, sem nunca ninguém o entender, nem ele a nós quantas coisas que lhe demandávamos acerca de ouro, que nós desejávamos saber se na terra havia.

Trazia este velho o beiço tão furado, que lhe caberia pelo furo um grande dedo polegar, e metida nele uma pedra verde, ruim, que cerrava por fora esse buraco. O Capitão lha fez tirar. E ele não sei que diabo falava e ia com ela direito ao Capitão, para lha meter na boca. Estivemos sobre isso rindo um pouco; e então enfadou-se o Capitão e deixou-o. E um dos nossos deu-lhe pela pedra um sombreiro velho, não por ela valer alguma coisa, mas por amostra. Depois houve-a o Capitão, segundo creio, para, com as outras coisas, a mandar a Vossa Alteza.

Andamos por aí vendo a ribeira, a qual é de muita água e muito boa. Ao longo dela há muitas palmas, não muito altas, em que há muito bons palmitos. Colhemos e comemos deles muitos.

Então tornou-se o Capitão para baixo para a boca do rio, onde havíamos desembarcado.

Além do rio, andavam muitos deles dançando e folgando, uns diante dos outros, sem se tomarem pelas mãos. E faziam-no bem. Passou-se então além do rio Diogo Dias, almoxarife que foi de Sacavém, que é homem gracioso e de prazer; e levou consigo um gaiteiro nosso com sua gaita. E meteu-se com eles a dançar, tomando-os pelas mãos; e eles folgavam e riam, e andavam com ele muito bem ao som da gaita. Depois de dançarem, fez-lhes ali, andando no chão, muitas voltas ligeiras, e salto real, de que eles se espantavam e riam e folgavam muito. E conquanto com aquilo muito os segurou e afagou, tomavam logo uma esquiveza como de animais monteses, e foram-se para cima.

E então o Capitão passou o rio com todos nós outros, e fomos pela praia de longo, indo os batéis, assim, rente da terra. Fomos até uma lagoa grande de água doce, que está junto com a praia, porque toda aquela ribeira do mar é apaulada por cima e sai a água por muitos lugares.

E depois de passarmos o rio, foram uns sete ou oito deles andar entre os marinheiros que se recolhiam aos batéis. E levaram dali um tubarão, que Bartolomeu Dias matou, lhes levou e lançou na praia.

Bastará dizer-vos que até aqui, como quer que eles um pouco se amansassem, logo duma mão para outra se esquivavam, como pardais, do cevadoiro. Homem não lhes ousa falar de rijo para não se esquivarem mais; e tudo se passa como eles querem, para os bem amansar.

O Capitão ao velho, com quem falou, deu uma carapuça vermelha. E com toda a fala que entre ambos se passou e com a carapuça que lhe deu, tanto que se apartou e começou de passar o rio, foi-se logo recatando e não quis mais tornar de lá para aquém.

Os outros dois, que o Capitão teve nas naus, a que deu o que já disse, nunca mais aqui apareceram, do que tiro ser gente bestial, de pouco saber e por isso tão esquiva. Porém e com tudo isso andam muito bem curados e muito limpos. E naquilo me parece ainda mais que são como aves ou alimárias monteses, às quais faz o ar melhor pena e melhor cabelo que às mansas, porque os corpos seus são tão limpos, tão gordos e tão formosos, que não pode mais ser.

Isto me faz presumir que não têm casas nem moradas a que se acolham, e o ar, a que se criam, os faz tais. Nem nós ainda até agora vimos nenhuma casa ou maneira delas.

Mandou o Capitão aquele degredado Afonso Ribeiro, que se fosse outra vez com eles. Ele foi e andou lá um bom pedaço, mas à tarde tornou-se, que o fizeram eles vir e não o quiseram lá consentir. E deram-lhe arcos e setas; e não lhe tomaram nenhuma coisa do seu. Antes -disse ele- que um lhe tomara umas continhas amarelas, que levava, e fugia com elas, e ele se queixou e os outros foram logo após, e lhas tomaram e tornaram-lhas a dar; e então mandaram-no vir. Disse que não vira lá entre eles senão umas choupaninhas de rama verde e de fetos muito grandes, como de Entre Douro e Minho.

E assim nos tornamos às naus, já quase noite, a dormir.

À segunda-feira, depois de comer, saímos todos em terra a tomar água. Ali vieram então muitos, mas não tantos como as outras vezes. Já muito poucos traziam arcos. Estiveram assim um pouco afastados de nós; e depois pouco a pouco misturaram-se conosco. Abraçavam-nos e folgavam. E alguns deles se esquivavam logo. Ali davam alguns arcos por folhas de papel e por alguma carapucinha velha ou por qualquer coisa. Em tal maneira isto se passou, que bem vinte ou trinta pessoas das nossas se foram com eles, onde outros muitos estavam com moças e mulheres. E trouxeram de lá muitos arcos e barretes de penas de aves, deles verdes e deles amarelos, dos quais, creio, o Capitão há de mandar amostra a Vossa Alteza.

E, segundo diziam esses que lá foram, folgavam com eles. Neste dia os vimos mais de perto e mais à nossa vontade, por andarmos quase todos misturados. Ali, alguns andavam daquelas tinturas quartejados; outros de metades; outros de tanta feição, como em panos de armar, e todos com os beiços furados, e muitos com os ossos neles, e outros sem ossos.

Alguns traziam uns ouriços verdes, de árvores, que, na cor, queriam parecer de castanheiros, embora mais pequenos. E eram cheios duns grãos vermelhos pequenos, que, esmagando-os entre os dedos, faziam tintura muito vermelha, de que eles andavam tintos. E quanto mais se molhavam, tanto mais vermelhos ficavam.

Todos andam rapados até cima das orelhas; e assim as sobrancelhas e pestanas.

Trazem todos as testas, de fonte a fonte, tintas da tintura preta, que parece uma fita preta, da largura de dois dedos.

E o Capitão mandou aquele degredado Afonso Ribeiro e a outros dois degredados, que fossem lá andar entre eles; e assim a Diogo Dias, por ser homem ledo, com que eles folgavam. Aos degredados mandou que ficassem lá esta noite.

Foram-se lá todos, e andaram entre eles. E, segundo eles diziam, foram bem uma légua e meia a uma povoação, em que haveria nove ou dez casas, as quais eram tão compridas, cada uma, como esta nau capitânia. Eram de madeira, e das ilhargas de tábuas, e cobertas de palha, de razoada altura; todas duma só peça, sem nenhum repartimento, tinham dentro muitos esteios; e, de esteio a esteio, uma rede atada pelos cabos, alta, em que dormiam. Debaixo, para se aquentarem, faziam seus fogos. E tinha cada casa duas portas pequenas, uma num cabo, e outra no outro.

Diziam que em cada casa se recolhiam trinta ou quarenta pessoas, e que assim os achavam; e que lhes davam de comer daquela vianda, que eles tinham, a saber, muito inhame e outras sementes, que na terra há e eles comem. Mas, quando se fez tarde fizeram-nos logo tornar a todos e não quiseram que lá ficasse nenhum. Ainda, segundo diziam, queriam vir com eles.

Resgataram lá por cascavéis e por outras coisinhas de pouco valor, que levavam, papagaios vermelhos, muito grandes e formosos, e dois verdes pequeninos e carapuças de penas verdes, e um pano de penas de muitas cores, maneira de tecido assaz formoso, segundo Vossa Alteza todas estas coisas verá, porque o Capitão vo-las há de mandar, segundo ele disse.

E com isto vieram; e nós tornámo-nos às naus.

À terça-feira, depois de comer, fomos em terra dar guarda de lenha e lavar roupa.

Estavam na praia, quando chegamos, obra de sessenta ou setenta sem arcos e sem nada. Tanto que chegamos, vieram logo para nós, sem se esquivarem. Depois acudiram muitos, que seriam bem duzentos, todos sem arcos; e misturaram-se todos tanto conosco que alguns nos ajudavam a acarretar lenha e a meter nos batéis. E lutavam com os nossos e tomavam muito prazer.

Enquanto cortávamos a lenha, faziam dois carpinteiros uma grande Cruz, dum pau, que ontem para isso se cortou.

Muitos deles vinham ali estar com os carpinteiros. E creio que o faziam mais por verem a ferramenta de ferro com que a faziam, do que por verem a Cruz, porque eles não tem coisa que de ferro seja, e cortam sua madeira e paus com pedras feitas como cunhas, metidas em um pau entre duas talas, mui bem atadas e por tal maneira que andam fortes, segundo diziam os homens, que ontem a suas casas foram, porque lhas viram lá.

Era já a conversação deles conosco tanta, que quase nos estorvavam no que havíamos de fazer.

O Capitão mandou a dois degredados e a Diogo Dias que fossem lá à aldeia (e a outras, se houvessem novas delas) e que, em toda a maneira, não viessem dormir às naus, ainda que eles os mandassem. E assim se foram.

Enquanto andávamos nessa mata a cortar lenha, atravessavam alguns papagaios por essas árvores, deles verdes e outros pardos, grandes e pequenos, de maneira que me parece que haverá muitos nesta terra. Porém eu não veria mais que até nove ou dez. Outras aves então não vimos, somente algumas pombas-seixas, e pareceram-me bastante maiores que as de Portugal. Alguns diziam que viram rolas; eu não as vi. Mas, segundo os arvoredos são mui muitos e grandes, e de infindas maneiras, não duvido que por esse sertão haja muitas aves!

Cerca da noite nos volvemos para as naus com nossa lenha.

Eu creio, Senhor, que ainda não dei conta aqui a Vossa Alteza da feição de seus arcos e setas. Os arcos são pretos e compridos, as setas também compridas e os ferros delas de canas aparadas, segundo Vossa Alteza verá por alguns que -eu creio- o Capitão a Ela há de enviar.

À quarta-feira não fomos em terra, porque o Capitão andou todo o dia no navio dos mantimentos a despejá-lo e fazer levar às naus isso que cada uma podia levar. Eles acudiram à praia; muitos, segundo das naus vimos. No dizer de Sancho de Tovar, que lá foi, seriam obra de trezentos.

Diogo Dias e Afonso Ribeiro, o degredado, aos quais o Capitão ontem mandou que em toda maneira lá dormissem, volveram-se, já de noite, por eles não quererem que lá ficassem. Trouxeram papagaios verdes e outras aves pretas, quase como pegas, a não ser que tinham o bico branco e os rabos curtos.

Quando Sancho de Tovar se recolheu à nau, queriam vir com ele alguns, mas ele não quis senão dois mancebos dispostos e homens de prol. Mandou-os essa noite mui bem pensar e curar. Comeram toda a vianda que lhes deram; e mandou fazer-lhes cama de lençóis, segundo ele disse. Dormiram e folgaram aquela noite.

E assim não houve mais este dia que para escrever seja.

À quinta-feira, derradeiro de abril, comemos logo, quase pela manhã, e fomos em terra por mais lenha e água. E, em querendo o Capitão sair desta nau, chegou Sancho de Tovar com seus dois hóspedes. E por ele ainda não ter comido, puseram-lhe toalhas. Trouxeram-lhe vianda e comeu. Aos hóspedes, sentaram cada um em sua cadeira. E de tudo o que lhes deram comeram mui bem, especialmente lacão cozido, frio, e arroz.

Não lhes deram vinho, por Sancho de Tovar dizer que o não bebiam bem.

Acabado o comer, metemo-nos todos no batel e eles conosco. Deu um grumete a um deles uma armadura grande de porco montês, bem revolta. Tanto que a tomou, meteu-a logo no beiço, e, porque se lhe não queria segurar, deram-lhe uma pequena de cera vermelha. E ele ajeitou-lhe seu adereço detrás para ficar segura, e meteu-a no beiço, assim revolta para cima. E vinha tão contente com ela, como se tivesse uma grande jóia. E tanto que saímos em terra, foi-se logo com ela, e não apareceu mais aí.

Andariam na praia, quando saímos, oito ou dez deles; e de aí a pouco começaram a vir mais. E parece-me que viriam, este dia, à praia quatrocentos ou quatrocentos e cinqüenta.

Traziam alguns deles arcos e setas, que todos trocaram por carapuças ou por qualquer coisa que lhes davam. Comiam conosco do que lhes dávamos. Bebiam alguns deles vinho; outros o não podiam beber. Mas parece-me, que se lho avezarem, o beberão de boa vontade.

Andavam todos tão dispostos, tão bem-feitos e galantes com suas tinturas, que pareciam bem. Acarretavam dessa lenha, quanta podiam, com mui boa vontade, e levavam-na aos batéis.

Andavam já mais mansos e seguros entre nós, do que nós andávamos entre eles.

Foi o Capitão com alguns de nós um pedaço por este arvoredo até uma ribeira grande e de muita água que, a nosso parecer, era esta mesma, que vem ter à praia, e em que nós tomamos água.

Ali ficamos um pedaço, bebendo e folgando, ao longo dela, entre esse arvoredo, que é tanto, tamanho, tão basto e de tantas prumagens, que homens as não podem contar. Há entre ele muitas palmas, de que colhemos muitos e bons palmitos.

Quando saímos do batel, disse o Capitão que seria bom irmos direitos à Cruz, que estava encostada a uma árvore, junto com o rio, para se erguer amanhã, que é sexta-feira, e que nos puséssemos todos de joelhos e a beijássemos para eles verem o acatamento que lhe tínhamos. E assim fizemos. A esses dez ou doze que aí estavam, acenaram-lhe que fizessem assim, e foram logo todos beijá-la.

Parece-me gente de tal inocência que, se homem os entendesse e eles a nós, seriam logo cristãos, porque eles, segundo parece, não têm, nem entendem em nenhuma crença.

E portanto, se os degredados, que aqui hão de ficar aprenderem bem a sua fala e os entenderem, não duvido que eles, segundo a santa intenção de Vossa Alteza, se hão de fazer cristãos e crer em nossa santa fé, à qual praza a Nosso Senhor que os traga, porque, certo, esta gente é boa e de boa simplicidade. E imprimir-se-á ligeiramente neles qualquer cunho, que lhes quiserem dar. E pois Nosso Senhor, que lhes deu bons corpos e bons rostos, como a bons homens, por aqui nos trouxe, creio que não foi sem causa.

Portanto Vossa Alteza, que tanto deseja acrescentar a santa fé católica, deve cuidar da sua salvação. E prazerá a Deus que com pouco trabalho seja assim.

Eles não lavram, nem criam. Não há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha, nem qualquer outra alimária, que costumada seja ao viver dos homens. Nem comem senão desse inhame, que aqui há muito, e dessa semente e frutos, que a terra e as árvores de si lançam. E com isto andam tais e tão rijos e tão nédios, que o não somos nós tanto, com quanto trigo e legumes comemos.

Neste dia, enquanto ali andaram, dançaram e bailaram sempre com os nossos, ao som dum tamboril dos nossos, em maneira que são muito mais nossos amigos que nós seus.

Se lhes homem acenava se queriam vir às naus, faziam-se logo prestes para isso, em tal maneira que, se a gente todos quisera convidar, todos vieram. Porém não trouxemos esta noite às naus, senão quatro ou cinco, a saber: o Capitão-mor, dois; e Simão de Miranda, um, que trazia já por pajem; e Aires Gomes, outro, também por pajem.

Um dos que o Capitão trouxe era um dos hóspedes, que lhe trouxeram da primeira vez, quando aqui chegamos, o qual veio hoje aqui, vestido na sua camisa, e com ele um seu irmão; e foram esta noite mui bem agasalhados, assim de vianda, como de cama, de colchões e lençóis, para os mais amansar.

E hoje, que é sexta-feira, primeiro dia de maio, pela manhã, saímos em terra, com nossa bandeira; e fomos desembarcar acima do rio contra o sul, onde nos pareceu que seria melhor chantar a Cruz, para melhor ser vista. Ali assinalou o Capitão o lugar, onde fizessem a cova para a chantar.

Enquanto a ficaram fazendo, ele com todos nós outros fomos pela Cruz abaixo do rio, onde ela estava. Dali a trouxemos com esses religiosos e sacerdotes diante cantando, em maneira de procissão.

Eram já aí alguns deles, obra de setenta ou oitenta; e, quando nos viram assim vir, alguns se foram meter debaixo dela, para nos ajudar. Passamos o rio, ao longo da praia e fomo-la pôr onde havia de ficar, que será do rio obra de dois tiros de besta. Andando-se ali nisto, vieram bem cento e cinqüenta ou mais.

Chantada a Cruz, com as armas e a divisa de Vossa Alteza, que primeiramente lhe pregaram, armaram altar ao pé dela. Ali disse missa o padre frei Henrique, a qual foi cantada e oficiada por esses já ditos. Ali estiveram conosco a ela obra de cinqüenta ou sessenta deles, assentados todos de joelhos, assim como nós.

E quando veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em pé, com as mãos levantadas, eles se levantaram conosco e alçaram as mãos, ficando assim, até ser acabado; e então tornaram-se a assentar como nós. E quando levantaram a Deus, que nos pusemos de joelhos, eles se puseram assim todos, como nós estávamos com as mãos levantadas, e em tal maneira sossegados, que, certifico a Vossa Alteza, nos fez muita devoção.

Estiveram assim conosco até acabada a comunhão, depois da qual comungaram esses religiosos e sacerdotes e o Capitão com alguns de nós outros.

Alguns deles, por o sol ser grande, quando estávamos comungando, levantaram-se, e outros estiveram e ficaram. Um deles, homem de cinqüenta ou cinqüenta e cinco anos, continuou ali com aqueles que ficaram. Esse, estando nós assim, ajuntava estes, que ali ficaram, e ainda chamava outros. E andando assim entre eles falando, lhes acenou com o dedo para o altar e depois apontou o dedo para o Céu, como se lhes dissesse alguma coisa de bem; e nós assim o tomamos.

Acabada a missa, tirou o padre a vestimenta de cima e ficou em alva; e assim se subiu junto com altar, em uma cadeira. Ali nos pregou do Evangelho e dos Apóstolos, cujo dia hoje é, tratando, ao fim da pregação, deste vosso prosseguimento tão santo e virtuoso, o que nos aumentou a devoção.

Esses, que à pregação sempre estiveram, quedaram-se como nós olhando para ele. E aquele, que digo, chamava alguns que viessem para ali. Alguns vinham e outros iam-se. E, acabada a pregação, como Nicolau Coelho trouxesse muitas cruzes de estanho com crucifixos, que lhe ficaram ainda da outra vinda, houveram por bem que se lançasse a cada um a sua ao pescoço. Pelo que o padre frei Henrique se assentou ao pé da Cruz e ali, a um por um, lançava a sua atada em um fio ao pescoço, fazendo-lha primeiro beijar e alevantar as mãos. Vinham a isso muitos; e lançaram-nas todas, que seriam obra de quarenta ou cinqüenta.

Isto acabado -era já bem uma hora depois do meio-dia- viemos às naus a comer, trazendo o Capitão consigo aquele mesmo que fez aos outros aquela mostrança para o altar e para o Céu e um seu irmão com ele. Fez-lhe muita honra e deu-lhe uma camisa mourisca e ao outro uma camisa destoutras.

E, segundo que a mim e a todos pareceu, esta gente não lhes falece outra coisa para ser toda cristã, senão entender-nos, porque assim tomavam aquilo que nos viam fazer, como nós mesmos, por onde nos pareceu a todos que nenhuma idolatria, nem adoração têm. E bem creio que, se Vossa Alteza aqui mandar quem entre eles mais devagar ande, que todos serão tornados ao desejo de Vossa Alteza. E por isso, se alguém vier, não deixe logo de vir clérigo para os batizar, porque já então terão mais conhecimento de nossa fé, pelos dois degredados, que aqui entre eles ficam, os quais, ambos, hoje também comungaram.

Entre todos estes que hoje vieram, não veio mais que uma mulher moça, a qual esteve sempre à missa e a quem deram um pano com que se cobrisse. Puseram-lho a redor de si. Porém, ao assentar, não fazia grande memória de o estender bem, para se cobrir. Assim, Senhor, a inocência desta gente é tal, que a de Adão não seria maior, quanto a vergonha.

Ora veja Vossa Alteza se quem em tal inocência vive se converterá ou não, ensinando-lhes o que pertence à sua salvação.

Acabado isto, fomos assim perante eles beijar a Cruz, despedimo-nos e viemos comer.

Creio, Senhor, que com estes dois degredados ficam mais dois grumetes, que esta noite se saíram desta nau no esquife, fugidos para terra. Não vieram mais. E cremos que ficarão aqui, porque de manhã, prazendo a Deus, fazemos daqui nossa partida.

Esta terra, Senhor, me parece que da ponta que mais contra o sul vimos até à outra ponta que contra o norte vem, de que nós deste porto houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte e cinco léguas por costa. Tem, ao longo do mar, nalgumas partes, grandes barreiras, delas vermelhas, delas brancas; e a terra por cima toda chã e muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta, é toda praia parma, muito chã e muito formosa.

Pelo sertão nos pareceu, vista do mar, muito grande, porque, a estender olhos, não podíamos ver senão terra com arvoredos, que nos parecia muito longa.

Nela, até agora, não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou ferro; nem lho vimos. Porém a terra em si é de muito bons ares, assim frios e temperados como os de Entre Douro e Minho, porque neste tempo de agora os achávamos como os de lá.

Águas são muitas; infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem.

Porém o melhor fruto, que nela se pode fazer, me parece que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar.

E que aí não houvesse mais que ter aqui esta pousada para esta navegação de Calecute, bastaria. Quando mais disposição para se nela cumprir e fazer o que Vossa Alteza tanto deseja, a saber, acrescentamento da nossa santa fé.

E nesta maneira, Senhor, dou aqui a Vossa Alteza do que nesta vossa terra vi. E, se algum pouco me alonguei, Ela me perdoe, que o desejo que tinha, de Vos tudo dizer, mo fez assim pôr pelo miúdo.

E pois que, Senhor, é certo que, assim neste cargo que levo, como em outra qualquer coisa que de vosso serviço for, Vossa Alteza há de ser de mim muito bem servida, a Ela peço que, por me fazer singular mercê, mande vir da ilha de São Tomé a Jorge de Osório, meu genro -o que d'Ela receberei em muita mercê.

 

Beijo as mãos de Vossa Alteza.

 

Deste Porto Seguro, da Vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de maio de 1500.

Tuesday 22 June 2021

Tuesday's Serial: "Frankenstein or the Modern Prometheus" by Mary Shelley (first version, 1818) (in English) - VII

CHAPTER VII.

"Such was the history of my beloved cottagers. It impressed me deeply. I learned, from the views of social life which it developed, to admire their virtues, and to deprecate the vices of mankind.

As yet I looked upon crime as a distant evil; benevolence and generosity were ever present before me, inciting within me a desire to become an actor in the busy scene where so many admirable qualities were called forth and displayed. But, in giving an account of the progress of my intellect, I must not omit a circumstance which occurred in the beginning of the month of August of the same year.

"One night, during my accustomed visit to the neighbouring wood, where I collected my own food, and brought home firing for my protectors, I found on the ground a leathern portmanteau, containing several articles of dress and some books. I eagerly seized the prize, and returned with it to my hovel. Fortunately the books were written in the language the elements of which I had acquired at the cottage; they consisted of Paradise Lost, a volume of Plutarch's Lives, and the Sorrows of Werter. The possession of these treasures gave me extreme delight; I now continually studied and exercised my mind upon these histories, whilst my friends were employed in their ordinary occupations.

"I can hardly describe to you the effect of these books. They produced in me an infinity of new images and feelings, that sometimes raised me to ecstacy, but more frequently sunk me into the lowest dejection. In the Sorrows of Werter, besides the interest of its simple and affecting story, so many opinions are canvassed, and so many lights thrown upon what had hitherto been to me obscure subjects, that I found in it a never-ending source of speculation and astonishment. The gentle and domestic manners it described, combined with lofty sentiments and feelings, which had for their object something out of self, accorded well with my experience among my protectors, and with the wants which were for ever alive in my own bosom. But I thought Werter himself a more divine being than I had ever beheld or imagined; his character contained no pretension, but it sunk deep. The disquisitions upon death and suicide were calculated to fill me with wonder. I did not pretend to enter into the merits of the case, yet I inclined towards the opinions of the hero, whose extinction I wept, without precisely understanding it.

"As I read, however, I applied much personally to my own feelings and condition. I found myself similar, yet at the same time strangely unlike the beings concerning whom I read, and to whose conversation I was a listener. I sympathized with, and partly understood them, but I was unformed in mind; I was dependent on none, and related to none. 'The path of my departure was free;' and there was none to lament my annihilation. My person was hideous, and my stature gigantic: what did this mean? Who was I? What was I? Whence did I come? What was my destination? These questions continually recurred, but I was unable to solve them.

"The volume of Plutarch's Lives which I possessed, contained the histories of the first founders of the ancient republics. This book had a far different effect upon me from the Sorrows of Werter. I learned from Werter's imaginations despondency and gloom: but Plutarch taught me high thoughts; he elevated me above the wretched sphere of my own reflections, to admire and love the heroes of past ages. Many things I read surpassed my understanding and experience. I had a very confused knowledge of kingdoms, wide extents of country, mighty rivers, and boundless seas. But I was perfectly unacquainted with towns, and large assemblages of men. The cottage of my protectors had been the only school in which I had studied human nature; but this book developed new and mightier scenes of action. I read of men concerned in public affairs governing or massacring their species. I felt the greatest ardour for virtue rise within me, and abhorrence for vice, as far as I understood the signification of those terms, relative as they were, as I applied them, to pleasure and pain alone. Induced by these feelings, I was of course led to admire peaceable law-givers, Numa, Solon, and Lycurgus, in preference to Romulus and Theseus. The patriarchal lives of my protectors caused these impressions to take a firm hold on my mind; perhaps, if my first introduction to humanity had been made by a young soldier, burning for glory and slaughter, I should have been imbued with different sensations.

"But Paradise Lost excited different and far deeper emotions. I read it, as I had read the other volumes which had fallen into my hands, as a true history. It moved every feeling of wonder and awe, that the picture of an omnipotent God warring with his creatures was capable of exciting. I often referred the several situations, as their similarity struck me, to my own. Like Adam, I was created apparently united by no link to any other being in existence; but his state was far different from mine in every other respect. He had come forth from the hands of God a perfect creature, happy and prosperous, guarded by the especial care of his Creator; he was allowed to converse with, and acquire knowledge from beings of a superior nature: but I was wretched, helpless, and alone. Many times I considered Satan as the fitter emblem of my condition; for often, like him, when I viewed the bliss of my protectors, the bitter gall of envy rose within me.

"Another circumstance strengthened and confirmed these feelings. Soon after my arrival in the hovel, I discovered some papers in the pocket of the dress which I had taken from your laboratory. At first I had neglected them; but now that I was able to decypher the characters in which they were written, I began to study them with diligence. It was your journal of the four months that preceded my creation. You minutely described in these papers every step you took in the progress of your work; this history was mingled with accounts of domestic occurrences. You, doubtless, recollect these papers. Here they are. Every thing is related in them which bears reference to my accursed origin; the whole detail of that series of disgusting circumstances which produced it is set in view; the minutest description of my odious and loathsome person is given, in language which painted your own horrors, and rendered mine ineffaceable. I sickened as I read. 'Hateful day when I received life!' I exclaimed in agony. 'Cursed creator! Why did you form a monster so hideous that even you turned from me in disgust? God in pity made man beautiful and alluring, after his own image; but my form is a filthy type of your's, more horrid from its very resemblance. Satan had his companions, fellow-devils, to admire and encourage him; but I am solitary and detested.'

"These were the reflections of my hours of despondency and solitude; but when I contemplated the virtues of the cottagers, their amiable and benevolent dispositions, I persuaded myself that when they should become acquainted with my admiration of their virtues, they would compassionate me, and overlook my personal deformity. Could they turn from their door one, however monstrous, who solicited their compassion and friendship? I resolved, at least, not to despair, but in every way to fit myself for an interview with them which would decide my fate. I postponed this attempt for some months longer; for the importance attached to its success inspired me with a dread lest I should fail. Besides, I found that my understanding improved so much with every day's experience, that I was unwilling to commence this undertaking until a few more months should have added to my wisdom.

"Several changes, in the mean time, took place in the cottage. The presence of Safie diffused happiness among its inhabitants; and I also found that a greater degree of plenty reigned there. Felix and Agatha spent more time in amusement and conversation, and were assisted in their labours by servants. They did not appear rich, but they were contented and happy; their feelings were serene and peaceful, while mine became every day more tumultuous. Increase of knowledge only discovered to me more clearly what a wretched outcast I was. I cherished hope, it is true; but it vanished, when I beheld my person reflected in water, or my shadow in the moon-shine, even as that frail image and that inconstant shade.

"I endeavoured to crush these fears, and to fortify myself for the trial which in a few months I resolved to undergo; and sometimes I allowed my thoughts, unchecked by reason, to ramble in the fields of Paradise, and dared to fancy amiable and lovely creatures sympathizing with my feelings and cheering my gloom; their angelic countenances breathed smiles of consolation. But it was all a dream: no Eve soothed my sorrows, or shared my thoughts; I was alone. I remembered Adam's supplication to his Creator; but where was mine? he had abandoned me, and, in the bitterness of my heart, I cursed him.

"Autumn passed thus. I saw, with surprise and grief, the leaves decay and fall, and nature again assume the barren and bleak appearance it had worn when I first beheld the woods and the lovely moon. Yet I did not heed the bleakness of the weather; I was better fitted by my conformation for the endurance of cold than heat. But my chief delights were the sight of the flowers, the birds, and all the gay apparel of summer; when those deserted me, I turned with more attention towards the cottagers. Their happiness was not decreased by the absence of summer. They loved, and sympathized with one another; and their joys, depending on each other, were not interrupted by the casualties that took place around them. The more I saw of them, the greater became my desire to claim their protection and kindness; my heart yearned to be known and loved by these amiable creatures: to see their sweet looks turned towards me with affection, was the utmost limit of my ambition. I dared not think that they would turn them from me with disdain and horror. The poor that stopped at their door were never driven away. I asked, it is true, for greater treasures than a little food or rest; I required kindness and sympathy; but I did not believe myself utterly unworthy of it.

"The winter advanced, and an entire revolution of the seasons had taken place since I awoke into life. My attention, at this time, was solely directed towards my plan of introducing myself into the cottage of my protectors. I revolved many projects; but that on which I finally fixed was, to enter the dwelling when the blind old man should be alone. I had sagacity enough to discover, that the unnatural hideousness of my person was the chief object of horror with those who had formerly beheld me. My voice, although harsh, had nothing terrible in it; I thought, therefore, that if, in the absence of his children, I could gain the good-will and mediation of the old De Lacy, I might, by his means, be tolerated by my younger protectors.

"One day, when the sun shone on the red leaves that strewed the ground, and diffused cheerfulness, although it denied warmth, Safie, Agatha, and Felix, departed on a long country walk, and the old man, at his own desire, was left alone in the cottage. When his children had departed, he took up his guitar, and played several mournful, but sweet airs, more sweet and mournful than I had ever heard him play before. At first his countenance was illuminated with pleasure, but, as he continued, thoughtfulness and sadness succeeded; at length, laying aside the instrument, he sat absorbed in reflection.

"My heart beat quick; this was the hour and moment of trial, which would decide my hopes, or realize my fears. The servants were gone to a neighbouring fair. All was silent in and around the cottage: it was an excellent opportunity; yet, when I proceeded to execute my plan, my limbs failed me, and I sunk to the ground. Again I rose; and, exerting all the firmness of which I was master, removed the planks which I had placed before my hovel to conceal my retreat. The fresh air revived me, and, with renewed determination, I approached the door of their cottage.

"I knocked. 'Who is there?' said the old man—'Come in.'

"I entered; 'Pardon this intrusion,' said I, 'I am a traveller in want of a little rest; you would greatly oblige me, if you would allow me to remain a few minutes before the fire.'

"'Enter,' said De Lacy; 'and I will try in what manner I can relieve your wants; but, unfortunately, my children are from home, and, as I am blind, I am afraid I shall find it difficult to procure food for you.'

"'Do not trouble yourself, my kind host, I have food; it is warmth and rest only that I need.'

"I sat down, and a silence ensued. I knew that every minute was precious to me, yet I remained irresolute in what manner to commence the interview; when the old man addressed me—

"'By your language, stranger, I suppose you are my countryman;—are you French?'

"'No; but I was educated by a French family, and understand that language only. I am now going to claim the protection of some friends, whom I sincerely love, and of whose favour I have some hopes.'

"'Are these Germans?'

"'No, they are French. But let us change the subject. I am an unfortunate and deserted creature; I look around, and I have no relation or friend upon earth. These amiable people to whom I go have never seen me, and know little of me. I am full of fears; for if I fail there, I am an outcast in the world for ever.'

"'Do not despair. To be friendless is indeed to be unfortunate; but the hearts of men, when unprejudiced by any obvious self-interest, are full of brotherly love and charity. Rely, therefore, on your hopes; and if these friends are good and amiable, do not despair.'

"'They are kind—they are the most excellent creatures in the world; but, unfortunately, they are prejudiced against me. I have good dispositions; my life has been hitherto harmless, and, in some degree, beneficial; but a fatal prejudice clouds their eyes, and where they ought to see a feeling and kind friend, they behold only a detestable monster.'

"'That is indeed unfortunate; but if you are really blameless, cannot you undeceive them?'

"'I am about to undertake that task; and it is on that account that I feel so many overwhelming terrors. I tenderly love these friends; I have, unknown to them, been for many months in the habits of daily kindness towards them; but they believe that I wish to injure them, and it is that prejudice which I wish to overcome.'

"'Where do these friends reside?'

"'Near this spot.'

"The old man paused, and then continued, 'If you will unreservedly confide to me the particulars of your tale, I perhaps may be of use in undeceiving them. I am blind, and cannot judge of your countenance, but there is something in your words which persuades me that you are sincere. I am poor, and an exile; but it will afford me true pleasure to be in any way serviceable to a human creature.'

"'Excellent man! I thank you, and accept your generous offer. You raise me from the dust by this kindness; and I trust that, by your aid, I shall not be driven from the society and sympathy of your fellow-creatures.'

"'Heaven forbid! even if you were really criminal; for that can only drive you to desperation, and not instigate you to virtue. I also am unfortunate; I and my family have been condemned, although innocent: judge, therefore, if I do not feel for your misfortunes.'

"'How can I thank you, my best and only benefactor? from your lips first have I heard the voice of kindness directed towards me; I shall be for ever grateful; and your present humanity assures me of success with those friends whom I am on the point of meeting.'

"'May I know the names and residence of those friends?'

"I paused. This, I thought, was the moment of decision, which was to rob me of, or bestow happiness on me for ever. I struggled vainly for firmness sufficient to answer him, but the effort destroyed all my remaining strength; I sank on the chair, and sobbed aloud. At that moment I heard the steps of my younger protectors. I had not a moment to lose; but, seizing the hand of the old man, I cried, 'Now is the time!—save and protect me! You and your family are the friends whom I seek. Do not you desert me in the hour of trial!'

"'Great God!' exclaimed the old man, 'who are you?'

"At that instant the cottage door was opened, and Felix, Safie, and Agatha entered. Who can describe their horror and consternation on beholding me? Agatha fainted; and Safie, unable to attend to her friend, rushed out of the cottage. Felix darted forward, and with supernatural force tore me from his father, to whose knees I clung: in a transport of fury, he dashed me to the ground, and struck me violently with a stick. I could have torn him limb from limb, as the lion rends the antelope. But my heart sunk within me as with bitter sickness, and I refrained. I saw him on the point of repeating his blow, when, overcome by pain and anguish, I quitted the cottage, and in the general tumult escaped unperceived to my hovel.

 

 

CHAPTER VIII.

"Cursed, cursed creator! Why did I live? Why, in that instant, did I not extinguish the spark of existence which you had so wantonly bestowed? I know not; despair had not yet taken possession of me; my feelings were those of rage and revenge. I could with pleasure have destroyed the cottage and its inhabitants, and have glutted myself with their shrieks and misery.

"When night came, I quitted my retreat, and wandered in the wood; and now, no longer restrained by the fear of discovery, I gave vent to my anguish in fearful howlings. I was like a wild beast that had broken the toils; destroying the objects that obstructed me, and ranging through the wood with a stag-like swiftness. Oh! what a miserable night I passed! the cold stars shone in mockery, and the bare trees waved their branches above me: now and then the sweet voice of a bird burst forth amidst the universal stillness. All, save I, were at rest or in enjoyment: I, like the arch fiend, bore a hell within me; and, finding myself unsympathized with, wished to tear up the trees, spread havoc and destruction around me, and then to have sat down and enjoyed the ruin.

"But this was a luxury of sensation that could not endure; I became fatigued with excess of bodily exertion, and sank on the damp grass in the sick impotence of despair. There was none among the myriads of men that existed who would pity or assist me; and should I feel kindness towards my enemies? No: from that moment I declared everlasting war against the species, and, more than all, against him who had formed me, and sent me forth to this insupportable misery.

"The sun rose; I heard the voices of men, and knew that it was impossible to return to my retreat during that day. Accordingly I hid myself in some thick underwood, determining to devote the ensuing hours to reflection on my situation.

"The pleasant sunshine, and the pure air of day, restored me to some degree of tranquillity; and when I considered what had passed at the cottage, I could not help believing that I had been too hasty in my conclusions. I had certainly acted imprudently. It was apparent that my conversation had interested the father in my behalf, and I was a fool in having exposed my person to the horror of his children. I ought to have familiarized the old De Lacy to me, and by degrees have discovered myself to the rest of his family, when they should have been prepared for my approach. But I did not believe my errors to be irretrievable; and, after much consideration, I resolved to return to the cottage, seek the old man, and by my representations win him to my party.

"These thoughts calmed me, and in the afternoon I sank into a profound sleep; but the fever of my blood did not allow me to be visited by peaceful dreams. The horrible scene of the preceding day was for ever acting before my eyes; the females were flying, and the enraged Felix tearing me from his father's feet. I awoke exhausted; and, finding that it was already night, I crept forth from my hiding-place, and went in search of food.

"When my hunger was appeased, I directed my steps towards the well-known path that conducted to the cottage. All there was at peace. I crept into my hovel, and remained in silent expectation of the accustomed hour when the family arose. That hour past, the sun mounted high in the heavens, but the cottagers did not appear. I trembled violently, apprehending some dreadful misfortune. The inside of the cottage was dark, and I heard no motion; I cannot describe the agony of this suspence.

"Presently two countrymen passed by; but, pausing near the cottage, they entered into conversation, using violent gesticulations; but I did not understand what they said, as they spoke the language of the country, which differed from that of my protectors. Soon after, however, Felix approached with another man: I was surprised, as I knew that he had not quitted the cottage that morning, and waited anxiously to discover, from his discourse, the meaning of these unusual appearances.

"'Do you consider,' said his companion to him, 'that you will be obliged to pay three months' rent, and to lose the produce of your garden? I do not wish to take any unfair advantage, and I beg therefore that you will take some days to consider of your determination.'

"'It is utterly useless,' replied Felix, 'we can never again inhabit your cottage. The life of my father is in the greatest danger, owing to the dreadful circumstance that I have related. My wife and my sister will never recover their horror. I entreat you not to reason with me any more. Take possession of your tenement, and let me fly from this place.'

"Felix trembled violently as he said this. He and his companion entered the cottage, in which they remained for a few minutes, and then departed. I never saw any of the family of De Lacy more.

"I continued for the remainder of the day in my hovel in a state of utter and stupid despair. My protectors had departed, and had broken the only link that held me to the world. For the first time the feelings of revenge and hatred filled my bosom, and I did not strive to controul them; but, allowing myself to be borne away by the stream, I bent my mind towards injury and death. When I thought of my friends, of the mild voice of De Lacy, the gentle eyes of Agatha, and the exquisite beauty of the Arabian, these thoughts vanished, and a gush of tears somewhat soothed me. But again, when I reflected that they had spurned and deserted me, anger returned, a rage of anger; and, unable to injure any thing human, I turned my fury towards inanimate objects. As night advanced, I placed a variety of combustibles around the cottage; and, after having destroyed every vestige of cultivation in the garden, I waited with forced impatience until the moon had sunk to commence my operations.

"As the night advanced, a fierce wind arose from the woods, and quickly dispersed the clouds that had loitered in the heavens: the blast tore along like a mighty avalanche, and produced a kind of insanity in my spirits, that burst all bounds of reason and reflection. I lighted the dry branch of a tree, and danced with fury around the devoted cottage, my eyes still fixed on the western horizon, the edge of which the moon nearly touched. A part of its orb was at length hid, and I waved my brand; it sunk, and, with a loud scream, I fired the straw, and heath, and bushes, which I had collected. The wind fanned the fire, and the cottage was quickly enveloped by the flames, which clung to it, and licked it with their forked and destroying tongues.

"As soon as I was convinced that no assistance could save any part of the habitation, I quitted the scene, and sought for refuge in the woods.

"And now, with the world before me, whither should I bend my steps? I resolved to fly far from the scene of my misfortunes; but to me, hated and despised, every country must be equally horrible. At length the thought of you crossed my mind. I learned from your papers that you were my father, my creator; and to whom could I apply with more fitness than to him who had given me life? Among the lessons that Felix had bestowed upon Safie geography had not been omitted: I had learned from these the relative situations of the different countries of the earth. You had mentioned Geneva as the name of your native town; and towards this place I resolved to proceed.

"But how was I to direct myself? I knew that I must travel in a south-westerly direction to reach my destination; but the sun was my only guide. I did not know the names of the towns that I was to pass through, nor could I ask information from a single human being; but I did not despair. From you only could I hope for succour, although towards you I felt no sentiment but that of hatred. Unfeeling, heartless creator! you had endowed me with perceptions and passions, and then cast me abroad an object for the scorn and horror of mankind. But on you only had I any claim for pity and redress, and from you I determined to seek that justice which I vainly attempted to gain from any other being that wore the human form.

"My travels were long, and the sufferings I endured intense. It was late in autumn when I quitted the district where I had so long resided. I travelled only at night, fearful of encountering the visage of a human being. Nature decayed around me, and the sun became heatless; rain and snow poured around me; mighty rivers were frozen; the surface of the earth was hard, and chill, and bare, and I found no shelter. Oh, earth! how often did I imprecate curses on the cause of my being! The mildness of my nature had fled, and all within me was turned to gall and bitterness. The nearer I approached to your habitation, the more deeply did I feel the spirit of revenge enkindled in my heart. Snow fell, and the waters were hardened, but I rested not. A few incidents now and then directed me, and I possessed a map of the country; but I often wandered wide from my path. The agony of my feelings allowed me no respite: no incident occurred from which my rage and misery could not extract its food; but a circumstance that happened when I arrived on the confines of Switzerland, when the sun had recovered its warmth, and the earth again began to look green, confirmed in an especial manner the bitterness and horror of my feelings.

"I generally rested during the day, and travelled only when I was secured by night from the view of man. One morning, however, finding that my path lay through a deep wood, I ventured to continue my journey after the sun had risen; the day, which was one of the first of spring, cheered even me by the loveliness of its sunshine and the balminess of the air. I felt emotions of gentleness and pleasure, that had long appeared dead, revive within me. Half surprised by the novelty of these sensations, I allowed myself to be borne away by them; and, forgetting my solitude and deformity, dared to be happy. Soft tears again bedewed my cheeks, and I even raised my humid eyes with thankfulness towards the blessed sun which bestowed such joy upon me.

"I continued to wind among the paths of the wood, until I came to its boundary, which was skirted by a deep and rapid river, into which many of the trees bent their branches, now budding with the fresh spring. Here I paused, not exactly knowing what path to pursue, when I heard the sound of voices, that induced me to conceal myself under the shade of a cypress. I was scarcely hid, when a young girl came running towards the spot where I was concealed, laughing as if she ran from some one in sport. She continued her course along the precipitous sides of the river, when suddenly her foot slipt, and she fell into the rapid stream. I rushed from my hiding place, and, with extreme labour from the force of the current, saved her, and dragged her to shore. She was senseless; and I endeavoured, by every means in my power, to restore animation, when I was suddenly interrupted by the approach of a rustic, who was probably the person from whom she had playfully fled. On seeing me, he darted towards me, and, tearing the girl from my arms, hastened towards the deeper parts of the wood. I followed speedily, I hardly knew why; but when the man saw me draw near, he aimed a gun, which he carried, at my body, and fired. I sunk to the ground, and my injurer, with increased swiftness, escaped into the wood.

"This was then the reward of my benevolence! I had saved a human being from destruction, and, as a recompence, I now writhed under the miserable pain of a wound, which shattered the flesh and bone. The feelings of kindness and gentleness, which I had entertained but a few moments before, gave place to hellish rage and gnashing of teeth. Inflamed by pain, I vowed eternal hatred and vengeance to all mankind. But the agony of my wound overcame me; my pulses paused, and I fainted.

"For some weeks I led a miserable life in the woods, endeavouring to cure the wound which I had received. The ball had entered my shoulder, and I knew not whether it had remained there or passed through; at any rate I had no means of extracting it. My sufferings were augmented also by the oppressive sense of the injustice and ingratitude of their infliction. My daily vows rose for revenge—a deep and deadly revenge, such as would alone compensate for the outrages and anguish I had endured.

"After some weeks my wound healed, and I continued my journey. The labours I endured were no longer to be alleviated by the bright sun or gentle breezes of spring; all joy was but a mockery, which insulted my desolate state, and made me feel more painfully that I was not made for the enjoyment of pleasure.

"But my toils now drew near a close; and, two months from this time, I reached the environs of Geneva.

"It was evening when I arrived, and I retired to a hiding-place among the fields that surround it, to meditate in what manner I should apply to you. I was oppressed by fatigue and hunger, and far too unhappy to enjoy the gentle breezes of evening, or the prospect of the sun setting behind the stupendous mountains of Jura.

"At this time a slight sleep relieved me from the pain of reflection, which was disturbed by the approach of a beautiful child, who came running into the recess I had chosen with all the sportiveness of infancy. Suddenly, as I gazed on him, an idea seized me, that this little creature was unprejudiced, and had lived too short a time to have imbibed a horror of deformity. If, therefore, I could seize him, and educate him as my companion and friend, I should not be so desolate in this peopled earth.

"Urged by this impulse, I seized on the boy as he passed, and drew him towards me. As soon as he beheld my form, he placed his hands before his eyes, and uttered a shrill scream: I drew his hand forcibly from his face, and said, 'Child, what is the meaning of this? I do not intend to hurt you; listen to me.'

"He struggled violently; 'Let me go,' he cried; 'monster! ugly wretch! you wish to eat me, and tear me to pieces—You are an ogre—Let me go, or I will tell my papa.'

"'Boy, you will never see your father again; you must come with me.'

"'Hideous monster! let me go; My papa is a Syndic—he is M. Frankenstein—he would punish you. You dare not keep me.'

"'Frankenstein! you belong then to my enemy—to him towards whom I have sworn eternal revenge; you shall be my first victim.'

"The child still struggled, and loaded me with epithets which carried despair to my heart: I grasped his throat to silence him, and in a moment he lay dead at my feet.

"I gazed on my victim, and my heart swelled with exultation and hellish triumph: clapping my hands, I exclaimed, 'I, too, can create desolation; my enemy is not impregnable; this death will carry despair to him, and a thousand other miseries shall torment and destroy him.'

"As I fixed my eyes on the child, I saw something glittering on his breast. I took it; it was a portrait of a most lovely woman. In spite of my malignity, it softened and attracted me. For a few moments I gazed with delight on her dark eyes, fringed by deep lashes, and her lovely lips; but presently my rage returned: I remembered that I was for ever deprived of the delights that such beautiful creatures could bestow; and that she whose resemblance I contemplated would, in regarding me, have changed that air of divine benignity to one expressive of disgust and affright.

"Can you wonder that such thoughts transported me with rage? I only wonder that at that moment, instead of venting my sensations in exclamations and agony, I did not rush among mankind, and perish in the attempt to destroy them.

"While I was overcome by these feelings, I left the spot where I had committed the murder, and was seeking a more secluded hiding-place, when I perceived a woman passing near me. She was young, not indeed so beautiful as her whose portrait I held, but of an agreeable aspect, and blooming in the loveliness of youth and health. Here, I thought, is one of those whose smiles are bestowed on all but me; she shall not escape: thanks to the lessons of Felix, and the sanguinary laws of man, I have learned how to work mischief. I approached her unperceived, and placed the portrait securely in one of the folds of her dress.

"For some days I haunted the spot where these scenes had taken place; sometimes wishing to see you, sometimes resolved to quit the world and its miseries for ever. At length I wandered towards these mountains, and have ranged through their immense recesses, consumed by a burning passion which you alone can gratify. We may not part until you have promised to comply with my requisition. I am alone, and miserable; man will not associate with me; but one as deformed and horrible as myself would not deny herself to me. My companion must be of the same species, and have the same defects. This being you must create."

 

 

CHAPTER IX.

The being finished speaking, and fixed his looks upon me in expectation of a reply. But I was bewildered, perplexed, and unable to arrange my ideas sufficiently to understand the full extent of his proposition. He continued—

"You must create a female for me, with whom I can live in the interchange of those sympathies necessary for my being. This you alone can do; and I demand it of you as a right which you must not refuse."

The latter part of his tale had kindled anew in me the anger that had died away while he narrated his peaceful life among the cottagers, and, as he said this, I could no longer suppress the rage that burned within me.

"I do refuse it," I replied; "and no torture shall ever extort a consent from me. You may render me the most miserable of men, but you shall never make me base in my own eyes. Shall I create another like yourself, whose joint wickedness might desolate the world. Begone! I have answered you; you may torture me, but I will never consent."

"You are in the wrong,' replied the fiend; "and, instead of threatening, I am content to reason with you. I am malicious because I am miserable; am I not shunned and hated by all mankind? You, my creator, would tear me to pieces, and triumph; remember that, and tell me why I should pity man more than he pities me? You would not call it murder, if you could precipitate me into one of those ice-rifts, and destroy my frame, the work of your own hands. Shall I respect man, when he contemns me? Let him live with me in the interchange of kindness, and, instead of injury, I would bestow every benefit upon him with tears of gratitude at his acceptance. But that cannot be; the human senses are insurmountable barriers to our union. Yet mine shall not be the submission of abject slavery. I will revenge my injuries: if I cannot inspire love, I will cause fear; and chiefly towards you my arch-enemy, because my creator, do I swear inextinguishable hatred. Have a care: I will work at your destruction, nor finish until I desolate your heart, so that you curse the hour of your birth."

A fiendish rage animated him as he said this; his face was wrinkled into contortions too horrible for human eyes to behold; but presently he calmed himself, and proceeded—

"I intended to reason. This passion is detrimental to me; for you do not reflect that you are the cause of its excess. If any being felt emotions of benevolence towards me, I should return them an hundred and an hundred fold; for that one creature's sake, I would make peace with the whole kind! But I now indulge in dreams of bliss that cannot be realized. What I ask of you is reasonable and moderate; I demand a creature of another sex, but as hideous as myself: the gratification is small, but it is all that I can receive, and it shall content me. It is true, we shall be monsters, cut off from all the world; but on that account we shall be more attached to one another. Our lives will not be happy, but they will be harmless, and free from the misery I now feel. Oh! my creator, make me happy; let me feel gratitude towards you for one benefit! Let me see that I excite the sympathy of some existing thing; do not deny me my request!"

I was moved. I shuddered when I thought of the possible consequences of my consent; but I felt that there was some justice in his argument. His tale, and the feelings he now expressed, proved him to be a creature of fine sensations; and did I not, as his maker, owe him all the portion of happiness that it was in my power to bestow? He saw my change of feeling, and continued—

"If you consent, neither you nor any other human being shall ever see us again: I will go to the vast wilds of South America. My food is not that of man; I do not destroy the lamb and the kid, to glut my appetite; acorns and berries afford me sufficient nourishment. My companion will be of the same nature as myself, and will be content with the same fare. We shall make our bed of dried leaves; the sun will shine on us as on man, and will ripen our food. The picture I present to you is peaceful and human, and you must feel that you could deny it only in the wantonness of power and cruelty. Pitiless as you have been towards me, I now see compassion in your eyes; let me seize the favourable moment, and persuade you to promise what I so ardently desire."

"You propose," replied I, "to fly from the habitations of man, to dwell in those wilds where the beasts of the field will be your only companions. How can you, who long for the love and sympathy of man, persevere in this exile? You will return, and again seek their kindness, and you will meet with their detestation; your evil passions will be renewed, and you will then have a companion to aid you in the task of destruction. This may not be; cease to argue the point, for I cannot consent."

"How inconstant are your feelings! but a moment ago you were moved by my representations, and why do you again harden yourself to my complaints? I swear to you, by the earth which I inhabit, and by you that made me, that, with the companion you bestow, I will quit the neighbourhood of man, and dwell, as it may chance, in the most savage of places. My evil passions will have fled, for I shall meet with sympathy; my life will flow quietly away, and, in my dying moments, I shall not curse my maker."

His words had a strange effect upon me. I compassionated him, and sometimes felt a wish to console him; but when I looked upon him, when I saw the filthy mass that moved and talked, my heart sickened, and my feelings were altered to those of horror and hatred. I tried to stifle these sensations; I thought, that as I could not sympathize with him, I had no right to withhold from him the small portion of happiness which was yet in my power to bestow.

"You swear," I said, "to be harmless; but have you not already shewn a degree of malice that should reasonably make me distrust you? May not even this be a feint that will increase your triumph by affording a wider scope for your revenge?"

"How is this? I thought I had moved your compassion, and yet you still refuse to bestow on me the only benefit that can soften my heart, and render me harmless. If I have no ties and no affections, hatred and vice must be my portion; the love of another will destroy the cause of my crimes, and I shall become a thing, of whose existence every one will be ignorant. My vices are the children of a forced solitude that I abhor; and my virtues will necessarily arise when I live in communion with an equal. I shall feel the affections of a sensitive being, and become linked to the chain of existence and events, from which I am now excluded."

I paused some time to reflect on all he had related, and the various arguments which he had employed. I thought of the promise of virtues which he had displayed on the opening of his existence, and the subsequent blight of all kindly feeling by the loathing and scorn which his protectors had manifested towards him. His power and threats were not omitted in my calculations: a creature who could exist in the ice caves of the glaciers, and hide himself from pursuit among the ridges of inaccessible precipices, was a being possessing faculties it would be vain to cope with. After a long pause of reflection, I concluded, that the justice due both to him and my fellow-creatures demanded of me that I should comply with his request. Turning to him, therefore, I said—

"I consent to your demand, on your solemn oath to quit Europe for ever, and every other place in the neighbourhood of man, as soon as I shall deliver into your hands a female who will accompany you in your exile."

"I swear," he cried, "by the sun, and by the blue sky of heaven, that if you grant my prayer, while they exist you shall never behold me again. Depart to your home, and commence your labours: I shall watch their progress with unutterable anxiety; and fear not but that when you are ready I shall appear."

 

Saying this, he suddenly quitted me, fearful, perhaps, of any change in my sentiments. I saw him descend the mountain with greater speed than the flight of an eagle, and quickly lost him among the undulations of the sea of ice.

His tale had occupied the whole day; and the sun was upon the verge of the horizon when he departed. I knew that I ought to hasten my descent towards the valley, as I should soon be encompassed in darkness; but my heart was heavy, and my steps slow. The labour of winding among the little paths of the mountains, and fixing my feet firmly as I advanced, perplexed me, occupied as I was by the emotions which the occurrences of the day had produced. Night was far advanced, when I came to the half-way resting-place, and seated myself beside the fountain. The stars shone at intervals, as the clouds passed from over them; the dark pines rose before me, and every here and there a broken tree lay on the ground: it was a scene of wonderful solemnity, and stirred strange thoughts within me. I wept bitterly; and, clasping my hands in agony, I exclaimed, "Oh! stars, and clouds, and winds, ye are all about to mock me: if ye really pity me, crush sensation and memory; let me become as nought; but if not, depart, depart and leave me in darkness."

These were wild and miserable thoughts; but I cannot describe to you how the eternal twinkling of the stars weighed upon me, and how I listened to every blast of wind, as if it were a dull ugly siroc on its way to consume me.

Morning dawned before I arrived at the village of Chamounix; but my presence, so haggard and strange, hardly calmed the fears of my family, who had waited the whole night in anxious expectation of my return.

The following day we returned to Geneva. The intention of my father in coming had been to divert my mind, and to restore me to my lost tranquillity; but the medicine had been fatal. And, unable to account for the excess of misery I appeared to suffer, he hastened to return home, hoping the quiet and monotony of a domestic life would by degrees alleviate my sufferings from whatsoever cause they might spring.

For myself, I was passive in all their arrangements; and the gentle affection of my beloved Elizabeth was inadequate to draw me from the depth of my despair. The promise I had made to the dæmon weighed upon my mind, like Dante's iron cowl on the heads of the hellish hypocrites. All pleasures of earth and sky passed before me like a dream, and that thought only had to me the reality of life. Can you wonder, that sometimes a kind of insanity possessed me, or that I saw continually about me a multitude of filthy animals inflicting on me incessant torture, that often extorted screams and bitter groans?

By degrees, however, these feelings became calmed. I entered again into the every-day scene of life, if not with interest, at least with some degree of tranquillity.

 

END OF VOLUME II