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Wednesday, 5 February 2025

Wednesday's Good Reading: "Aspiração" by Narcisa Amália (in Portuguese)

 

(A uma menina)

Folga e ri no começo da existência

Borboleta gentil!

 GONÇALVES DIAS

 

Os lampejos azuis de teus olhos

Fazem n'alma brotar a esperança;

Dão venturas, ó meiga criança,

 — Flor celeste no mundo entre abrolhos! —

 

Ora pendes a fronte na cisma,

Fatigada dos jogos, contente,

E mil sonhos, formosa inocente,

Fantasias às cores do prisma;

 

Ora voas ligeira entre clícias

Sacudindo fulgores, anjinho;

E o favônio te envia um carinho,

E as estrelas te ofertam blandícias!...

 

Mas se prende dos fúlgidos cílios

Alva pérola que a face te rora,

De teus lábios, na fala sonora,

Chovem, rolam sublimes idílios!

 

De tua boca na rubra granada

Caem santos mil beijos felizes!

Tuas asas de lindos matizes,

Ah! não rasgues do vício na estrada!

Wednesday, 11 December 2024

Wednesday's Good Reading: "A Rosa" by Narcisa Amália (in Portuguese).

 

Que impia mão te ceifou no ardor da sesta

Rosa de amor, rosa purpúrea e bela?

ALMEIDA GARRETT

 

Um dia em que perdida nas trevas da existência

Sem risos festivais, sem crenças de futuro,

Tentava do passado entrar no templo escuro,

Fitando a torva aurora de minha adolescência.

 

Volvi meu passo incerto à solidão do campo,

Lá onde não penetra o estrepitar do mundo;

Lá onde doura a luz o báratro profundo,

E a pálida lanterna acende o pirilampo.

 

E vi airosa erguer-se, por sobre a mole alfombra,

De uma roseira agreste a mais brilhante filha!

De púrpura e perfumes — a ignota maravilha,

Sentindo-se formosa, fugia à meiga sombra!

 

Ai, louca! Procurando o sol que abrasa tudo

Gazil se desatava à beira do caminho;

E o sol, ébrio de amor, no férvido carinho

Crestava-lhe o matiz do colo de veludo!

 

A flor dizia exausta à viração perdida:

“Ah! minha doce amiga abranda o ardor do raio!

Não vês? Jovem e bela eu sinto que desmaio

E em breve rolarei no solo já sem vida!

 

Ao casto peito uni a abelha em mil delírios

Sedenta de esplendor, vaidosa de meu brilho;

E agora embalde invejo o viço do junquilho,

E agora embalde imploro a candidez dos lírios!

 

Só me resta morrer! Ditosa a borboleta

Que agita as áureas asas e paira sobre a fonte;

Na onda perfumosa embebe a linda fronte

E goza almo frescor na balsa predileta!”

 

E a viração passou. E a flor abandonada

Ao sol tentou velar a face amortecida;

Mas do cálix gentil a pétala ressequida

Sobre a espiral de olores rolou no pó da estrada!

 

Assim da juventude se rasga o flóreo véu

E do talento a estátua no pedestal vacila;

Assim da mente esvai-se a ideia que cintila

E apenas resta ao crente — extremo asilo — o céu!

Saturday, 26 October 2024

Saturday's Good Readin: “Por que Sou Forte” by Narcisa Amália (in Portuguese)

 


(A Ezequiel Freire)

Dirás que é falso. Não. É certo. Desço

Ao fundo d'alma toda vez que hesito...

Cada vez que uma lágrima ou que um grito

Trai-me a angústia — ao sentir que desfaleço...

E toda assombro, toda amor, confesso,

O limiar desse país bendito

Cruzo: — aguardam-me as festas do infinito!

 

O horror da vida, deslumbrada, esqueço!

É que há dentro vales, céus, alturas,

Que o olhar do mundo não macula, a terna

Lua, flores, queridas criaturas,

E soa em cada moita, em cada gruta,

A sinfonia da paixão eterna!...

— E eis-me de novo forte para a luta.