Wednesday, 29 June 2016

“Elegia” by Fagundes Varela (in Portuguese)




A noite era bela - dormente no espaço
A lua soltava seus pálidos lumes
Das flores fugindo, corria lasciva
A brisa embebida de moles perfumes

Nós éramos jovens - ardentes e sós,
Ao lado um do outro no vasto salão;
E as brisas e a noite nos vinham no ouvido
Cantar os mistérios de infinda paixão!

Nós éramos jovens, - e a luz de seus olhos
Brilhava incendida de eternos desejos,
E a sombra indiscreta do níveo corpinho
Sulcavam-lhe os seios em brandos arquejos!

Ah! Mísero aquele que as sendas do mundo
Trilhou sem o aroma da pálida flor,
E à tumba reclina, n'aurora dos sonhos,
O lábio inda virgem dos beijos de amor!

Não são dos invernos as frias geadas,
Nem longas jornadas que os anos apontam;
O tempo descora nos risos e prantos,
E os dias do homem por gozos se contam

Ah! lembra-me ainda! nem um candelabro
Lançava ao recinto seu brando clarão,
Apenas os raios da pálida lua
Transpondo as janelas batiam no chão

Vestida de branco - nas cismas perdida,
Seu mórbido rosto pousava em meu seio
E o aroma celeste das negras madeixas
Minh'alma inundava de férvido anseio

Nem uma palavra seus lábios queridos
Nos doces espasmos diziam-me então
Que valem palavras quando ouve-se o peito
E as vidas se fundem no ardor da paixão?

No fim de seu giro, da noite a princesa
Deixou-nos unidos em brando sonhar
Correram as horas, - e a luz d'alvorada
Em juras infindas nos veio encontrar!

Não são dos invernos as frias geadas,
Nem longas jornadas que os anos apontam,
O tempo descora nos risos e prantos,
E os dias do homem por gozos se contam

Ligeira, essa noite de infindas venturas
Somente em minh'alma lembranças deixou
Três meses passaram, e o sino do templo
À reza dos mortos os homens chamou!

Três meses passaram - e um lívido corpo
Jazia dos círios à luz funeral
E à sombra dos mirtos, o rude coveiro
Abria cantando seu leito final!

Nós éramos jovens, e as vidas, e os seios
O afeto prendera num cândido nó!
Foi ela a primeira que o laço quebrando
Caiu soluçando das campas no pó

Não são dos invernos as frias geadas,
Nem longas jornadas que os anos apontam,
O tempo descora nos risos e prantos,
E os dias do homem por dores se contam

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