Thursday 30 June 2016

"As Doze Palavras Ditas e Retornadas" by Unknown Writer (in Portuguese)



Era uma vez um homem muito trabalhador e honrado, mas infeliz em todo negócio em que se metia. Tinha ele devoção ao Anjo da Guarda, rezando todos os dias em sua intenção.
            Cada vez mais pobre, o homem perdeu a paciência, e um dia gritou, desesperado com sua triste sina:
— Acuda-me o diabo, que o Anjo da Guarda não me quer ajudar!
            Apareceu um sujeito alto, todo vestido de preto, barbudo e feio, com uma voz roufenha e desagradável:
— Aqui estou! Aqui estou! Que é que queres de mim?
— Quero ficar rico.
            O diabo indicou uma gruta onde havia um tesouro enterrado, e disse:
— Daqui a vinte anos voltarei para buscar-te. Se não disseres as doze palavras ditas e retornadas, serás meu para toda a eternidade.
            O homem começou a viver folgadamente, em festas e alegrias, cercado de amigos e de mulheres.
            O tempo foi passando, e uma noite ele lembrou-se de que estava condenado às penas do inferno. Só se soubesse as doze palavras ditas e retornadas...
— Isso deve ser fácil — disse ele consigo. — Todo mundo deve saber.
            No dia seguinte perguntou aos amigos, aos vizinhos e a todos os moradores da cidade, e não havia quem soubesse o que vinha a ser o que ele lhes perguntava.
            O homem afligiu-se muito. Cada vez mais o tempo passava, e ninguém sabia o segredo das doze palavras ditas e retornadas. Largou ele a vida má que levava, fez penitência e saiu pelo mundo, perguntando. Todos diziam:
— Não sei, nunca ouvi falar...
            O homem só faltava morrer, com o pavor da ideia de ter de encontrar-se com o diabo e ser carregado para o fogo eterno.
            Já correra muito tempo desde que deixara o folguedo dos ricos, vestindo com modéstia e dando esmolas.
            Uma tarde, ia por um bosque na hora da "Ave-Maria". Ajoelhou-se para rezar, e ao terminar viu um velho que se aproximava dele.
            Cumprimentou-o, e foram andando juntos para a vila. Perguntou ao velho como ele se chamava.
— Chamo-me Custódio — respondeu.
            Para não deixar de perguntar, falou nas doze palavras ditas e retornadas. E o velho Custódio lhe disse:
— Eu sei as doze palavras ditas e retornadas.
            O homem ficou tão satisfeito que abraçou o velho, dando graças a Deus e dizendo que aquilo era um milagre do Anjo da Guarda, sua devoção antiga.
            — Como são as doze palavras ditas e retornadas? Qual é a primeira, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! A primeira palavra dita e retornada é a Santa Casa de Belém, onde nasceu Nosso Senhor Jesus Cristo, para nos remir e salvar.
            — E as duas palavras ditas e retornadas, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As duas palavras ditas e retornadas são as duas tábuas de Moisés, em que Nosso Senhor pôs seus divinos pés, e a primeira é a Santa Casa de Belém.
            — E as três palavras ditas e retornadas, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo não! As três palavras ditas e retornadas são as três pessoas da Santíssima Trindade, as duas são as duas tábuas de Moisés, e a primeira é a Santa Casa de Belém.
            — E as quatro palavras ditas e retornadas, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As quatro palavras ditas e retornadas são os quatro evangelistas, as três são as pessoas da Santíssima Trindade, as duas são as tábuas de Moisés, e a primeira é a Santa Casa de Belém.
            — E as cinco palavras, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As cinco palavras ditas e retornadas são as cinco chagas de Nosso Senhor.
            — E as seis palavras, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As seis palavras ditas e retornadas são as seis velas bentas que estão no altar-mor de Jerusalém.
            — E as sete palavras, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As sete palavras ditas e retornadas são os Sete Sacramentos.
            — E as oito palavras, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As oito palavras ditas e retornadas são as oito bem-aventuranças pregadas por Nosso Senhor Jesus Cristo.
            — E as nove palavras, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As nove palavras são os nove meses que a Virgem Mãe trouxe Nosso Senhor.
            — E as dez, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As dez palavras ditas e retornadas são os Mandamentos da Lei de Deus.
— E as onze palavras, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As onze palavras são as onze mil virgens.
            — E as doze, amigo Custódio?
— Custódio, sim; amigo, não! As doze palavras ditas e retornadas são os doze apóstolos, as onze são as onze mil virgens, as dez os Mandamentos, as nove os meses de Nossa Senhora, as oito as bem-aventuranças, as sete os Sacramentos, as seis as velas bentas, as cinco as chagas, as quatro os evangelistas, as três a Santíssima Trindade, as duas as tábuas de Moisés, a primeira a Santa Casa de Belém, onde nasceu quem nos salvou. Amém! Estas são as doze palavras ditas e retornadas.
            — De joelhos te agradeço, amigo Custódio, essa esmola, a qual há de salvar-me do demônio!
            — Custódio, sim, e teu amigo. Sou o Anjo da Guarda que vem perdoar-te pelo arrependimento e pela penitência.
            E sumiu-se. O homem, quando chegou o prazo para prestar contas ao diabo, disse as doze palavras ditas e retornadas, e o maldito rebentou como uma bola de fogo, espalhando cheiro de enxofre.
            O homem viveu santamente seus dias, e acabou na paz de Deus, salvando-se graças ao seu Anjo da Guarda.

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