Wednesday, 25 July 2018

Sermon of Pope Pius XII on the Canonization of St. Maria Goretti (translated into Portuguese)


    24.junho.1950, por ocasião da solene canonização de S. Maria Goretti.



Veneráveis irmãos e filhos diletos:

“A virgindade é um gênero de vida angélico” [1], que a religião cristã elevou a tão excelso grau de beleza que se nos afigura algo maior do que a terra e digno do céu; e se lhe acrescentamos a palma do martírio, torna-se algo que à suavidade e pureza da graça vem juntar uma inabalável fortaleza; e, contemplando-a, somos levados à prática daquelas virtudes, daqueles atos heróicos a que nos obrigam os mandamentos cristãos. Tudo isso, pois, vemo-lo na virginal menina Maria Goretti, a quem Nos foi dado coroar ontem com a glória dos santos do céu.
                Maria Goretti nasceu em uma família pobre, que, para alimentar com trabalho honesto a crescente prole, teve de abandonar a pequena cidade natal e migrar para a região do Lácio, onde, pelo cultivo do campo, proveria aos filhos um pouco de sustento.
Nada lhe era mais grato, nada mais doce do que ir sempre que possível à igreja.
                Como fosse dotada de pureza de alma, unida a certa prontidão para o trabalho, desde pequena Maria Goretti se portou de tal modo que não só se distinguia pelos bons costumes, mas também se destacava pela diligente e incansável dedicação com que, solícita e serena, assistia a mãe nos cuidados domésticos.
                Analfabeta, foi dela que Maria Goretti aprendeu os rudimentos da doutrina cristã, que ela cuidadosamente buscava gravar no coração; e nada lhe era mais grato, nada mais doce do que ir sempre que possível à igreja, longe de casa, para ali ser instruída na religião católica e, aos pés do do altar de Deus e da bem-aventurada Virgem Maria, fazer suas abrasadíssimas orações.
                Quando enfim se lhe permitiu aproximar-se da mesa eucarística e nutrir-se com a pastagem celeste, ela o fez com tão zelosa piedade, com tão flagrante caridade, que, mais do que uma menina, parecia um anjo em carne humana. Dali mesmo hauriu a força divina pela qual, poucos meses mais tarde, antes de completar doze anos, pôde lutar vitoriosamente até a morte, a fim de preservar intacto e incontaminado o alvo lírio de sua inocência e apresentá-lo, purpurado com o sangue do martírio, ao divino Autor de sua vida virginal.
                Foi acérrima a batalha, como todos sabem, que esta inofensiva virgem teve de enfrentar; uma agitada e cega procela despenhou-se repentinamente sobre ela, procurando-lhe manchar e violar a angélica pureza. Mas, apesar do gravíssimo perigo em que se encontrava, ela pôde repetir ao Redentor essas palavras do célebre livro A imitação de Cristo: “Ainda que eu seja tentado e vexado com muitas tribulações, nada temerei, enquanto estiver comigo a vossa graça. Ela é a minha fortaleza; ela me dá conselho e amparo. Ela é mais poderosa do que todos os inimigos” (l. III, c. 55). Assim, sustentada pela graça celeste, à qual correspondeu com generosa e forte vontade, Maria Goretti entregou a vida sem perder a glória da virgindade.
                Sustentada pela graça celeste, à qual correspondeu com generosa e forte vontade, Maria Goretti entregou a vida sem perder a glória da virgindade.
                Na vida desta humilde menina, que esboçamos em linhas gerais, é-nos permitido entrever um espetáculo, veneráveis irmãos e filhos queridos, não só — como dissemos — digno do céu, mas digno ainda de ser contemplado com admiração e veneração por este nosso século. Aprendam os pais e mães de família o quanto é importante educar reta, santa e corajosamente os filhos que Deus lhes confiou e conformá-los às leis da religião católica, de tal maneira que, quando lhes for provada a virtude, eles possam, com o auxílio da graça divina, sair ilesos, íntegros e imaculados.
                Aprenda a jovial infância, aprenda a animada juventude, não a precipitar-se em alegrias vãs e passageiras, nos prazeres enganadores do vício — que destroem a pura inocência, que geram uma terrível tristeza, que debilitam antes do tempo as forças da alma e do corpo —, mas antes a lutar vivamente, enfrentando embora desafios árduos e difíceis, por aquela perfeição moral cristã que todos nós, com vontade firme, ajudada com os dons celestes, esforço, trabalho e oração, podemos alcançar um dia.
                Nem todos, é verdade, estão chamados a encarar o martírio; todos, porém, somos chamados a adquirir a virtude cristã.
                Aprenda enfim este débil mundo, excessivamente propenso às coisas mais baixas, a venerar e imitar a invencível fortaleza desta virginal menina. Olhai todos para este lírio do campo, rescendendo suavíssimo odor, para estas fulgentes palmas do martírio, e compreendei o quanto os valores cristãos são capazes de moderar e educar devidamente os homens e o quanto as alegrias celestes — conquistadas ao preço da inocência de vida, preservada incólume, e da virtude laboriosamente adquirida — superam e excedem as vãs concupiscências, visto que apenas Deus pode domar e tranquilizar a alma humana e satisfazer suas infinitas aspirações.
                Nem todos, é verdade, estão chamados a encarar o martírio; todos, porém, somos chamados a adquirir a virtude cristã. A virtude, no entanto, requer força, a qual, se bem não atinja o cume da fortaleza desta angélica menina, nos exige contudo esforço diuturno, diligentíssimo e incessante até o fim da vida. Esforço que, por isso mesmo, pode chamar-se um lento e contínuo martírio, para cuja realização nos adverte essa divina sentença de Jesus Cristo: “O Reino dos céus é arrebatado à força e são os violentos que o conquistam” (Mt 11, 12).
                A este fim, pois, dirijamos os nossos esforços, apoiando-nos na graça divina; a isto nos excite o exemplo da santa virgem e mártir Maria Goretti; e que ela, do trono celeste donde goza a eterna bem-aventurança, por suas preces nos alcance do divino Redentor que todos nós, cada um em sua própria e peculiar condição de vida, sigamos alegres, prontos e operantes os seus memoráveis passos.

 [1]  S. João Damasceno, De fide orthod., 1.4.24 (PL 94, 1210).

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