Havia na Normandia um fidalgo bastante pobre, que só podia dispor de umas
poucas moedas para comprar diariamente seu alimento.
Uma certa manhã, verificou que só
tinha em casa um pão, e decidiu comprar um pouco de vinho com algumas moedas de
pouco valor. Foi à taberna próxima e pediu vinho.
O taberneiro, que era um homem
grosseiro e desagradável, serviu-lhe de má vontade um copo de vinho.
Colocou-o na mesa tão bruscamente,
que derramou quase a metade. Em vez de desculpar-se, disse com insolência:
“O senhor está com sorte. O vinho
derramado significa alegria e riquezas”.
O fidalgo não quis protestar contra
aquele mal educado, pois seria trabalho perdido. Mas achou que de algum modo
deveria ajustar essas contas, e pediu que o taberneiro lhe trouxesse um pedaço
de queijo.
O homem apanhou a moeda bruscamente
e foi ao andar de cima buscar o queijo.
Enquanto isso o fidalgo levantou-se,
abriu a torneira do tonel de vinho e deixou que ele escoasse livremente,
formando uma lagoa vermelha no meio da taberna.
Quando o taberneiro voltou e viu o
que acontecera, avançou furiosamente sobre o fidalgo.
Este se defendeu e conseguiu
lançá-lo de encontro ao tonel, que caiu ao chão junto com seu dono, entornando
o que restava do vinho.
Acudiram vizinhos e soldados, separaram os contendores e os levaram junto
ao rei.
O taberneiro falou primeiro e pediu
uma indenização.
Antes de dar a sentença, o rei quis
ouvir também o fidalgo, que narrou o sucedido com toda a veracidade, e
acrescentou:
“Senhor, este homem me disse, quando
entornou a metade do vinho que me vendera, que isso era sorte minha, pois vinho
derramado significa alegria, e que eu me tornaria rico.
“Pensei então que, se eu me tornaria
rico por ter derramado só meio copo de vinho, o bom taberneiro se tornaria
muito mais rico e feliz se derramasse meio tonel.
“Cheio de reconhecimento e gratidão,
resolvi então abrir a torneira do tonel, e o resto já conheceis”.
O rei e toda a corte se divertiram
com a engenhosa justificativa, e o fidalgo foi dispensado sem pagar a
pretendida indenização.