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Friday, 11 October 2024

Friday's Sung Word: "O Cravo Brigou com a Rosa" (in Portuguese)

O cravo brigou com a rosa
Debaixo de uma sacada
O cravo saiu ferido
E a rosa despedaçada

O cravo ficou doente
E a rosa foi visitar
O cravo teve um desmaio
E a rosa pôs-se a chorar.

 

You can listen "O Cravo Brigou com a Rosa" sung by the Orquestra e Coro Carroussell here.

Friday, 4 October 2024

Friday's Sung Word: "Ciranda Cirandinha" (in Portuguese)

CIRANDA - a round dance of Portuguese origin found throughout Brazil in both children's and adult versions. The children's ciranda is a round game with sung verses. The adult version is a group dance performed in a circle around a small ensemble of musicians and a singer.  
CIRANDA, CIRANDINHA - is a children ciranda game where the children, hand in hand, walk clockwise while singing the song. Once finished, someone is invited to go to the center and recite a poem, usually a "quadra", traditional poem form of four verses of seven sylabs.

 

SONG:
Ciranda, cirandinha
Vamos todos cirandar
Vamos dar a meia volta
Volta e meia vamos dar"

O anel que tu me deste
Era vidro e se quebrou.
O amor que tu me tinhas
Era pouco e se acabou.

INVITATION:
Senhor(a) N.N.,
Entre dentro desta roda,
diga um verso bem bonito,
diga "adeus" e vá-se embora.

You can listen "Ciranda,Cirandinha" sung by the Orquestra e Coro Carroussell here.

Saturday, 7 September 2024

Saturday's Good Reading: "O Advogado do Sacristão" by Ruth Guimarães (in Portuguese)

 

Um sacristão estava distribuindo círios para quem quisesse acompanhar a procissão do Senhor Morto, em certa sexta-feira da Paixão, e sobrou um. Procurou com os olhos, estavam todos servidos. Entrou na igreja, colocou o círio atrás da porta e falou:

- Este aqui fica para o diabo.

Passado algum tempo, durante um naufrágio, o sacristão foi aprisionado pelos piratas e levado para a ilha dos Mouros. Andava desesperado, quando uma voz falou perto dele:

- Quando sentir bater no seu rosto uma ramada, agarre-se nela.

Ele assim fez. Sentindo o contato dos galhos, agarrou-se aos ramos invisíveis. No mesmo instante deu um vento forte, e quando ele viu estava descendo diante da sua porta.

Porém, não ficou sabendo quem foi o seu benfeitor. Como gostava de viajar, saiu novamente correndo mundo, e, desta vez a pé, por uma região desolada e pobre. Acabou-se o dinheiro, não encontrava trabalho e parou diante de uma granja. Vendo tantas galinhas, pediu que a mulher lhe fritasse meia dúzia de ovos, pelo amor de Deus. Não tinha dinheiro para pagar, mas iria correr mundo e quando voltasse, assim o ajudasse Deus, pagaria a dívida.

- E desta vez acho que ficarei curado da mania de viajar. Vou ficar quieto na sacristia da igreja da minha terra, que é um lugar santo.

A mulher fritou os seis ovos, ele os comeu, deliciadamente, e partiu.

Muitas aventuras o esperavam, andou ainda bastante, porém sorriu-lhe a sorte, progrediu, fez bons negócios, enriqueceu. Quis fazer duas coisas imediatamente: pagar aqueles seis ovos comidos há tanto tempo, dez anos ou mais, e voltar para a quietude da sua igreja.

Uma tarde, estava a granjeira diante da porta, viu apear de um cavalo baio, com arreios de couro macio e prata, um homem bem-vestido. Não o reconheceu senão quando ele contou que era o devedor dos seis ovos.

- Vim pagar-lhe, boa mulher, que me atendeu na hora da fome e da necessidade. Quero pagar tudo e deixar-lhe ainda uma boa quantia de presente.

A ganância mordeu o coração da mulher, vendo-o tão generoso, parecendo endinheirado.

- Vou fazer as contas - respondeu de cara fechada.

- Contas? Que contas? - estranhou o homem. - Pois então lá é preciso estar fazendo contas para saber o preço de seis ovos? Que lhe deu, boa mulher?

E ela lhe apresentou uma conta fantástica, uma lista imensa com o preço de milhares de galinhas.

- Que é isso? - perguntou o homem.

- Se eu tivesse posto aqueles seis ovos para chocar, teriam saído cinco franguinhas e um frango. As frangas botariam e tornariam a chocar. Em dez anos, eu teria tudo isto que está aqui nesta lista.

Como o homem se recusasse a pagar aquele absurdo, foram todos ao juiz mais próximo, e o julgamento do caso ficou marcado para daí a uns dias.

Muito desgostoso, foi o antigo sacristão andar um pouco, para espairecer. Andava e pensava, de cara amarrada, cenho franzido, temendo já tornar a ficar pobre, por causa da ambição da granjeira. Numa de suas voltas, encontrou-se com um homem, todo vestido de preto, de colarinho duro, sapatos de verniz, muito bem penteado.

- Que mal o aflige, amigo, que o vejo tão transtornado?

Contou-lhe tudo o homem, e o outro, sorrindo, falou:

- Ora, não é caso para tristezas. Acontece que sou advogado. O senhor ainda nem pensou em contratar os serviços de um profissional?

- Ainda não.

- Pois então, eu me considero contratado. Vá tranquilo. No dia do julgamento, estarei lá para defendê-lo.

Parecia tão seguro de si que o homem se animou.

Chegou o dia do julgamento. Começou a sessão. Alguns casos foram julgados. E foi a vez do sacristão. E nada de aparecer o advogado. O juiz esperou. Nada. Começou a ficar impaciente, fulminando com o olhar o pobre homem, que ainda estava mais agoniado. E o advogado não aparecia. Ele estava vendo que, por falta de defesa, ia ser obrigado a entregar todo o seu dinheiro, ia ser preso, iam matá-lo. Suava frio e maldizia a hora em que aceitara o serviço de qualquer desconhecido. Nisso, o advogado entrou. O homem se animou, mas olhando para ele, viu-lhe a barbicha em ponta, os pés de pato e tremeu.

"Com quem me meti, neste embaraço! E agora mais esta. Acabo perdendo também a alma"

Porém o temível advogado tranquilizou-o:

- Se lembra do círio que deixou para mim, atrás da porta da igreja? Em agradecimento, já o livrei da prisão na ilha dos Mouros e aqui estou novamente para tornar a salvá-lo. Tranquilize-se que não quero a sua alma.

E dirigindo-se ao juiz, que não sabia da sua condição satânica, falou, cortesmente:

- Queira desculpar o meu atraso, estava cozinhando um pouco de feijão, para plantar.

- Estava fazendo o quê!?

- Estava cozinhando feijão para plantar - repetiu o advogado, insensível às risadas que estalavam de todos os lados, ao ouvir o povo declaração tão esquisita.

O juiz recostou-se na sua alta cadeira e riu também.

- Amigo, - disse ele - trabalho completamente perdido, pois feijão cozido não nasce.

- Então, por que estamos aqui debatendo se de ovos fritos nascem pintos?

E foi assim que o sacristão pôde voltar em paz à sua igreja.

 

Ruth Guimarães. Lendas e Fábulas do Brasil. 1964.

 

Wednesday, 14 August 2024

Wednesday's Good Reading: "O Padre e o Menino Esperto" by Ruth Guimarães (in Portuguese)

 

Um padre viajava, certa vez, pelas aldeias, escarranchado* numa velha besta ruça. À margem de um rio largo, encontrou um moleque brincando.

– Menino! – Perguntou ele, querendo passar para o outro lado. – Esse rio é fundo?

– Que esperança! – respondeu o menino com uma carinha de anjo. - O gado do meu pai atravessa aí, com a água pelo peito.

O padre, em vista dessa informação, tocou a besta para a água, mas o rio era de uma fundura sem fim, e a besta perdeu o pé. Ela e o padre desapareceram rio adentro, rodaram arrastados pela correnteza, e somente a muito custo conseguiram se salvar. Quando o padre atingiu a margem onde estava o menino, perguntou:

- Onde você mora?

- Perto daqui.

– Quero ir lá.

Foram, mas não encontraram ninguém em casa.

– Onde está seu pai, menino?

- Papai foi plantar o que não nasce.

– E sua mãe?

- Foi trabalhar para comer ontem.

– Esperarei que eles cheguem – declarou o padre, fechando a carranca.

Os pais do menino se demoraram muito, porém quando apareceram, lá estava o padre sentado, esperando, e aí não mais de carranca fechada, e sim todo sorridente.

– Que menino esperto esse seu filho! – disse ele ao casal. – É muito inteligente. Quando eu vinha para cá, ele me disse que o gado do seu pai atravessava o rio com água pelo peito.

– É verdade, – falou o pai - nós criamos patos, eles não afundam.

O padre disfarçou uma careta.

– Pois é – disse ele, sorrindo amarelo. – Ele disse que a senhora tinha ido trabalhar para a família comer ontem.

– Está certo – disse a mãe. – Fui fazer pães para pagar uns que tomei de empréstimo.

– Ele disse também que o senhor foi plantar o que não nasce.

– É isso mesmo – disse o pai. – Fui ao enterro de um dos meus amigos.

"Esse moleque me fez tomar um banho no rio, e quase morrer afogado, mas ele me paga" – pensou o padre. E continuou em voz alta:

- Se os senhores não se incomodassem, eu levaria o menino comigo. Ele é tão inteligente, que é pena deixá-lo na roça, onde o mais que poderá aprender é carpir, cuidar de plantações de milho e feijão miúdo. Se for comigo, será diferente. Frequentará escolas, e poderá vir a ser um grande homem…

Tanto falou, tanto insistiu, que conseguiu o consentimento dos pais do menino e o levou para a cidade. Mal chegaram, o padre perguntou:

- O que é isto onde moro?

- Casa – respondeu o garoto, prontamente, um pouco admirado da pergunta.

– Não é casa, é traficância. Você vai apanhar, para não falar mais bobagem.

Pegou um chicote e deu-lhe umas lambadas na perna.

- O que é que eu sou?

- Padre.

- Não está certo. Sou papa-cristo.

- O que é minha empregada?

- Mulher.

– Não é mulher, é folgazona.

E dava-lhe de chicote.

– O que é isso, menino? – dizia, abrindo a torneira.

– Água.

– Não é água, é abundância.

– Que é isto?

- É um gato – dizia o menino amedrontado.

– Não é gato, é papa-rato.

– E isto?

- Fogo.

– Não é fogo, é esquenta-mundo.

E batia de chicote no garoto. Quando se cansou, guardou o rabo-de-gato e foi dormir a sesta.

Então, o menino pegou o gato, amarrou-lhe um feixe de sapé no rabo e pôs fogo. O bichano, sentindo o rabo queimar, correu pela casa, espantado, e foi parar no telhado, miando desesperadamente. Em pouco tempo, ateou fogo à casa. O menino, vendo o estrago feito, trancou a porta do quarto onde dormia o padre, amontoou os móveis diante dela, e começou a gritar, com toda a força dos pulmões:

 

        "Acorda seu papa-cristo,

        que lá vai o papa-rato

        com o esquenta–mundo no rabo!

        Acorde com a abundância,

        Que leva o diabo à traficância!"

 

O padre acordou e começou a berrar:

- Menino, destranque a porta! – gritava quase asfixiado pela fumaça.

E o menino, sem piedade:

- Não é porta, é batedeira.

– Menino, põe a chave por baixo da porta!

- Não é chave, é giradeira.

– Menino, traga água.

– Não é agua, é abundância.

– Apague o fogo, menino!

- Não é fogo, é esquenta-mundo.

O menino, então, pegou a trouxinha de roupas, e saiu correndo para a sua casa, sem nem olhar para trás.

Wednesday, 17 July 2024

Wednesday's Good Reading: "A Mulher que Queria ser Imortal" by Ruth Guimarães (in Portuguese)

 

Em certa cidade havia, há muitos e muitos anos, uma velha e rica senhora que, atacada de estranha loucura, queria se tornar imortal. Quanto mais envelhecia, mais se apossava dela o medo da morte. Rezava todos os dias e todas as noites, pacientemente, e tanto pediu a Deus que lhe concedesse a graça de não morrer que acabou conseguindo mais ou menos o que queria.

Conseguiu-o para seu mal, como se viu mais tarde.

O caso foi que um dia sonhou que um anjo de asas cintilantes descia do céu. Ela se encolheu assustada, e, ao mesmo tempo, esperançosa. Seu quarto havia se enchido de uma radiante claridade, como se de repente se tivesse transformado numa opala gigantesca brilhando ao sol. E quando o anjo falou, todas as coisas que faziam algum rumor, dentro da noite, os grilos, as aves noturnas, os carros, as pessoas que passavam falando alto ou assobiando, tudo se calou, tomado de espanto, tudo ficou escutando a mensagem do céu.

E o anjo falou:

- O senhor Deus ouviu teus rogos. Ele manda te dizer que faças construir uma igreja. Durarás tanto quanto durar essa igreja.

Disse e desapareceu.

A velha senhora acordou sobressaltada, e nem pôde mais dormir o resto da noite, de tanta impaciência. Mal o sol espiou o quarto, pelas frestas da janela, a velha se levantou e saiu. Todos a viram muito ativa o dia todo, dando ordens, arranjando empregados, indo daqui para ali, à procura de arquitetos. À tarde, soube-se que ela havia mandado construir uma igreja de pedra.

 Para que uma igreja de pedra? – perguntavam, estranhando, pois as igrejas da cidade eram de tijolo e cal, e duravam bastante, apesar disso.

E ninguém sabia dar resposta.

O espanto da gente que habitava a cidade cresceu, quando se soube que aquela velhota maluca, em vez de ficar em casa, calmamente, recostada em gostosa cadeira de balanço, contando histórias ao netinhos, ia todos os dias fiscalizar a construção da igreja, incitando os pedreiros, aos gritos:

- Andem depressa com isso. Quero ver a igreja pronta, senão morro.

Os pedreiros abriam a boca, pasmados, sem entender patavina daquele mistério.

No dia em que a igreja ficou terminada, a velha senhora deu uma festa e viram-na brincar e rir, como se fosse uma menina. E desde então ela ria muito, seguidamente, e passava com um orgulhoso ar de posse, diante da igreja de pedra, magnífica e quase eterna: a sua vida de pedra.

Os anos foram se passando, morreram todos os velhos do lugar, e só ela permanecia firme. Quando lhe vinham contar a morte de alguém, ela casquinava um risinho assim: "Oh! Oh! Eh! Eh! Eh!", como se dissesse para si mesma: "Comigo isso não acontecerá".

Com o tempo, sua família foi se extinguindo. Morreram-lhe os filhos, os netos, os bisnetos e os netos de seus bisnetos. Ela foi ficando sozinha no enorme palácio vazio, velha, velha, enrugada, estranha, irreconhecível. Não tinha mais com quem falar, pois morreram todos os seus conhecidos. E os moços, cujo espanto não tinha limites diante daquela velhinha infinita, não queriam saber de prosa com ela e tinham até medo de vê-la. A mulher já não contava os anos um por um. Contava por séculos. Fez trezentos, quatrocentos anos e depois passou a ter cinco, seis, sete séculos. Então começou a desejar e a pedir a morte, espantada com sua medonha solidão.

Porém a sentença de Deus estava dada: "Duraria quanto durasse a igreja de pedra".

Logo se espalhou pela cidade que a velha senhora tinha arranjado outra mania. Sentava-se à porta do seu belo palácio, e perguntava aos que passavam:

- A igreja de pedra caiu?

- Não, minha senhora – respondiam eles, admirados. – Não cairá tão cedo.

E ela suspirava:

- Ah! Meu Deus!

Passavam-se os anos, e ela perguntava cada vez mais ansiosa:

- Quando cairá a igreja de pedra?

- Oh, minha senhora, quem pode saber quanto tempo durarão as pedras uma sobre as outras?

E todos tinham muita raiva e muito medo dela, pois fazia tais perguntas, além de cometer o desaforo de não morrer.

A velha senhora foi, por fim, à casa do padre, contou-lhe tudo e pediu que a deixasse ficar num caixão, dentro da igreja, esperando a morte.

Dizem que está ali até agora, e reza sem parar, todos os minutos de todos os dias, pedindo a Deus que a igreja caia.

Wednesday, 6 March 2024

Good Reading: "Os Três Desejos" by Ruth Guimarães (in Portuguese)

 

Um velho e uma velha, numa noite de frio, de muito frio mesmo, quando os animais se extanguiam em suas tocas, e o vento descabelava as árvores, sentaram-se diante de um bom fogo de lenha, na taipa do fogão.

Sentaram-se e ficaram. Não conversavam, pois não tinham assunto. Pouco saíam de casa, não trabalhavam, a não ser na sua rocinha, não frequentavam a casa dos outros, não liam jornais, nem livros, nem iam ao cinema, nem a teatro, não viajavam. Portanto, não tinham assunto. Deixaram-se estar muito calados, espiando as alegres labaredas, e esfregando de vez em quando as mãos engelhadas (envelhecidas). Foi ficando tarde, e eles não se animavam a ir para a cama, onde não se aqueceriam os seus velhos ossos, por falta de cobertores. Havia mais: a cabana tinha frinchas por todos os lados. Somente diante do fogo estavam bem. E assim foram ficando.

Já fazia muitas horas que estavam calados, olhando o fogo. A lenha se consumiu, no lugar das chamas ficou um brasido (grande quantidade de brasas) vermelho, alegre, com uns estalidos frequentes, o ar acima dele cintilava, relumeava, parecia vivo, o fogo era como um duendezinho que segredava coisas.

Sentiram fome. O velho olhava desconsolado do brasido para o fumeiro, onde não se pendurava nem um triste pedaço de chouriço. A velha seguiu-lhe o olhar e pôs em palavras o pensamento de ambos:

- Que bom, se caísse nesse brasido um pedaço bem grande de linguiça de carne de porco, temperada com uma pimentinha do reino e alho e cebola. E caindo, começasse a chiar, estalando, o cheiro se espalhando pela casa inteira. Ai, como havia de ser delicioso comê-la!

Nessa hora, os anjos do céu estavam dizendo amém. No mesmo instante caiu na brasa, tal como a velha dissera, um pedaço bem grande de linguiça de porco. Grossa, gordurenta, os pedaços de toucinho aparecendo, através da tripa fina, transparente, bem curada e seca. A linguiça se retorcia, assando, e o cheiro se espalhou, de bom tempero e de vianda (carne) curtida como se deve. Engoliam os velhos em seco, antegozando o momento de manducar (comer) o bom-bocado, quando o velho se lembrou de uma coisa em que ainda não pensara. Com efeito, se o pedido de linguiça fora tão prontamente atendido, um outro pedido, de dinheiro, por exemplo, seria atendido no momento, do mesmo modo.

– Estúpida – rosnou para a mulher. – Pedir linguiça. Bem se vê que você nasceu pobre, num monte de lixo. Por que não pediu riqueza, não pediu joias, não pediu dinheiro? Por que?

A velha se encolheu:

- Que sabia eu de pedidos? Como podia adivinhar que… que…

- Estúpida – tornou a gritar o velho, exasperado. - Sabe o que eu queria?

E antes de raciocinar, levado pela raiva, formulou o segundo desejo:

- Que essa linguiça saísse das brasas e se pendurasse no seu nariz!

O pedaço de linguiça deu um volteio, subiu e, diante do velho estupefato, grudou-se ao nariz da mulher.

– Uai! – berrou a mulher.

Agarrou-se à linguiça com as duas mãos, puxou, o velho foi ajudá-la.

– Aiaiaiaiaiai! Ai ai!

Puxa que puxa, a linguiça nada de sair.

A velha, desesperada, gritou:

- Eu quero já já, que essa linguiça…

- Não! – gritou o marido, tapando-lhe a boca com a mão. – Não. Vamos pedir uma coisa mais valiosa. Mulherzinha do meu coração! Deixa a linguiça aí, que não está incomodando tanto. Vamos pedir uma bonita casa.

– Não! – berrava a velha.

– Então um terreno com um formoso lago no centro.

– Não.

– Então uma arca cheia de moedas de ouro.

– Não e não.

Aproveitando-se de um momento em que o marido se distraiu e não teve tempo de lhe tapar a boca, ela falou, depressa:

- Quero que se desprenda do meu nariz essa linguiça.

E assim, viram eles satisfeitos os seus três desejos.