Thursday 5 September 2013

Christ en Croix by Émile Nelligan (in French)

Je remarquais toujours ce grand Jésus de plâtre
Dressé comme un pardon au seuil du vieux couvent,
Échafaud solennel à geste noir, devant
Lequel je me courbais, saintement idolâtre.

Or, l'autre soir, à l'heure où le cri-cri folâtre,
Par les prés assombris, le regard bleu rêvant,
Récitant Eloa, les cheveux dans le vent,
Comme il sied à l'Éphèbe esthétique et bellâtre,

J'aperçus, adjoignant des débris de parois,
Un gigantesque amas de lourde vieille croix
Et de plâtre écroulé parmi les primevères;

Et je restai là, morne, avec les yeux pensifs,
Et j'entendais en moi des marteaux convulsifs
Renfoncer les clous noirs des intimes Calvaires!

Le Vaisseau d'Or by Émile Nelligan (in French)

C'était un grand Vaisseau taillé dans l'or massif:
Ses mâts touchaient l'azur, sur des mers inconnues;
La Cyprine d'amour, cheveux épars, chairs nues,
S'étalait à sa proue, au soleil excessif.


Mais il vint une nuit frapper le grand écueil
Dans l'Océan trompeur où chantait la Sirène,
Et le naufrage horrible inclina sa carène
Aux profondeurs du Gouffre, immuable cercueil.


Ce fut un Vaisseau d'Or, dont les flancs diaphanes
Révélaient des trésors que les marins profanes,
Dégoût, Haine et Névrose, ont entre eux disputés.


Que reste-t-il de lui dans sa tempête brève?
Qu'est devenu mon coeur, navire déserté?
Hélas! Il a sombré dans l'abîme du Rêve!

Wednesday 4 September 2013

"O Bom Diabo" from "Histórias de Tia Nastácia" by Monteiro Lobato (in Portuguese)

XII
O Bom Diabo
      Houve um rei que tinha um filho de dezoito anos.
     "Meu filho — disse a rainha — é tempo de eu ler a tua sina" — e leu a sina do moço. Oh, bem triste! O moço tinha a sina de morrer enforcado. A rainha caiu numa grande tristeza, mas nada contou ao filho. "Que abatimento é esse, minha mãe?" — perguntava ele, e a rainha suspirava.
     Mas tanto ele insistiu com sua mãe para que lhe contasse a causa da tristeza, que ela contou.  "Meu filho, é que tua sina é morreres enforcado."
    O rapaz procurou consolá-la, dizendo que morrer todos morriam, e que tanto fazia morrer disto como daquilo. Mas já que sua sina era aquela, só desejava uma coisa: licença para correr mundo e ser enforcado longe dali, de modo que não desse maior desgosto aos seus. A rainha sentiu mas concedeu a licença pedida.
      No dia da partida o rei deu-lhe uma grande soma de dinheiro para a viagem — e lá se foi ele pelo mundo afora. Correu cidades e reinos, até que por fim chegou a um sítio onde havia uma capela de S. Miguel, com a imagem deste santo e a figura do diabo, mas tudo em ruínas. O príncipe parou ali, com a idéia de reconstruir a capelinha e restaurar as imagens.
      Chamou operários e pôs mãos à obra. Deixou tudo novinho em folha, uma beleza. Quando o pintor veio receber o seu dinheiro, contou que sobrara um pouco de tinta porque havia deixado de pintar a figura do diabo.
      — Por que o não pintou? Pinte o diabo também — ordenou o príncipe. E o pintor pintou o diabo.
      Concluída aquela tarefa, o príncipe continuou sua viagem pelo mundo. Certo dia foi dar à casa duma velha, à qual pediu pouso. Entrou, jantou, e depois começou a contar o dinheiro que ainda lhe restava. Vendo aquilo, a velha foi correndo dizer às autoridades que estava em sua casa um ladrão, contando o dinheiro que lhe havia roubado.
      Veio uma escolta, que prendeu o príncipe. Foi processado, julgado e condenado à morte na forca.  Mas no dia em que tinha de ser morto, lá na capelinha de S. Miguel o santo pôs-se a conversar com o diabo.
      — Então, estás agora bonito, hein diabo?
      — É verdade. Pintaram-me inteirinho.
      — E não sabes quem consertou esta capela e nos pintou?
      O diabo não sabia; o santo contou-lhe a história do príncipe que passara por ali, e disse mais que esse pobre moço fora preso, processado e julgado, e naquele mesmo dia ia ser erguido a uma forca por causa das intrigas de certa velha.
      O diabo não quis ouvir mais. Pulou num cavalo e foi voando à casa da velha; agarrou-a e levou-a ao rei, fazendo-a confessar toda a sua maquinação contra o moço. O rei deu ordens para que soltassem o preso e o trouxessem à sua presença.
      O diabo montou no cavalo e voou para a prisão onde o príncipe ia ser enforcado, e apresentou ao carrasco a ordem de soltura. O carrasco entregou-lhe o condenado, que lá se foi com o diabo para o palácio do rei.
      O rei indagou do príncipe quem era ele e de onde vinha. Sabendo de tudo, condenou a velha a restituir-lhe o dinheiro e a ir para a prisão em lugar dele. Terminado o caso, o moço partiu novamente a correr mundo.
      Pelo caminho encontrou um fidalgo, ao qual contou tudo.
      O fidalgo disse:
      — E não sabes quem te valeu?
      — Não sei de nada — respondeu o príncipe.
     — Pois fica sabendo que foi o diabo da capelinha de S. Miguel, e esse diabo sou eu. No dia em que iam enforcar-te S. Miguel me contou tudo. Montei num cavalo e voei à casa da velha; agarrei-a e levei-a ao rei, para que tudo se esclarecesse.
      — E a que devo eu tanta bondade? — perguntou o príncipe.
      — Ah! — exclamou o diabo, rindo-se. — Tudo deves àquele bocadinho de tinta que mandaste aplicar sobre minha figura. Agora estás livres da má sina, porque a velha vai ser enforcada em teu lugar. Podes voltar sossegadamente ao reino de teu pai, que nada mais te acontecerá.
      O príncipe assim fez. Antes, porém, voltou à capelinha de S. Miguel para agradecer ao bom santo — e enquanto rezava viu a figura do diabo muito contente da vida na sua pintura nova.
+++
      — Pois gostei! — gritou Emília. — Está aí uma historinha que descansa a gente daquelas repetições das outras. E mais que tudo gostei da camaradagem entre o santo e o diabo.
      — Sim — disse dona Benta. — Como os dois vivessem na mesma capela, sozinhos, acabaram em muito bons termos, como se vê na história. O diabo é o símbolo da maldade, mas até a maldade amansa quando em companhia da bondade. De viverem juntos ali na capelinha, o santo e o diabo se transformaram em amigos, e os bons sentimentos de um passaram para o outro.
      — Influência do meio! — gritou Pedrinho, que andava a ler Darwin.
      Narizinho confessou que gostava muito das histórias com o diabo dentro, e disse que todas elas confirmavam o dito popular de que o diabo não é tão feio como o pintam.
      — Credo! — exclamou tia Nastácia fazendo três benzeduras. — Como é que uma menina de boa educação tem coragem de dizer isso do canhoto?
      Narizinho arregalou os olhos.
      — Como? É boa! Pois você mesma não acaba de contar a história dum diabo bom?
      — Mas isso é história, menina. História é mentira. O "cão" é "cão". Não muda de ruindade.
      — Se o cão é cão, viva o diabo! — gritou Emília. — Não há animal melhor, nem mais nobre que o cão. Chamar ao diabo cão, é fazer-lhe o maior elogio possível.
      — Dona Benta — exclamou tia Nastácia horrorizada — tranque a boca dessas crianças. Estão ficando os maiores hereges deste mundo. Chegam até a defender o canhoto, credo!...
      — Olhe, Nastácia, se você conta mais três histórias de diabo como essa, até eu sou capaz de dar um viva ao canhoto — respondeu respondeu dona Benta.
      Tia Nastácia botou as mãos e pôs-se a rezar.

Poema em Linha Reta by Álvaro de Campos (Fernando Pessoa) (in Portuguese)

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

"The Last Hunters" by Bernie Wrightson (in English)

in Badtime Stories - Graphic Masters, 1972.








Tuesday 3 September 2013

"Ennui" by Sir Alfred Douglas (in English)

Alas! and oh that Spring should come again
Upon the soft wings of desired days,
And bring with her no anodyne to pain,
And no discernment of untroubled ways.
There was a time when her yet distant feet,
Guessed by some prescience more than half divine,
Gave to my listening ear such happy warning,
That fresh, serene, and sweet,
My thoughts soared up like larks into the morning,
From the dew-sprinkled meadows crystalline.

Soared up into the heights celestial,
And saw the whole world like a ball of fire,
Fashioned to be a monster playing ball
For the enchantment of my young desire.
And yesterday they flew to this black cloud,
(Missing the way to those ethereal spheres.)
And saw the earth a vision of affright,
And men a sordid crowd,
And felt the fears and drank the bitter tears,
And saw the empty houses of Delight.

The sun has sunk into a moonless sea,
And every road leads down from Heaven to Hell,
The pearls are numbered on youth's rosary,
I have outlived the days desirable.
What is there left ? And how shall dead men sing
Unto the loosened strings of Love and Hate,
Or take strong hands to Beauty's ravishment ?
Who shall devise this thing,
To give high utterance to Miscontent,
Or make indifference articulate ?

Le Petit Prince by Sain-Exupéry (chapter V in French)

   La cinquième planète était très curieuse. C'était la plus petite de toutes. Il y avait là juste assez de place pour loger un réverbère et un allumeur de réverbères. Le petit prince ne parvenait pas à s'expliquer à quoi pouvaient servir, quelque part dans le ciel, sur une planète sans maison, ni population, un réverbère et un allumeur de réverbères. Cependant il se dit en lui-même:
   - Peut-être bien que cette homme est absurde. Cependant il est moins absurde que le roi, que le vaniteux, que le businessman et que le buveur. Au moins son travail a-t-il un sens. Quand il allume son réverbère, c'est comme s'il faisait naître une étoile de plus, ou une fleur. Quand il éteint son réverbère ça endort la fleur ou l'étoile. C'est une occupation très jolie. C'est véritablement utile puisque c'est joli.
   Lorsqu'il aborda la planète il salua respectueusement l'allumeur:
   -Bonjour. Pourquoi viens-tu d'éteindre ton réverbère?
   -C'est la consigne, répondit l'allumeur. Bonjour.
   -Qu'est ce la consigne?
   -C'est d'éteindre mon réverbère. Bonsoir.
   Et il le ralluma.
  -Mais pourquoi viens-tu de rallumer?
   -C'est la consigne, répondit l'allumeur.
   -Je ne comprends pas, dit le petit prince.
   -Il n'y a rien à comprendre, dit l'allumeur. La consigne c'est la consigne. Bonjour.
   Et il éteignit son réverbère.
   Puis il s'épongea le front avec un mouchoir à carreaux rouges.
  -Je fais là un travail terrible. C'était raisonnable autrefois. J'éteignais le matin et j'allumais le soir. J'avais le reste du jour pour me reposer, et le reste de la nuit pour dormir...
   -Et, depuis cette époque, la consigne à changé?
  -La consigne n'a pas changé, dit l'allumeur. C'est bien là le drame! la planète d'année en année a tourné de plus en plus vite, et la consigne n'a pas changé!
   -Alors? dit le petit prince.
  -Alors maintenant qu'elle fait un tour par minute, je n'ai plus un seconde de repos. J'allume et j'éteins une fois par minute!
  -Ca c'est drôle! les jours chez toi durent une minute!
  -Ce n'est pas drôle du tout, dit l'allumeur. Ca fait déjà un mois que nous parlons ensemble.
  -Un mois?
  -Oui. Trente minutes. Trente jours! Bonsoir.
  Et il ralluma son réverbère.
  Le petit prince le regarda et il aima cet allumeur qui était si fidèle à sa consigne. Il se souvint des couchers de soleil que lui-même allait autrefois chercher, en tirant sa chaise. Il voulut aider son ami:
  -Tu sais... je connais un moyen de te reposer quand tu voudras...
  -Je veux toujours, dit l'allumeur.
  Car on peut être, à la fois, fidèle et paresseux.
  Le petit prince poursuivit:
  -Ta planète est tellement petite que tu en fais le tour en trois enjambées. Tu n'as qu'à marcher lentement pour rester toujours au soleil. Quand tu voudras te reposer tu marcheras... et le jour durera aussi longtemps que tu voudras.
  -Ca ne m'avance pas à grand chose, dit l'allumeur. Ce que j'aime dans la vie, c'est dormir.
  -Ce n'est pas de chance, dit le petit prince.
  -Ce n'est pas de chance, dit l'allumeur. Bonjour.
  Et il éteignit son réverbère.
  Celui-là, se dit le petit prince, tandis qu'il poursuivait plus loin son voyage, celui-là serait méprisé par tous les autres, par le roi, par le vaniteux, par le buveur, par le businessman. Cependant c'est le seul qui ne me paraisse pas ridicule. C'est, peut-être, parce qu'il s'occupe d'autre chose que de soi-même.
  Il eut un soupir de regret et se dit encore:
  -Celui-là est le seul dont j'eusse pu faire mon ami. Mais sa planète est vraiment trop petite. Il n'y a pas de place pour deux...
  Ce que le petit prince n'osait pas s'avouer, c'est qu'il regrettait cette planète bénie à cause, surtout, des mille quatre cent quarante couchers de soleil par vingt-quatre heures!