Thursday, 9 January 2014

Magnificat by Álvaro de Campos (Fernando Pessooa) (in Portuguese)


Quando é que passará esta noite interna, o universo,
E eu, a minha alma, terei o meu dia?
Quando é que despertarei de estar acordado?
Não sei. O sol brilha alto,
Impossível de fitar.
As estrelas pestanejam frio,
Impossíveis de contar.
O coração pulsa alheio,
Impossível de escutar.
Quando é que passará este drama sem teatro,
Ou este teatro sem drama,
E recolherei a casa?
Onde? Como? Quando?
Gato que me fitas com olhos de vida, quem tens lá no fundo?
É esse! É esse!
Esse mandará como Josué parar o sol e eu acordarei;
E então será dia.
Sorri, dormindo, minha alma!
Sorri, minha alma, será dia!

Wednesday, 8 January 2014

"Como Sombras de Nuvens que Passam" (Canto V) by José Thiesen (in Portuguese)

Canto V

     - Pára e me ouve! Foi ótimo, foi maravilhoso. És importante pra mim, mas chega! Eu não suporto mais essa dor, a dor de não te alcançar! Teu jeito me fere, teu desleixo, tua obstinação, teu radicalismo! Ferem-me demais! A quanto tempo não conseguimos conversar? Somente nos ferimos com as palavras, com os olhares não trocados! Então te somes por todos esses dias e noites, dizendo que não podes conciliar a mim e tua vida, pra então vir chorando na chuva pedir o meu regaço, como se nada houvesse? Nada está mais ótimo e maravilhoso! Tudo caiu. Eu desmoronei. Fica com a minha toalha de festa.
     
     Fechei-lhe a porta e chorei eu.

   Tudo muito teatral, nós algumas noites antes. Estávamos numa praça escura e um chuvisqueiro miúdo antecipava a noite de hoje. Sentados num banco, silenciosos. Um pouco além, a avenida cheia de luz, ônibus passando, pessoas a correr.

   Eu havia escutado Luciano e suas razões tão certas, precisas, lógicas para terminarmos nossa relação e continuava em silêncio. As idéias, as palavras me passavam pela mente, mas a boca resignava-se á inutilidade de falar.

     Luciano, sempre incomodado com silêncios, perguntou-me em que pensava.

     - Estou lembrado as palavras de meu psicólogo. Ele me disse que quando uma relação vai mal, não a podemos terminar sem ter resolvido os erros nela cometidos, pois do contrário vamos repetir os mesmos erros na próxima.

      - Mas nossa relação não tem problemas; o problema são os outros que não nos aceitam.

      - Certo. O problema são os outros.

   

    

Monday, 6 January 2014

The Maggi according to St. Matthew (in Portuguese)



1 Tendo, pois, Jesus nascido em Belém de Judá, no tempo do rei Herodes, eis que magos vieram do oriente a Jerusalém. 2 Perguntaram eles: Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no oriente e viemos adorá-lo. 3 A esta notícia, o rei Herodes ficou perturbado e toda Jerusalém com ele. 4 Convocou os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo e indagou deles onde havia de nascer o Cristo. 5 Disseram-lhe: Em Belém, na Judéia, porque assim foi escrito pelo profeta:

6 E tu, Belém, terra de Judá,
não és de modo algum a menor entre as cidades de Judá,
porque de ti sairá o chefe
que governará Israel, meu povo (Miq 5,2).

7 Herodes, então, chamou secretamente os magos e perguntou-lhes sobre a época exata em que o astro lhes tinha aparecido. 8 E, enviando-os a Belém, disse: Ide e informai-vos bem a respeito do menino. Quando o tiverdes encontrado, comunicai-me, para que eu também vá adorá-lo. 9 Tendo eles ouvido as palavras do rei, partiram. E eis que e estrela, que tinham visto no oriente, os foi precedendo até chegar sobre o lugar onde estava o menino e ali parou. 10 A aparição daquela estrela os encheu de profunda alegria. 11 Entrando na casa, acharam o menino com Maria, sua mãe. Prostrando-se diante dele, o adoraram. Depois, abrindo seus tesouros, ofereceram-lhe como presentes: ouro, incenso e mirra. 12 Avisados em sonhos de não tornarem a Herodes, voltaram para sua terra por outro caminho.

13 Depois de sua partida, um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse: Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito; fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para o matar. 14 José levantou-se durante a noite, tomou o menino e sua mãe e partiu para o Egito.
15 Ali permaneceu até a morte de Herodes para que se cumprisse o que o Senhor dissera pelo profeta:

Eu chamei do Egito meu filho (Os 11,1).

16 Vendo, então, Herodes que tinha sido enganado pelos magos, ficou muito irado e mandou massacrar em Belém e nos seus arredores todos os meninos de dois anos para baixo, conforme o tempo exato que havia indagado dos magos. 17 Cumpriu-se, então, o que foi dito pelo profeta Jeremias:

18 Em Ramá se ouviu uma voz,
choro e grandes lamentos:
é Raquel a chorar seus filhos;
não quer consolação,
porque já não existem (Jer 31,15)!

19 Com a morte de Herodes, o anjo do Senhor apareceu em sonhos a José, no Egito, e disse: 20 Levanta-te, toma o menino e sua mãe e retorna à terra de Israel, porque morreram os que atentavam contra a vida do menino. 21 José levantou-se, tomou o menino e sua mãe e foi para a terra de Israel. 22 Ao ouvir, porém, que Arquelau reinava na Judéia, em lugar de seu pai Herodes, não ousou ir para lá. Avisado divinamente em sonhos, retirou-se para a província da Galiléia 23 e veio habitar na cidade de Nazaré para que se cumprisse o que foi dito pelos profetas:
Será chamado Nazareno.

Sunday, 5 January 2014

"Amor e Vida" by Raimundo Correia (in Portuguese)



Esconde-me a alma, no íntimo, oprimida,
Este amor infeliz, como se fora
Um crime aos olhos dessa, que ela adora,
Dessa, que crendo-o, crera-se ofendida.

A crua e rija lâmina homicida
Do seu desdém vara-me o peito; embora,
Que o amor que cresce nele, e nele mora,
Só findará quando findar-me a vida!

Ó meu amor! como num mar profundo,
Achaste em mim teu álgido, teu fundo,
Teu derradeiro, teu feral abrigo!

E qual do rei de Tule a taça de ouro,
Ó meu sacro, ó meu único tesouro!
Ó meu amor! tu morrerás comigo!

Saturday, 4 January 2014

"The Song of Songs of Solomon" (Chapter IV in English)



1 Bridegroom: Ah, you are beautiful, my beloved,
ah, you are beautiful!
Your eyes are doves
behind your veil.
Your hair is like a flock of goats
streaming down the mountains of Gilead.

2 Your teeth are like a flock of ewes to be shorn,
which come up from the washing,
All of them big with twins,
none of them thin and barren.

3 Your lips are like a scarlet strand;
your mouth is lovely.
Your cheek is like a half-pomegranate
behind your veil.

4 Your neck is like David's tower
girt with battlements;
A thousand bucklers hang upon it,
all the shields of valiant men.

5 Your breasts are like twin fawns,
the young of a gazelle
that browse among the lilies.

6 Until the day breathes cool and the shadows lengthen,
I will go to the mountain of myrrh,
to the hill of incense.

7 You are all-beautiful, my beloved,
and there is no blemish in you.

8 Come from Lebanon, my bride,
come from Lebanon, come!
Descend from the top of Amana,
from the top of Senir and Hermon,
From the haunts of lions,
from the leopards' mountains.

9 You have ravished my heart, my sister, my bride;
you have ravished my heart with one glance of your eyes,
with one bead of your necklace.

10 How beautiful is your love, my sister, my bride,
how much more delightful is your love than wine,
and the fragrance of your ointments than all spices!

11 Your lips drip honey, my bride,
sweetmeats and milk are under your tongue;
And the fragrance of your garments
is the fragrance of Lebanon.

12 You are an enclosed garden, my sister, my bride,
an enclosed garden, a fountain sealed.

13 You are a park that puts forth pomegranates,
with all choice fruits;

14 Nard and saffron, calamus and cinnamon,
with all kinds of incense;
Myrrh and aloes,
with all the finest spices.

15 You are a garden fountain, a well of water
flowing fresh from Lebanon.

16 Bride: Arise, north wind! Come, south wind!
blow upon my garden
that its perfumes may spread abroad.
Let my lover come to his garden
and eat its choice fruits.

Friday, 3 January 2014

"Ouvir Estrelas" by Olavo Bilac (in Portuguese)




Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto,
Que para ouvi-las, muita vez desperto
Eu abro a janela, pálido de espanto...

E conversamos toda noite, enquanto
A via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir o sol saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?

E eu vos direi: Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas!