Sunday 19 January 2014

"Plenilúnio" by Raimundo Correia (in Portuguese)



Além nos ares, tremulamente,
Que visão branca das nuvens sai!
Luz entre as franças, fria e silente;
Assim nos ares, tremulamente,
Balão aceso subindo vai...

Há tantos olhos nela arroubados,
No magnetismo do seu fulgor!
Lua dos tristes e enamorados,
Golfão de cismas fascinador!

Astros dos loucos, sol da demência,
Vaga, noctâmbula aparição!
Quantos, bebendo-te a refulgência,
Quantos por isso, sol da demência,
Lua dos loucos, loucos estão!

Quantos à noite, de alva sereia
O falaz canto na febre a ouvir,
No argênteo fluxo da lua cheia.
Alucinados se deixam ir...

Também outrora, num mar de lua,
Voguei na esteira de um louco ideal;
Exposta aos éolos a fronte nua,
Dei-me ao relento, num mar de lua,
Banhos de lua que fazem mal.

Ah! quantas vezes, absorto nela,
Por horas mortas postar-me vim
Cogitabundo, triste, à janela,
Tardas vigílias passando assim!

E assim, fitando-a noites inteiras,
Seu disco argênteo na alma imprimi;
Olhos pisados, fundas olheiras,
Passei fitando-a noites inteiras,
Fitei-a tanto, que enlouqueci!

Tantos serenos tão doentios,
Friagens tantas padeci eu;
Chuva de raios de prata frios
A fronte em brasa me arrefeceu!

Lunárias flores, ao feral lume, —
Caçoilas de ópio, de embriaguez —
Evaporaram letal perfume...
E os lençóis d'água, do feral lume
Se amortalhavam na lividez...

Fúlgida névoa vem-me ofuscante
De um pesadelo de luz encher,
E a tudo em roda, desde esse instante,
Da cor da lua começo a ver.

E erguem por vias enluaradas
Minhas sandálias chispas a flux...
Há pó de estrelas pelas estradas...
E por estradas enluaradas
Eu sigo às tontas, cego de luz...

Um luar amplo me inunda, e eu ando
Em visionária luz a nadar,
Por toda a parte, louco, arrastando
O largo manto do meu luar...

Saturday 18 January 2014

Sonnet V by William Shakespeare (in English)




Those hours, that with gentle work did frame
The lovely gaze where every eye doth dwell,
Will play the tyrants to the very same
And that unfair which fairly doth excel;
For never-resting time leads summer on
To hideous winter, and confounds him there;
Sap checked with frost, and lusty leaves quite gone,
Beauty o'er-snowed and bareness every where:
Then were not summer's distillation left,
A liquid prisoner pent in walls of glass,
Beauty's effect with beauty were bereft,
Nor it, nor no remembrance what it was:
   But flowers distilled, though they with winter meet,
   Leese but their show; their substance still lives sweet.

Friday 17 January 2014

"The Song of Songs of Solomon" (Chapter V in English)



1 Bridegroom: I have come to my garden, my sister, my bride;
I gather my myrrh and my spices,
I eat my honey and my sweetmeats,
I drink my wine and my milk.
Daughters of Jerusalem: Eat, friends; drink! Drink freely of love!

2 Bride: 2 I was sleeping, but my heart kept vigil;
I heard my lover knocking:
"Open to me, my sister, my beloved,
my dove, my perfect one!
For my head is wet with dew,
my locks with the moisture of the night."

3 I have taken off my robe,
am I then to put it on?
I have bathed my feet,
am I then to soil them?

4 My lover put his hand through the opening;
my heart trembled within me,
and I grew faint when he spoke.

5 I rose to open to my lover,
with my hands dripping myrrh:
With my fingers dripping choice myrrh
upon the fittings of the lock.

6 I opened to my lover -
but my lover had departed, gone.
I sought him but I did not find him;
I called to him but he did not answer me.

7 The watchmen came upon me
as they made their rounds of the city;
They struck me, and wounded me,
and took my mantle from me,
the guardians of the walls.

8 I adjure you, daughters of Jerusalem,
if you find my lover -
What shall you tell him?-
that I am faint with love.

9 Daughters of Jerusalem: How does your lover differ from any other,
O most beautiful among women?
How does your lover differ from any other,
that you adjure us so?

10 Bride: My lover is radiant and ruddy;
he stands out among thousands.

11 His head is pure gold;
his locks are palm fronds,
black as the raven.

12 His eyes are like doves
beside running waters,
His teeth would seem bathed in milk,
and are set like jewels.

13 His cheeks are like beds of spice
with ripening aromatic herbs.
His lips are red blossoms;
they drip choice myrrh.

14 His arms are rods of gold
adorned with chrysolites.
His body is a work of ivory
covered with sapphires.

15 His legs are columns of marble
resting on golden bases.
His stature is like the trees on Lebanon,
imposing as the cedars.

16 His mouth is sweetness itself;
he is all delight.
Such is my lover, and such my friend,
O daughters of Jerusalem.

Thursday 16 January 2014

"Como Sombras de Nuvens que Passam" (Cantos VI and VII) by José Thiesen (in Portuguese)

Canto VI

     - Que vais fazer?

     - Vou para Itália, Eduardo.

     - Quando? Onde na Itália?

     - Um lugarejo perto de Rimini. Já está tudo acertado, casa, trabalho...

     - E ele?

     - Quem é "ele"? Foda-se "ele"!

     - Um lugarejo perto de Rimini?

     - Isso.

     - Estás fugindo. O que houve? Vocês brigaram?

     - Estamos bem e não estou fugindo, mas acabei com o romnace.

      - Eu não acredito! O que houve com o mundo? Só porque mudei-me pra New York, aquele fascista ganha as eleições no Brasil, vocês vão "dar um tempo" e te vais pra "um lugarejo perto de Rimini"? Então fica comigo aqui, no centro do mundo!

      - Luciano precisa resolver alguns problemas seus, eu quero trocar de ares, desanuviar a cabeça, só isso. E estamos bem agora, depois de ele ter dito uma crise de dúvidas e eu me ter afastado pra ele arranjar-se. Através duma agência consegui emprego pra colher azeitonas e ficarei na casa duma tal Rosa.

     Houve uma pausa e depois ele continuou: Acredite, não estou fugindo; nem estou sofrendo. Estava apaixonado e isso passou. Ou se não passou, passará. Mas não vou ficar à mercê de uma pessoa que me quer mas quer conforto familiar mais que a mim. Agora estou indo pra Itália; um mundo novo a desbravar; não sei o que há por lá, mas estou livre para descobrir.


Canto VII

     Eu e Eduardo fomos tomando na vida rumos distintos, em todos os sentidos. Enquanto ele renovava-se tendo romance novo a cada semana, bêbado com a vida novaiorquina, eu era muito, muito mais restrito e os poucos que tive, foram - ao menos de minha parte - sempre intensos, como se fossem minha última opção na vida.

     Poucos conseguiam dar-me o troco devido.

     Giorgio foi um deles.



 

Wednesday 15 January 2014

Soneto by Luiz Vaz de Camões (in English)



Sete anos de pastor Jacó servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
Mas, não servia ao pai, servira a ela,
Que só a ela por prêmio pretendia.

Os dias, na esperança de um só dia,
Passava, contentando-se com vê-la;
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe dera Lia.

Vendo o triste pastor que com enganos
Assim lhe era negada sua pastora
Como se a não tivera merecida.

Começou a servir outros sete anos
Dizendo: Mais servira, se não fôra
Para tão longo amor tão curta a vida.

Tuesday 14 January 2014

"The Divine Comedy" by Dante Alighieri (Inferno, Chant III) (in Italian)



Inferno: Canto III

Per me si va ne la citta` dolente,
  per me si va ne l'etterno dolore,
  per me si va tra la perduta gente.

Giustizia mosse il mio alto fattore:
  fecemi la divina podestate,
  la somma sapienza e 'l primo amore.

Dinanzi a me non fuor cose create
  se non etterne, e io etterno duro.
  Lasciate ogne speranza, voi ch'intrate".

Queste parole di colore oscuro
  vid'io scritte al sommo d'una porta;
  per ch'io: <<Maestro, il senso lor m'e` duro>>.

Ed elli a me, come persona accorta:
  <<Qui si convien lasciare ogne sospetto;
  ogne vilta` convien che qui sia morta.

Noi siam venuti al loco ov'i' t'ho detto
  che tu vedrai le genti dolorose
  c'hanno perduto il ben de l'intelletto>>.

E poi che la sua mano a la mia puose
  con lieto volto, ond'io mi confortai,
  mi mise dentro a le segrete cose.

Quivi sospiri, pianti e alti guai
  risonavan per l'aere sanza stelle,
  per ch'io al cominciar ne lagrimai.

Diverse lingue, orribili favelle,
  parole di dolore, accenti d'ira,
  voci alte e fioche, e suon di man con elle

facevano un tumulto, il qual s'aggira
  sempre in quell'aura sanza tempo tinta,
  come la rena quando turbo spira.

E io ch'avea d'error la testa cinta,
  dissi: <<Maestro, che e` quel ch'i' odo?
  e che gent'e` che par nel duol si` vinta?>>.

Ed elli a me: <<Questo misero modo
  tegnon l'anime triste di coloro
  che visser sanza 'nfamia e sanza lodo.

Mischiate sono a quel cattivo coro
  de li angeli che non furon ribelli
  ne' fur fedeli a Dio, ma per se' fuoro.

Caccianli i ciel per non esser men belli,
  ne' lo profondo inferno li riceve,
  ch'alcuna gloria i rei avrebber d'elli>>.

E io: <<Maestro, che e` tanto greve
  a lor, che lamentar li fa si` forte?>>.
  Rispuose: <<Dicerolti molto breve.

Questi non hanno speranza di morte
  e la lor cieca vita e` tanto bassa,
  che 'nvidiosi son d'ogne altra sorte.

Fama di loro il mondo esser non lassa;
  misericordia e giustizia li sdegna:
  non ragioniam di lor, ma guarda e passa>>.

E io, che riguardai, vidi una 'nsegna
  che girando correva tanto ratta,
  che d'ogne posa mi parea indegna;

e dietro le venia si` lunga tratta
  di gente, ch'i' non averei creduto
  che morte tanta n'avesse disfatta.

Poscia ch'io v'ebbi alcun riconosciuto,
  vidi e conobbi l'ombra di colui
  che fece per viltade il gran rifiuto.

Incontanente intesi e certo fui
  che questa era la setta d'i cattivi,
  a Dio spiacenti e a' nemici sui.

Questi sciaurati, che mai non fur vivi,
  erano ignudi e stimolati molto
  da mosconi e da vespe ch'eran ivi.

Elle rigavan lor di sangue il volto,
  che, mischiato di lagrime, a' lor piedi
  da fastidiosi vermi era ricolto.

E poi ch'a riguardar oltre mi diedi,
  vidi genti a la riva d'un gran fiume;
  per ch'io dissi: <<Maestro, or mi concedi

ch'i' sappia quali sono, e qual costume
  le fa di trapassar parer si` pronte,
  com'io discerno per lo fioco lume>>.

Ed elli a me: <<Le cose ti fier conte
  quando noi fermerem li nostri passi
  su la trista riviera d'Acheronte>>.

Allor con li occhi vergognosi e bassi,
  temendo no 'l mio dir li fosse grave,
  infino al fiume del parlar mi trassi.

Ed ecco verso noi venir per nave
  un vecchio, bianco per antico pelo,
  gridando: <<Guai a voi, anime prave!

Non isperate mai veder lo cielo:
  i' vegno per menarvi a l'altra riva
  ne le tenebre etterne, in caldo e 'n gelo.

E tu che se' costi`, anima viva,
  partiti da cotesti che son morti>>.
  Ma poi che vide ch'io non mi partiva,

disse: <<Per altra via, per altri porti
  verrai a piaggia, non qui, per passare:
  piu` lieve legno convien che ti porti>>.

E 'l duca lui: <<Caron, non ti crucciare:
  vuolsi cosi` cola` dove si puote
  cio` che si vuole, e piu` non dimandare>>.

Quinci fuor quete le lanose gote
  al nocchier de la livida palude,
  che 'ntorno a li occhi avea di fiamme rote.

Ma quell'anime, ch'eran lasse e nude,
  cangiar colore e dibattero i denti,
  ratto che 'nteser le parole crude.

Bestemmiavano Dio e lor parenti,
  l'umana spezie e 'l loco e 'l tempo e 'l seme
  di lor semenza e di lor nascimenti.

Poi si ritrasser tutte quante insieme,
  forte piangendo, a la riva malvagia
  ch'attende ciascun uom che Dio non teme.

Caron dimonio, con occhi di bragia,
  loro accennando, tutte le raccoglie;
  batte col remo qualunque s'adagia.

Come d'autunno si levan le foglie
  l'una appresso de l'altra, fin che 'l ramo
  vede a la terra tutte le sue spoglie,

similemente il mal seme d'Adamo
  gittansi di quel lito ad una ad una,
  per cenni come augel per suo richiamo.

Cosi` sen vanno su per l'onda bruna,
  e avanti che sien di la` discese,
  anche di qua nuova schiera s'auna.

<<Figliuol mio>>, disse 'l maestro cortese,
  <<quelli che muoion ne l'ira di Dio
  tutti convegnon qui d'ogne paese:

e pronti sono a trapassar lo rio,
  che' la divina giustizia li sprona,
  si` che la tema si volve in disio.

Quinci non passa mai anima buona;
  e pero`, se Caron di te si lagna,
  ben puoi sapere omai che 'l suo dir suona>>.

Finito questo, la buia campagna
  tremo` si` forte, che de lo spavento
  la mente di sudore ancor mi bagna.

La terra lagrimosa diede vento,
  che baleno` una luce vermiglia
  la qual mi vinse ciascun sentimento;

e caddi come l'uom cui sonno piglia.