Na hora em que as névoas se estendem nos
ares,
Que choram nos mares as ondas azuis,
E a lua cercada de pálida chama
Nas selvas derrama seu pranto de luz;
Eu vi... Maravilha! Prodígio inefável!
Um vulto adorável, primor dos primores,
Sorrindo às estrelas, no céu resvalando,
Nas vagas boiando de tênues vapores!
Nos membros divinos, mais alvos que a
neve,
Que os astros, de leve, clareiam formosos,
Nas tranças douradas, nos lábios risonhos
Os gênios e os sonhos brincavam medrosos!
Princesa das névoas! Milagre das sombras!
Das róseas alfombras, dos paços sidéreos.
Acaso rolaste, dos anjos nos braços,
Dos vastos espaços aos mantos etéreos?
Os prantos do inverno congelam-te a
fronte,
Os combros do monte se cobrem de brumas,
E queda repousas num mar de neblina
Qual pérola fina num leito de espumas!
Nas nuas espáduas, dos astros algentes,
O sopro não sentes raivoso passar?
Não vês que se esvaem miragens tão belas?
A luz das estrelas não vês se apagar?
Ai! vem que nas nuvens te mata o desejo
De um férvido beijo gozares em vão!
Os astros sem alma se cansam de olhar-te,
Nem podem amar-te, celeste visão!
E as auras passavam e as névoas tremiam,
E os gênios corriam no espaço a cantar,
Mas ela dormia, gentil, peregrina
Qual pálida ondina nas águas do mar!
Estátua sublime, mas triste, sem vida,
Sem voz envolvida no hibérneo sudário,
Verás, se me ouvires, trocado por flores,
Por palmas de amores teu véu mortuário!
Ah! vem, minh'alma! Teus loiros cabelos!
Teus braços tão belos, teus seios tão
lindos,
Eu quero aquecê-los no peito incendido...
Contar-te ao ouvido meus sonhos infindos!
Assim eu falava, nos amplos desertos,
Seguindo os incertos lampejos da luz,
Na hora em que as névoas se estendem nos
ares
E choram nos mares as ondas azuis.
As brisas d'aurora ligeiras corriam,
As flores sorriam nas verdes campinas,
Ergueram-se as aves do vento à bafagem,
E a pálida imagem desfez-se em neblinas!