Thursday, 4 April 2024

Thursday's Serial: "Os Exercícios Espirituais" by Saint Ignatius of Loyola (translated into Portuguese) - III

 

SEGUNDA SEMANA

PARÁBOLA DE INTRODUÇÃO AO SEGUIMENTO DE CRISTO

91 O Chamamento do Rei Temporal ajuda a contemplar a vida do Rei Eterno.

Oração preparatória. Seja a costumada [46].

Primeiro preâmbulo. É a composição, vendo o lugar. Será aqui ver, com a vista imaginativa, sinagogas, vilas e aldeias por onde Cristo nosso Senhor pregava.

Segundo preâmbulo. Pedir a graça que quero. Será aqui pedir graça a nosso Senhor para que não seja surdo ao seu chamamento, mas pronto e diligente em cumprir sua santíssima vontade.

92 Primeiro ponto. Pôr diante de mim um rei humano, eleito pela mão de Deus nosso Senhor, a quem prestam reverência e obedecem todos os príncipes e todos os homens cristãos.

93 Segundo ponto. Reparar como este rei fala a todos os seus, dizendo: Minha vontade é conquistar toda a terra de infiéis; portanto, quem quiser vir comigo, há de contentar-se com comer como eu, e assim com beber e vestir, etc.; do mesmo modo há de trabalhar comigo, durante o dia, e vigiar, durante a noite, etc., para que, assim, depois tenha parte comigo na vitória, como a teve nos trabalhos.

94 Terceiro ponto. Considerar o que devem responder os bons súbditos a rei tão liberal e tão humano; e, por conseguinte, se algum não aceitasse a petição de tal rei, quão digno seria de ser vituperado por todo o mundo e tido por perverso cavaleiro.

 

Segunda Parte

95 Consiste em aplicar o exemplo precedente do rei temporal a Cristo nosso Senhor, conforme aos três pontos expostos.

Primeiro ponto. Se consideramos tal apelo do rei temporal a seus súbditos, quanto é coisa mais digna de consideração ver a Cristo nosso Senhor, rei eterno, e diante dele todo o mundo universal, ao qual e a cada homem, em particular, chama e diz: Minha vontade é conquistar todo o mundo e todos os inimigos, e assim entrar na glória de meu Pai; portanto, quem quiser vir comigo, há de trabalhar comigo, para que seguindo-me na pena, me siga também na glória.

96 Segundo ponto. Considerar que todos os que tiverem juízo e razão oferecerão todas as suas pessoas ao trabalho.

97 Terceiro ponto. Os que mais se quiserem afeiçoar e assinalar em todo o serviço de seu rei eterno e senhor universal, não somente oferecerão suas pessoas ao trabalho, mas ainda, agindo contra a sua própria sensualidade e contra o seu amor carnal e mundano, farão oblações de maior estima e valor, dizendo:

98 Eterno Senhor de todas as coisas, eu faço a minha oblação, com vosso favor e ajuda, diante da vossa infinita bondade, e diante da vossa Mãe gloriosa e de todos os santos e santas da corte celestial, que eu quero e desejo e é minha determinação deliberada, contanto que seja vosso maior serviço e louvor, imitar-vos em passar todas as injúrias e todo o desprezo e toda a pobreza, assim atual como espiritual, se Vossa Santíssima Majestade me quiser escolher e receber em tal vida e estado.

99 Primeira nota. Este exercício se fará duas vezes ao dia, a saber, pela manhã ao levantar e uma hora antes de almoçar ou jantar.

100 Segunda nota. Para a segunda semana, e também daqui por diante, muito aproveita ler, por breves momentos, os livros da Imitação de Cristo ou dos Evangelhos e de vidas de santos.

 

CONTEMPLAÇÃO DA VIDA FAMILIAR DE JESUS

Primeiro Dia

A PRIMEIRA CONTEMPLAÇÃO É DA ENCARNAÇÃO.

101 Consta da oração preparatória, três preâmbulos e três pontos e um colóquio Oração preparatória, a costumada [46].

102 Primeiro preâmbulo. Recordar a história do assunto que tenho de contemplar, que é aqui como as três pessoas divinas observavam toda a planície ou redondeza de todo o mundo, cheia de homens, e como, vendo que todos desciam ao inferno, se determina, na sua eternidade, que a segunda pessoa se faça homem, para salvar o gênero humano. E, assim, chegada a plenitude dos tempos, é enviado o anjo S. Gabriel a nossa Senhora [262].

103 Segundo preâmbulo. Composição, vendo o lugar. Aqui será ver a grande extensão e redondeza do mundo, no qual estão tantas e tão diversas gentes. Assim mesmo, depois, particularmente, a casa e aposentos de nossa Senhora, na cidade de Nazaré, na província de Galiléia.

104 Terceiro preâmbulo. Pedir o que quero; será aqui pedir conhecimento interno do Senhor que, por mim, se fez homem, para que mais o ame e o siga.

105 Nota. Convém aqui notar que esta mesma oração preparatória, sem a mudar, como está dito no princípio [46; 49], assim como os mesmos três preâmbulos se hão de fazer nesta semana e nas outras seguintes, mudando nestes a forma segundo a matéria proposta.

106 Primeiro ponto. Ver as pessoas, umas e outras. E, primeiro, as da face da terra, em tanta diversidade, assim em trajes como em gestos: uns brancos e outros negros, uns em paz e outros em guerra, uns chorando e outros rindo, uns sãos e outros enfermos, uns nascendo e outros morrendo, etc; segundo, ver e considerar as três pessoas divinas, como que no seu assento real ou trono da sua divina majestade, como observam toda a face e redondeza da terra, e todas as gentes em tanta cegueira, e como morrem e descem ao inferno; terceiro, ver nossa Senhora e o anjo que a saúda. E refletir para tirar proveito de tal vista.

107 Segundo ponto. Ouvir o que dizem as pessoas sobre a face da terra, a saber, como falam umas com as outras, como juram e blasfemam, etc. Assim mesmo, o que dizem as pessoas divinas, a saber: "Façamos a redenção do gênero humano, etc." E, depois, as palavras do anjo e de nossa Senhora. E refletir, depois, para tirar proveito de suas palavras.

108 Terceiro ponto. Depois, observar o que fazem as pessoas sobre a face da terra, como ferir, matar, ir para o inferno, etc. Assim mesmo, o que fazem as pessoas divinas, a saber, realizar a santíssima Encarnação, etc. E, assim mesmo, o que fazem o anjo e nossa Senhora, a saber, o anjo cumprindo o seu ofício de legado, e nossa Senhora humilhando-se e dando graças à divina Majestade. E, refletir, depois, para tirar algum proveito de cada uma destas coisas.

109 Colóquio. Pensando o que devo dizer às três Pessoas divinas ou ao Verbo eterno encarnado, ou à Mãe e Senhora nossa, pedindo, conforme em si sentir, para mais seguir e imitar a nosso Senhor, assim recém-encarnado, dizendo um Pai nosso.

 

A SEGUNDA CONTEMPLAÇÃO É DO NASCIMENTO

110 Oração preparatória. A habitual [46].

111 Primeiro preâmbulo. A história; e será aqui como desde Nazaré saíram nossa Senhora, grávida quase de nove meses, como se pode piamente meditar, assentada numa jumenta, e José e uma serva, levando um boi, para ir a Belém pagar o tributo que César impôs em todas aquelas terras [264].

112 Segundo preâmbulo. Composição vendo o lugar; será aqui ver, com a vista imaginativa, o caminho desde Nazaré a Belém, considerando o comprimento, a largura, e se tal caminho era plano ou se por vales ou encostas. Assim mesmo, observar o lugar ou gruta do nascimento, se era grande, pequeno, baixo, alto, e como estava preparado.

113 Terceiro preâmbulo. O mesmo e da mesma forma que na contemplação precedente.

114 Primeiro ponto. Ver as pessoas, a saber, ver nossa Senhora e José e a serva, e o Menino Jesus depois de já ter nascido, fazendo-me eu um pobre e escravo indigno que os observa, os contempla e os serve em suas necessidades, como se presente me achasse, com todo o acatamento e reverência possível; e, depois, refletir em mim mesmo para tirar algum proveito.

115 Segundo ponto. observar, advertir e contemplar o que falam; e, refletindo em mim mesmo, tirar algum proveito.

116 Terceiro ponto. observar e considerar o que fazem, como é caminhar e trabalhar, para que o Senhor venha a nascer em suma pobreza e, ao cabo de tantos trabalhos de fome, de sede, de calor e de frio, de injúrias e afrontas, para morrer na cruz; e tudo isto por mim; depois, refletindo, tirar algum proveito espiritual.

117 Colóquio. Como na contemplação precedente, e um Pai nosso.

 

A TERCEIRA CONTEMPLAÇÃO  SERÁ A REPETIÇÃO  DO PRIMEIRO E DO SEGUNDO EXERCÍCIO

118 Depois da oração preparatória e dos três preâmbulos, se fará a repetição do primeiro e segundo exercício, notando sempre algumas passagens mais importantes, onde a pessoa tenha sentido algum conhecimento, consolação ou desolação; fazendo também um colóquio, ao fim, e rezando um Pai nosso [62].

119 Nota. Nesta repetição e em todas as seguintes, se observará a mesma ordem de proceder que nas repetições da primeira semana, mudando a matéria e conservando-se a forma.

 

QUARTA CONTEMPLAÇÃO

120 Será outra repetição da Primeira e da Segunda da mesma maneira que se fez na repetição anterior

 

QUINTA CONTEMPLAÇÃO

121 Será aplicar os cinco sentidos sobre a primeira e segunda contemplação.

Depois da oração preparatória e dos três preâmbulos, aproveita passar os cinco sentidos da imaginação pela primeira e segunda contemplação, da maneira seguinte:

122 Primeiro ponto. Ver as pessoas, com a vista imaginativa, meditando e contemplando em particular as suas circunstâncias, e tirando algum proveito desta vista.

123 Segundo ponto. Ouvir, com o ouvido, o que falam ou podem falar; e, refletindo em si mesmo, tirar disso algum proveito.

124 Terceiro ponto. Aspirar e saborear, com o olfato e com o gosto, a infinita suavidade e doçura da divindade, da alma e das suas virtudes e de tudo, conforme a pessoa que se contempla. Refletir em si mesmo e tirar proveito disso.

125 Quarto ponto. Tocar, com o tacto, por exemplo, abraçar e beijar os lugares que essas pessoas pisam e onde se sentam; sempre procurando tirar proveito disso.

126 Colóquio. Como na primeira e segunda contemplação [109, 117], e com um Pai nosso.

127 Primeira nota.É de advertir, para toda esta semana e as outras seguintes, que só tenho de ler o mistério da contemplação que imediatamente tenho de fazer, de maneira que, por então, não leia nenhum mistério que naquele dia ou naquela hora não haja de fazer, para que a consideração de um mistério não estorve à consideração do outro [11].

128 Segunda nota. Escalonamento da oração. O primeiro exercício da Encarnação se fará à meia noite; o segundo, ao amanhecer; o terceiro, à hora da missa; o quarto, à hora de vésperas, e o quinto, antes da hora de jantar, estando, por espaço de uma hora, em cada um dos cinco exercícios [12, 72, 133, 148, 159]; e a mesma ordem se terá em tudo o que vai seguir.

129 Terceira nota. É de advertir que, se a pessoa que faz os Exercícios é idosa ou débil, ou se, ainda que forte, ficou de alguma maneira debilitada da primeira semana, é melhor que, nesta Segunda semana, ao menos algumas vezes, não se levantando à meia-noite, faça, pela manhã, uma contemplação, e outra à hora da missa, e outra antes de almoçar, e, sobre elas, uma repetição à hora de vésperas, e depois a aplicação de sentidos antes de jantar.

130 Quarta nota. Nesta segunda semana, em todas as dez adições que se expuseram na primeira semana, se hão de mudar a segunda, a sexta, a sétima e a décima [74, 78, 79, 82].

Na segunda será: logo ao despertar, pôr diante de mim a contemplação que tenho de fazer, desejando conhecer mais o Verbo eterno encarnado para mais o servir e seguir.

E a sexta será: trazer à memória, freqüentemente, a vida e mistérios de Cristo nosso Senhor, começando da sua Encarnação até ao lugar ou mistério que vou contemplando.

E a sétima será que a pessoa que se exercita tanto se deve guardar de ter obscuridade ou claridade, usar de boas temperaturas ou diversas, quanto sentir que isso lhe pode aproveitar e ajudar para achar o que deseja.

E na décima adição, o que se exercita deve haver-se conforme os mistérios que contempla; porque alguns pedem penitência e outros não. De maneira que se façam todas as dez adições, com muito cuidado.

131 Quinta nota. Em todos os exercícios, exceto no da meia noite e no da manhã, se tomará o equivalente da segunda adição [74], da maneira que se segue: logo que me recorde que é hora do exercício que tenho de fazer, antes de ir a ele, porei diante mim aonde vou e diante de quem, resumindo um pouco o exercício que tenho de fazer e, depois, fazendo a terceira adição, entrarei no exercício.

 

Segundo Dia.

132.- Tomar por primeira e segunda contemplação a apresentação no templo [268], e a fuga como em desterro para o Egito [269]; e sobre estas duas contemplações se farão duas repetições e a aplicação dos cinco sentidos, da mesma maneira que se fez no dia precedente.

133 Nota. Algumas vezes aproveita, ainda que o que se exercita esteja robusto e disposto, mudar, desde este segundo dia até ao quarto inclusive, para melhor achar o que deseja, tomando só uma contemplação, ao amanhecer, e outra, à hora da missa, e repetir sobre elas, à hora da vésperas, e aplicar os sentidos, antes de jantar.

 

Terceiro Dia

134 Como o menino Jesus era obediente a seus pais em Nazaré [271], e depois como o acharam no templo [272]; e assim, em seguida, fazer as duas repetições e a aplicação dos cinco sentidos.

 

INTRODUÇÃO AO DISCERNIMENTO DE APELOS

135 Preâmbulo para considerar estados. Considerado já o exemplo que Cristo nosso Senhor nos deu para o primeiro estado, que consiste na guarda dos mandamentos, vivendo ele em obediência a seus pais; assim como também para o segundo, que é de perfeição evangélica, quando ficou no templo, deixando a seu pai adotivo e a sua mãe natural, para se entregar a puro serviço de seu Pai eternal, juntamente com a contemplação da sua vida, começaremos agora a investigar e a pedir em que vida ou estado de nós se quer servir Sua Divina Majestade. E assim, para alguma introdução a isso, no primeiro exercício seguinte, veremos a intenção de Cristo nosso Senhor e, em contrário, a do inimigo da natureza humana; e como nos devemos dispor, para chegar à perfeição em qualquer estado ou vida que Deus nosso Senhor nos der a escolher.

Quarto dia

136 Meditação da parábola de duas bandeiras, uma, a de Cristo, sumo capitão e Senhor nosso, outra, a de Lúcifer, mortal inimigo da nossa natureza humana.

Oração preparatória. A habitual [46].

137 Primeiro preâmbulo é a história. Será aqui como Cristo chama e quer a todos debaixo de sua bandeira, e Lúcifer, ao contrário, debaixo da sua.

138 Segundo preâmbulo, composição, vendo o lugar. Será aqui ver um grande campo de toda aquela região de Jerusalém, onde o sumo capitão general dos bons é Cristo nosso Senhor; outro campo na região de Babilônia, onde o caudilho dos inimigos é Lúcifer.

139 Terceiro preâmbulo. Pedir o que quero; e será aqui pedir conhecimento dos enganos do mau caudilho, e ajuda para deles me guardar; e conhecimento da vida verdadeira que mostra o sumo e verdadeiro capitão, e graça para o imitar.

140 Primeiro ponto. Imaginar assim como se assentasse o caudilho de todos os inimigos naquele grande campo de Babilônia, como que numa grande cátedra de fogo e fumo, em figura horrível e espantosa.

141 Segundo ponto. Considerar como faz chamamento de inumeráveis demônios e como os espalha, a uns numa cidade e a outros noutra, e assim por todo o mundo, não deixando províncias, lugares, estados nem pessoas algumas em particular.

142 Terceiro ponto. Considerar o sermão que lhes faz e como os admoesta a lançar redes e cadeias; que primeiro hão de tentar com cobiça de riquezas, como costuma, a maior parte das vezes, para que mais facilmente venham a vã honra do mundo e, depois, a grande soberba. De maneira que o primeiro escalão seja de riquezas, o segundo de honra, o terceiro de soberba, e destes três escalões induz a todos os outros vícios.

143 Assim, pelo contrário, se há de imaginar do sumo e verdadeiro capitão, que é Cristo nosso Senhor.

144 Primeiro ponto. Considerar como Cristo nosso Senhor se apresenta num grande campo daquela região de Jerusalém, em lugar humilde, formoso e gracioso.

145 Segundo ponto. Considerar como o Senhor de todo o mundo escolhe tantas pessoas, apóstolos, discípulos, etc., e os envia por todo o mundo a espalhar a sua sagrada doutrina por todos os estados e condições de pessoas.

146 Terceiro ponto. Considerar o sermão que Cristo nosso Senhor faz a todos os seus servos e amigos, que envia a esta expedição, encomendando-lhes que queiram ajudar e trazer a todos, primeiro a suma pobreza espiritual, e, se sua divina majestade for servida e os quiser escolher, não menos à pobreza atual; segundo, ao desejo de opróbrios e desprezos, porque destas duas coisas se segue a humildade; de maneira que sejam três os escalões: o primeiro, pobreza contra riqueza; o segundo, opróbrio ou desprezo contra a honra mundana; o terceiro, humildade contra a soberba; e destes três escalões induzam a todas as outras virtudes.

147 Colóquio. A Nossa Senhora, para que me alcance graça de seu Filho e Senhor, para que eu seja recebido debaixo de sua bandeira, e primeiro em suma pobreza espiritual, e, se sua divina majestade for servido e me quiser escolher e receber, não menos na pobreza atual; segundo, em passar opróbrios e injúrias, para mais nelas o imitar, contanto que as possa passar sem pecado de nenhuma pessoa nem desprazer de sua divina majestade; e, depois disto, uma ave-maria.  Segundo colóquio. Pedir o mesmo ao Filho, para que mo alcance do Pai; e, depois disto, dizer Alma de Cristo. Terceiro colóquio. Pedir o mesmo ao Pai, para que ele mo conceda; e dizer um Pai nosso.

148 Nota. Este Exercício se fará à meia noite, e depois, outra vez, pela manhã; e, deste mesmo, se farão duas repetições, à hora da missa e à hora de vésperas; acabando sempre com os três colóquios, a Nossa Senhora, ao Filho e ao Pai. E o dos Binários, que se segue, à hora antes de jantar.

149 No mesmo Quarto Dia, faça-se a meditação da parábola de três binários de homens, para abraçar o melhor. Oração preparatória, a habitual [46].

150 Primeiro preâmbulo. É é a história de três binários de homens: cada um deles adquiriu dez mil ducados, não pura ou devidamente por amor de Deus, e querem todos salvar-se e achar em paz a Deus nosso Senhor, tirando de si o peso e impedimento que têm, para isso, na afeição à coisa adquirida.

151 Segundo preâmbulo. Composição, vendo o lugar: será aqui ver-me a mim mesmo, como estou diante de Deus nosso Senhor e de todos os seus santos, para desejar e conhecer o que seja mais grato à sua divina bondade.

152 Terceiro preâmbulo. Pedir o que quero. Aqui será pedir graça para escolher o que for mais para glória de sua divina majestade e salvação de minha alma.

153 Primeiro binário. Tirar o afeto que tem à coisa adquirida, para achar em paz a Deus nosso Senhor e saber-se salvar, e não põe os meios até à hora da morte.

154 Segundo binário. Tirar o afeto, mas de tal modo o quer tirar que fique com a coisa adquirida, de maneira que venha Deus ali aonde ele quer, e não se determina a deixála para ir a Deus, ainda que este fosse o melhor estado para ele.

155 O Terceiro binário. Tirar o afeto, mas de tal modo o quer tirar que também não tem afeição a ter a coisa adquirida ou não a ter, mas somente deseja querê-la ou não a querer, conforme Deus nosso Senhor lhe puser na vontade, e a si lhe parecer melhor para serviço e louvor de sua divina majestade; e, entretanto, quer fazer de conta que tudo deixa afetivamente, esforçando-se por não querer aquilo nem nenhuma outra coisa, se não o mover somente o serviço de Deus nosso Senhor; de maneira que o desejo de melhor poder servir a Deus nosso Senhor o mova a tomar a coisa ou a deixá-la.

156 Fazer os mesmos três colóquios que se fizeram na contemplação precedente das Duas Bandeiras [147].

157 Nota. É de notar que, quando nós sentimos afeto ou repugnância contra a pobreza atual, quando não somos indiferentes a pobreza ou riqueza, muito aproveita, para extinguir o tal afeto desordenado, pedir nos colóquios (ainda que seja contra a carne) que o Senhor o escolha para a pobreza atual; e que ele assim o quer, pede e suplica, contanto que seja para serviço e louvor da sua divina bondade [16].

 

CONTEMPLAÇÃO DA VIDA PÚBLICA DE JESUS

Quinto Dia

158 Contemplação sobre a partida de cristo nosso senhor desde Nazaré ao rio Jordão, e como foi batizado [273].

159 Primeira nota. Esta contemplação se fará uma vez à meia-noite, e outra vez pela manhã; e sobre ela duas repetições, à hora de Missa e de Vésperas; e, antes de jantar, aplicar sobre ela os cinco sentidos; antes de cada um destes cinco exercícios, antepor a habitual oração preparatória [101] e os três preâmbulos [102-104], conforme sobre tudo isto está declarado na contemplação da Encarnação e do Nascimento, e acabar com os três colóquios dos Três Binários [156,147], ou segundo a nota que vem depois dos Binários [157].

160 Segunda nota. O exame particular, depois do almoço e depois do jantar, se fará sobre as faltas e negligências tidas nos exercícios e adições deste dia; e assim também nos dias que se seguem.

 

Sexto dia

161 Contemplação como Cristo Nosso Senhor foi desde o rio jordão ao deserto, inclusive [274], seguindo em tudo a mesma forma do quinto dia.

 

Sétimo Dia

Como Santo André e outros seguiram a Cristo Nosso Senhor [275].

 

Oitavo dia

O sermão da montanha, que é sobre as oito bem-aventuranças [278].

 

Nono dia

Como Cristo nosso Senhor apareceu aos seus discípulos sobre as ondas do mar [280].

 

Décimo Dia

Como o Senhor pregava no templo [288].

 

Décimo Primeiro Dia

A ressurreição de Lázaro [285].

 

Décimo Segundo Dia

O dia de Ramos [287].

162 Primeira nota. Nas contemplações desta segunda semana, conforme cada um quiser dispor do tempo ou conforme lhe aproveitar, pode prolongar ou abreviar. Se prolongar, tome os mistérios da Visitação de nossa Senhora a santa Isabel, os Pastores, a circuncisão do Menino Jesus, e os três Reis, e também outros. E, se abreviar, tirar mesmo dos que estão propostos. Porque isto é só dar uma introdução e modo para, depois, melhor e mais completamente contemplar.

 

ELEIÇÃO DE OPÇÕES A TOMAR

A. Momento de a iniciar

163 Segunda nota. A matéria das eleições começará, desde a contemplação de Nazaré ao Jordão, inclusive, que é o quinto dia, conforme se declara adiante (169-189).

B. Princípio e fundamento de humildade

164 Terceira nota. Antes de entrar nas eleições, para a pessoa se afeiçoar à verdadeira doutrina de Cristo nosso Senhor, aproveita muito considerar e advertir nas seguintes:

Três maneiras de Humildade, considerando sobre elas, aos poucos, durante todo o dia, e também fazendo os colóquios, como adiante se dirá [168].

165 Primeira. Necessária para a salvação eterna, a saber: que assim me abata e assim me humilhe, quanto em mim seja possível, para que em tudo obedeça à lei de Deus nosso Senhor, de tal sorte que, nem que me fizessem senhor de todas as coisas criadas neste mundo, nem pela própria vida temporal, eu nem esteja a deliberar se hei de infringir um mandamento, quer divino quer humano, que me obrigue a pecado mortal.

166 Segunda. É uma humildade mais perfeita que a primeira, a saber: se eu me acho em tal ponto que não quero nem me apego mais a ter riqueza que pobreza, a querer honra que desonra, a desejar vida longa que curta, sendo igual serviço de Deus nosso Senhor e salvação da minha alma; e, a tal ponto que, nem por tudo o criado, nem que me tirassem a vida, eu não esteja a deliberar se hei de cometer um pecado venial.

167 Terceira. É uma humildade perfeita, a saber: quando, incluindo a primeira e a segunda, sendo igual louvor e glória da divina majestade, para imitar e parecer-me mais atualmente com Cristo nosso Senhor, eu quero e escolho antes pobreza com Cristo pobre que riqueza; desprezos com Cristo cheio deles que honras; e desejo mais ser tido por insensato e louco por Cristo que primeiro foi tido por tal, que por sábio ou prudente neste mundo.

168 Nota. Assim, para quem deseja alcançar esta terceira humildade, muito aproveita fazer os três colóquios dos Binários, já mencionados [156; 147], pedindo que nosso Senhor o queira escolher para esta terceira maior e melhor humildade, para mais o imitar e servir, se for igual ou maior serviço e louvor para sua divina majestade.

C. Preâmbulos de abordagem

169 – Preâmbulo para fazer eleição. Em toda a boa eleição, quanto é da nossa parte, o olhar da nossa intenção deve ser simples, tendo somente em vista o fim para que sou criado, a saber, para louvor de Deus nosso Senhor e salvação da minha alma; e assim, qualquer coisa que eu eleger deve ser para que me ajude para o fim para que sou criado, não subordinando nem fazendo vir o fim ao meio, mas o meio ao fim. Assim, acontece que muitos elegem primeiro casar-se, o que é meio, e em segundo lugar, servir a Deus nosso Senhor no casamento, quando servir a Deus é fim. Assim também, há outros que, primeiro querem ter benefícios e, depois, servir a Deus neles [cf. 16; 157]. De maneira que estes não vão direitos a Deus, mas querem que Deus venha direito às suas afeições desordenadas e, por conseguinte, fazem do fim meio e do meio fim; de sorte que o que haviam de pôr primeiro, põem por último. Porque, primeiro, havemos de propor como objetivo querer servir a Deus, que é o fim [179] e, em segundo lugar, tomar um benefício ou casar-me, se mais me convém, que é o meio para o fim. Assim, nenhuma coisa me deve mover a tomar os tais meios ou a privar-me deles, senão somente o serviço e louvor de Deus nosso Senhor e a salvação eterna de minha alma.

Preâmbulo para tomar conhecimento de que coisas se deve fazer eleição e compreende quatro pontos e uma nota.

170 Primeiro ponto. É necessário que todas as coisas das quais queremos fazer eleição sejam indiferentes ou boas em si mesmas e que militem dentro da Santa Mãe Igreja hierárquica, e não sejam más nem contrárias a ela.

171 Segundo ponto. Há umas coisas que caem sob o âmbito de eleição imutável, como são o sacerdócio, o matrimônio, etc; há outras que caem sob o âmbito de eleição mudável, como o tomar benefícios ou deixá-los, o tomar bens temporais ou renunciar-lhes.

172 Terceiro ponto. Na eleição imutável, uma vez feita a eleição, não há mais que eleger, porque não se pode desatar, como é o matrimônio, o sacerdócio, etc. Só é de atender a que, se não se fez a eleição devida e ordenadamente, sem afeições desordenadas, arrependendose, procure fazer boa vida na sua eleição; essa eleição não parece que seja vocação divina, por ser eleição desordenada e oblíqua. Com efeito, muitos nisto erram, fazendo de oblíqua ou de má eleição vocação divina; porque toda a vocação divina é sempre pura e límpida, sem mistura vinda da carne nem de outra afeição alguma desordenada.

173 Quarto ponto. Se alguém fez, devida e ordenadamente, eleição de coisas que estão no âmbito de eleição mudável, e não condescendeu com a carne nem com o mundo, não há motivo para, de novo, fazer eleição, mas sim se aperfeiçoar naquela que fez, quanto puder.

174 Nota. É de advertir que, se essa eleição mudável não se fez sincera e bem ordenada, então, quem tiver desejo que de si saiam frutos notáveis e muito agradáveis a Deus nosso Senhor, aproveita em fazer a eleição devidamente.

1.- Eleição de estado de vida

"Tempos" ou estados de alma

175 – Três tempos para fazer sã e boa eleição em cada um deles o primeiro tempo é quando Deus nosso Senhor move e atrai a vontade de tal modo que, sem duvidar nem poder duvidar, a alma devota segue o que lhe é mostrado. Assim fizeram, por exemplo, S. Paulo e S. Mateus, ao seguirem a Cristo nosso Senhor.

176 – O segundo tempo é quando se recebe suficiente clareza e conhecimento por experiência de consolações e desolações e por experiência de discernimento de vários espíritos.

177 – O terceiro tempo é tranqüilo, considerando primeiro para que nasceu o homem, a saber, para louvar a Deus nosso Senhor e salvar a sua alma; e, desejando isto, escolhe, como meio, uma vida ou estado dos que a Igreja aprova, a fim de ser ajudado no serviço de seu Senhor e salvação de sua alma. Disse tempo tranqüilo, quando a alma não é agitada por vários espíritos e usa de suas potências naturais, livres e tranqüilamente.

178 – Se no primeiro ou segundo tempo não se faz eleição, seguem-se dois modos para a fazer neste

Terceiro Tempo [177].

O Primeiro modo para fazer sã e boa eleição compreende seis pontos:

O primeiro ponto é propor diante de mim a coisa sobre a qual quero fazer eleição, como, por exemplo, um ofício ou benefício a tomar ou deixar, ou qualquer outra coisa compreendida no âmbito de eleição mudável.

179 – Segundo ponto. É preciso ter como objetivo o fim para que sou criado, que é para louvar a Deus nosso Senhor e salvar a minha alma; e, além disso, achar-me indiferente [23], sem afeição alguma desordenada, de maneira que não esteja mais inclinado nem afeiçoado a tomar a coisa proposta do que a deixá-la, nem mais a deixá-la que a Tomá-la; mas que esteja no meio, como o fiel da balança, a fim de seguir aquilo que julgar ser para mais glória e louvor de Deus nosso Senhor e salvação de minha alma [169].

180 – Terceiro ponto. Pedir a Deus nosso Senhor queira mover a minha vontade e pôr em minha alma o que devo fazer, quanto à coisa proposta, que mais seja para seu louvor e glória; discorrendo bem e fielmente, com o meu entendimento, e escolhendo conforme a sua santíssima e beneplácita vontade.

181 – Quarto ponto. Considerar raciocinando, quantas vantagens ou proveitos para mim se seguem, com ter o cargo ou benefício proposto, só para louvor de Deus nosso Senhor e salvação de minha alma; e, pelo contrário, considerar também os inconvenientes e perigos que há em tê-lo. Fazer o mesmo na segunda parte, a saber, ver as vantagens e proveitos em o não ter; e também, os inconvenientes e perigos em o não ter.

182 - Quinto ponto. Depois de assim ter discorrido e refletido, sobre todos os aspectos do assunto proposto, ver para onde a razão mais se inclina; e, assim, conforme a maior moção racional, e não conforme moção alguma da sensibilidade, se deve fazer a deliberação sobre o assunto proposto.

183 – Sexto ponto. Feita a eleição ou deliberação, deve a pessoa que a fez, ir, com muita diligência, à oração diante de Deus nosso Senhor, e oferecer-lhe essa eleição, para que sua divina majestade a queira receber e confirmar, se forem para seu maior serviço e louvor.

184 – O Segundo modo para fazer sã e boa eleição compreende quatro regras e uma nota [338-341].

A Primeira regra é que aquele amor que me move e me faz eleger tal coisa desça do alto, do amor de Deus; de forma que quem elege, sinta primeiro em si, que o amor maior ou menor que tem à coisa que elege é unicamente por seu Criador e Senhor.

185 – A Segunda regra é imaginar um homem a quem nunca tenha visto nem conhecido, e desejando-lhe eu toda a sua perfeição, considerar o que eu lhe diria que fizesse e elegesse para maior glória de Deus nosso Senhor e maior perfeição de sua alma; e, fazendo eu da mesma maneira, guardarei a regra que para o outro proponho.

186 – A Terceira regra é considerar, como se estivesse em artigo de morte, a forma e a norma de proceder que então quereria ter tido, no modo de fazer a presente eleição; e, regulando-me por ela, em tudo, faça a minha determinação.

187 – A Quarta regra é, atendendo e considerando como me acharei no dia do juízo, pensar como então quereria ter deliberado sobre o assunto presente; e, a regra que então quereria ter tido, tomá-la agora, para que então me ache com inteiro prazer e gozo.

188 Nota. Tomadas as regras sobreditas para minha salvação e quietude eterna, farei a minha eleição e oblação a Deus nosso Senhor, conforme ao sexto ponto do primeiro modo de fazer eleição [183].

2. Eleição de outras opções para a santidade de vida dentro do seu estado

189 Para emendar e reformar a própria vida e estado. É de advertir que, para os que estão constituídos em sacerdócio ou em matrimônio (quer abundem muito em bens temporais quer não), quando não há lugar ou muito pronta vontade para fazer eleição das coisas que caem sob eleição mudável [170-172], aproveita muito, em lugar de fazer eleição, dar forma e modo para emendar e reformar a própria vida e estado de cada um; a saber: ordenando o seu mundo, vida e estado, para glória e louvor de Deus nosso Senhor e salvação de sua alma. Para vir e chegar a este fim, deve considerar e ruminar muito, por meio dos exercícios e modos de eleger, conforme está declarado [164-188], quanta casa e família deve ter, como a deve reger e governar, como a deve ensinar, com a palavra e com o exemplo; do mesmo modo, de seus bens, quanto deve tomar para sua família e casa, e quanto para despender com os pobres e com outras obras pias [337-344], não querendo nem buscando nenhuma outra coisa senão, em tudo e por tudo, maior louvor e glória de Deus nosso Senhor. Porque pense cada um que tanto aproveitará em todas as coisas espirituais, quanto sair de seu próprio amor, querer e interesse.

Wednesday, 3 April 2024

Good Reading: "The Father and His Two Daughters" by Aesop (translated into English)

 

A Man had two daughters, the one married to a gardener, and the other to a tile-maker. After a time he went to the daughter who had married the gardener, and inquired how she was and how all things went with her. She said, "All things are prospering with me, and I have only one wish, that there may be a heavy fall of rain, in order that the plants may be well watered." Not long after, he went to the daughter who had married the tilemaker, and likewise inquired of her how she fared; she replied, "I want for nothing, and have only one wish, that the dry weather may continue, and the sun shine hot and bright, so that the bricks might be dried." He said to her, "If your sister wishes for rain, and you for dry weather, with which of the two am I to join my wishes?'