- Reconheço que não te havia entendido quando chegaste ontem.
- Por quê?
- As coisas que falaste, pareciam cacos de cristal.
- E agora?
- Caminhei com os pés nus sobre eles.
Beijaram-se
... e correu por entre eles um rio de leite suave, morno
... e calmo como as manhãs de outono, algo frias.
Eles reconheciam-se nas folhas caídas dos plátanos, sinal da brevidade do tempo que teriam juntos.
Reconheciam-se nas águas frescas do lago, o berço onde, lentamente, queriam deitar seus sonhos de útero.
Sabiás cantavam na árvore em frente à casa deles.
Ainda abraçados, sob as cobertas, sorriram um para o outro, mas quando se despediram no aeroporto, um indo para a terra das andorinhas, houve tristeza, seca de lágrimas.
Tuesday, 10 June 2014
Monday, 9 June 2014
Saturday, 7 June 2014
"Alma, Buscarte Has en Mí" by St. Therese of Avila (in Spanish)
Alma, buscarte
has en Mí,
y a Mí buscarme
has en ti.
De tal suerte
pudo amor,
alma, en mí te
retratar,
que ningún sabio
pintor
supiera con tal
primor
tal imagen
estampar.
Fuiste por amor
criada
hermosa, bella, y
así
en mis entrañas
pintada,
si te perdieres,
mi amada,
Alma, buscarte
has en Mí.
Que yo sé que te
hallarás
en mi pecho
retratada,
y tan al vivo
sacada,
que si te ves te
holgarás,
viéndote tan bien
pintada.
Y si acaso no
supieres
dónde me hallarás
a Mí,
No andes de aquí
para allí,
sino, si hallarme
quisieres,
a Mí buscarme has
en ti.
Porque tú eres mi
aposento,
eres mi casa y
morada,
y así llamo en
cualquier tiempo,
si hallo en tu
pensamiento
estar la puerta
cerrada.
Fuera de ti no
hay buscarme,
porque para
hallarme a Mí,
bastará sólo
llamarme,
que a ti iré sin
tardarme
y a Mí buscarme has en ti.
Friday, 6 June 2014
"The Ass and His Masters" by Aesop (in English)
An ass, belonging to an
herb-seller who gave him too little food and too much work made a petition to
Jupiter to be released from his present service and provided with another
master. Jupiter, after warning him that
he would repent his request, caused him to be sold to a tile-maker. Shortly afterwards, finding that he had heavier
loads to carry and harder work in the brick-field, he petitioned for another
change of master. Jupiter, telling him that
it would be the last time that he could grant his request, ordained that he be
sold to a tanner. The Ass found that he
had fallen into worse hands, and noting his master's occupation, said,
groaning: "It would have been
better for me to have been either starved by the one, or to have been
overworked by the other of my former masters, than to have been bought by my present
owner, who will even after I am dead tan my hide, and make me useful to
him."
He that finds discontentment in one place
is
not likely to find happiness in another
Thursday, 5 June 2014
"Noites Rubras" by José Thiesen (in Portuguese)
CARTA DE JAIRO ALENCAR AO PADRE PEDRO BOGUCKI DATADA DE 15 DE MAIO DE 1975.
Obs.: esta carta não faz parte dos processos policiais sobre as mortes de Cláudio Sertório ou de Mônica Oliveira do Nascimento, pois foi mantida oculta pelo pe. Bogucki junto de seus papéis pessoais, tendo sido encontrada somente após a sua morte.
Querido padre Bogucki, estou lhe escrevendo, não
sei bem porque e nem como.
Não sei como, porque o que lhe quero contar não
está claro em minha mente. É assim como a memória de outro que não eu; mas,
sim, é de mim que vou falar.
Também
não sei por que, uma vez que o lhe vou contar é tão estranho que, por certo o
senhor não me vai crer.
O sangue que mancha este papel não é meu, mas de
Mônica, minha namorada. Ainda tenho em meus olhos o sangue que corria de seu
pescoço, o pescoço antes amado e que rasguei com minhas unhas.
Mas
preciso contar isso a alguém e nos conhecemos desde sempre, não é, padre Bogucki? Foi o senhor
quem me batizou e me catequizou, muito mais que a dona Amélia, lembra?
Deixe-me agora por os
pensamentos em ordem e restabelecer a seqüência dos fatos. Tudo começou naquela
noite horrível de 18 de Abril.
O senhor se lembra do
Cláudio, meu amigo desde os tempos de menino. Naquela noite eu e ele voltávamos
duma boate. Era uma noite de serração, quente e úmida.
Tínhamos chegado na Câncio
Gomes e, derrepente, ouvimos um som de asas batendo; grandes asas batendo.
Paramos para tentar
entender aquele som unusual e, derrepente, coisa de um segundo, mesmo, Cláudio
foi puxado pra cima, sumindo no nevoeiro.
Ouvi o seu grito por um breve
momento, mas quase imediatamente, o sangue dele começou a cair sobre mim num
chuvisqueiro medonho.
Não podia entender que
fosse sangue assim, imediatamente. Só muito tempo depois realizei que era o
sangue de Cláudio que caía na calçada e sobre mim. Então Cláudio caiu ao solo,
perto de mim, com a cabeça... O senhor viu as fotos, não viu, quando a polícia
o entrevistou?
Eu estava apavorado,
queria gritar mas não conseguia; estava em choque!
Então eu também fui pego e
erguido no ar e lembro-me apenas de ver, brilhando de dentro da névoa, uns
olhos vermelhos, cheios de ódio. Eram olhos ferozes e a coisa que me tinha nos
braços emanava um hálito de coisa podre.
Eu comecei a chorar e ouvi
aquilo que me sustentava no ar dizer qualquer coisa numa língua gutural que não
entendi, na altura.
Foi então que tudo ficou
negro.
Precisei de muito tempo
para saber que estava morto.
Acordei sete dias depois,
na Gruta dos Bugres. O sol me incomodava demais e eu tentava desviar dele.
Sentia uma sede terrível,
uma fraqueza terrível e acabei por beber o sangue dum cachorro que encontrei
vagando por ali. Serviu para saciar-me e voltei à gruta onde dormi até a noite.
Me parecia que sonhava que
estava voando, mas o fato é que acordei na porta de casa. Queria entrar, mas
não pude e então apertei a campainha.
Meu pai abriu a porta.
Oh, que quer que lhe diga?
Que houveram lágrimas? Claro que houveram, mas enquanto eu estava abraçado a
meu pai, não podia desviar os olhos de sua jugular pulsando em seu pescoço, tão
próxima a mim, e eu sedento!
Por isso eu não podia
entrar naquela casa; ela não era mais minha.
Para mim, o meu pai, como
todos vocês, agora, era apenas comida.
Apesar disso estar claro
para mim, faltava-me coragem para romper os laços. Ou melhor: faltava-me
coragem para ver os laços já rompidos.
Logo os policiais que
vigiavam a casa de meus pais entraram para marcar o fato de que eu era a mais
importante peça para investigar a morte de Cláudio.
Mas a sujeira que me
vestia, minha palidez e o mau cheiro que meu corpo exalava denunciavam que eu
não tinha muitas condições de responder a qualquer questionário e afinal
consentiram que eu ficasse na casa por dois dias e deixaram alguém do lado de
fora, em vigia.
Puseram-me na cama,
deram-me a comer de qualquer coisa que já não lembro e fui pra cama, pra um
sono sem sonhos.
Acordei no meio da tarde
com meus pais abrindo a porta para conferir se estava bem. Pude ver a reação
deles ao mau cheiro que eu exalava no quarto fechado.
- O dia está lindo, meu
bem, não queres levantar-te?
- Acho que não...
- Estás doente?
- Não. Só um pouco
faminto.
- Queres que te faça um
sanduiche?
- Não! Eu só preciso
dormir um pouco mais.
Deixaram-me e voltei a
dormir até a noite chegar.
Abri a janela para receber
o frescor bom da noite e vi o policial de vigia em frente de casa.
Mudei meu corpo para uma
névoa leve e voei de minha janela até o quarto de Mônica.
Não sei pra onde vou
agora, padre Bogucki. Tenho 17 anos e o mundo é grande. Precisava de alguém que
me dissesse o que fazer, mas já não tenho isso. Não ouso chegar perto de si ou
de qualquer outro, por causa de minha fome e porque, de momento a momento sinto
um ódio por vocês, tremendo, a crescer e crescer em mim.
Como disse antes, não me
parece que sou eu, mas outro agindo em mim e não entendo isso.
Por favor, console os que
feri e reze por mim.
Wednesday, 4 June 2014
"Na Penumbra" by Raimundo Correia (in Portuguese)
Raiava, ao longe,
em fogo a lua nova,
Lembras-te?...
apenas reluzia a medo,
Na escuridão
crepuscular da alcova
O diamante que
ardia-te no dedo...
Nesse ambiente
tépido, enervante,
Os meus desejos
quentes, irritados,
Circulavam-te a
carne palpitante,
Como um bando de
lobos esfaimados...
Como que estava
sobre nós suspensa
A pomba da
volúpia; a treva densa
Do teu olhar
tinha tamanho brilho!
E os teus seios
que as roupas comprimiam,
Tanto sob elas,
túmidos, batiam,
Que estalavam-te
o flácido espartilho!
Tuesday, 3 June 2014
"Reinvenção" by Cecília Meireles (in Portuguese)
A vida só é
possível reinventada.
Anda o sol pelas
campinas
e passeia a mão
dourada
pelas águas,
pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas
piscinas
de ilusionismo...
— mais nada.
Mas a vida, a
vida, a vida,
a vida só é
possível
reinventada.
Vem a lua, vem,
retira
as algemas dos
meus braços.
Projeto-me por
espaços
cheios da tua
Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite
escura.
Não te encontro,
não te alcanço...
Só — no tempo
equilibrada,
desprendo-me do
balanço
que além do tempo
me leva.
Só — na treva,
fico: recebida e
dada.
Porque a vida, a
vida, a vida,
a vida só é
possível
reinventada.
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