NIHIL OBSTAT.
Fr. Benigno Randebrock,
O.F.M. Cens. Dioc.
IMPRIMATUR.
Bahia, 11 de Março de 1913.
Mons. Castro,
Vigário Geral
PRÓLOGO
Tanto pela importância da matéria, de certo bem pouco
conhecida da maioria dos cristãos, como pela abundância de doutrina e o
interesse com que ela é tratada no que diz respeito à sua utilidade prática,
bem pode dizerse que este livrinho encerra em suas poucas páginas o valor de
muitos volumes.
O grande meio de salvação chamou Santo Afonso Maria
de Ligório a um livrinho que, entre muitos outros, compôs sobre a oração; e diz
dele que queria vê-lo nas mãos de todos, por tratar de um meio tão principal e
de tanta eficácia para assegurar o Céu às almas. Pois, com não menos verdade,
ainda que em sentido algum tanto distinto, devemos dizer outro tanto da prática
do amor e contrição perfeita, como sendo o grande meio de salvação, pois que
está em conexão ainda mais imediata com a consecução da vida eterna do que
somente a oração.
Por isso, queria eu, como Santo Afonso com o seu, ver
este livrinho nas mãos de todos, persuadido de que a sua atenta leitura e a
execução prática das doutrinas que nele se ensinam, abrirão as portas do céu a
muitíssimas almas, para quem, sem ele, estariam eternamente cerradas, e de que
hão de acrescentar de uma maneira inesperada o direito ao Céu e à eterna
bemaventurança a muitas outras que, pela guarda da graça santificante, já são
credores dele.
Não devia haver cristão algum que não estivesse
solidamente instruído sobre a transcendência que tem um ato de contrição e
caridade perfeita, pois que é de incalculável importância tanto para a hora da
morte própria como para a dos outros, a quem talvez tenha de assistir.
Assim, pois, ninguém deveria esquecer-se desta verdade
em tempo de saúde; porém, para o tempo de enfermidade e de perigo sobretudo, é
sumamente para desejar-se que a conheçam a fundo e profundamente a gravem na
alma os que a têm esquecido ou só imperfeitamente a conhecem.
Oxalá, pois, se difunda o mais possível esta
obrazinha, e não duvido de que a sua leitura será acompanhada de inumeráveis
bênçãos do céu.
Pe. Agostinho Lehmkuhl, S.J.
Valkenburg, Colégio de Santo Inácio, outubro de
1903.
INTRODUÇÃO.
Ao ver o título de Chave de ouro do Céu, parece-me,
amado leitor, que estarás ansioso por ver se este livrinho corresponde por
dentro ao que promete por fora. Mas, pode ser que te ocorram algumas suspeitas.
Talvez que, nas práticas dominicais, o teu zeloso pároco te tenha prevenido
contra certas folhas e publicações supersticiosas, contra as Chaves do Céu, os
Ferrolhos do Inferno, as Orações maravilhosas autênticas e contra todas as
mercadorias parecidas, chamem-lhe como quiserem.
“Porém, se este livrinho é o que deve e promete ser —
dirás, de ti para ti — seria ditoso, teria uma chave do Céu, de que poderia
muito bem aproveitarme”. E verdadeiramente de ouro e digna, portanto, de todo
o apreço deve ser a chave que este autor me apresenta reluzente diante dos
olhos. Se é de verdadeiro ouro, e não só de ouropel, estou feliz.
Sim, amado leitor, sólida e legítima é a chave e bem
fácil de manejar por certo: é a contrição perfeita. Ela te abrirá, em cada dia
e a cada momento, o Céu se o fechaste com o ferrolho do pecado mortal; e,
sobretudo se, no fim da tua vida, como pode suceder, não tiveres nem puderes
ter a teu lado o sacerdote, que é o depositário das chaves da divina
misericórdia, a contrição perfeita será a última e suprema chave com que,
ajudado da graça de Deus, poderás franquear-te o Céu. Porém, para isso, é
preciso que te acostumes a manejá-la em vida.
Pela contrição perfeita, estão salvas no Céu
inumeráveis almas que, de outro modo, se teriam perdido para sempre. Já vês,
pois, que é importante, e sumamente importante, o que te recomendo neste
livrinho. Por isso, dizia o douto e piedoso cardeal Franzelin: “Se eu pudesse
percorrer os campos pregando a palavra divina, nenhuma outra coisa pregaria com
mais freqüência do que a contrição perfeita”.
Mais adiante, no capítulo V, te direi como vim a
escrever este livrinho e a percorrer assim os campos pregando a contrição
perfeita. Deus Nosso Senhor, por seu amor e misericórdia, te assista com sua
graça para que o compreendas, e, sobretudo, para que o pratiques, que é o que
importa, conforme a sua doutrina.
Posto isto, começo em nome do Senhor.
QUE É A CONTRIÇÃO PERFEITA?
Contrição é uma dor da alma e uma detestação dos
pecados cometidos. Deve acompanhá-la o propósito, quer dizer, uma firme vontade
de emendar a vida e de não mais pecar. Para que a contrição seja legítima, deve
ser interna e estar na alma, isto é‚ que não seja uma mera expressão feita com
os lábios e sem reflexão: isto seria apenas contrição de boca.
Não é necessário manifestar exteriormente a contrição
interna por meio de suspiros, lágrimas, etc... tudo isto pode ser sinal de
contrição, não é, porém, sua essência. A essência da contrição está na alma, na
vontade, em afastar-se deveras do pecado e converter-se para Deus.
Além disto, a contrição deve ser geral, quer dizer,
deve estender-se a todos os pecados cometidos ou, pelo menos, a todos os
mortais. Deve, finalmente, ser sobrenatural e não meramente natural, pois esta
nada aproveita.
Segue-se que a contrição, como todo o bem, deve
proceder de Deus e da sua graça, e, com a graça de Deus, desenvolver-se na
alma. Porém, não tenhas receio; basta que a peças, basta que tenhas boa vontade
e te arrependas por algum motivo legítimo, sobrenatural, e Deus te dará a graça
necessária.
Se o motivo se funda na natureza ou somente na razão
(por exemplo, nos danos temporais, na vergonha, doença, etc.), é muito fácil
que a dor seja puramente natural e sem mérito; porém, se o motivo da contrição
é alguma verdade da Fé, por exemplo: o inferno, o purgatório, o céu, Deus,
etc., então a contrição é legítima, sobrenatural.
E esta contrição legítima e sobrenatural pode, por
sua vez, ser de duas classes: perfeita e imperfeita; e com isto temos chegado a
nossa matéria da contrição perfeita. Em poucas palavras, contrição perfeita é a
contrição que procede de amor; imperfeita, a que procede do temor de Deus.
É contrição perfeita quando procede de amor perfeito
a Deus. Pois bem, o nosso amor a Deus é perfeito quando o amamos porque Ele é
em Si infinitamente perfeito, formoso e bom (amor de benevolência), e porque
nos mostrou de uma maneira tão admirável o seu amor (amor de agradecimento).
É imperfeito o amor de Deus quando o amamos porque
esperamos alguma coisa dEle. De modo que, com o amor imperfeito, pensamos
sobretudo nos dons; com o perfeito, na bondade do doador; com o amor
imperfeito, amamos mais os dons; com o perfeito amamos mais o doador, e isto
não tanto pelos seus dons como pelo amor e bondade que nos dons se manifesta.
Do amor nasce a contrição. Será, pois, perfeita a
contrição se nos arrependermos dos pecados por amor perfeito de Deus, quer seja
de benevolência quer de agradecimento. Será imperfeita se nos arrependermos dos
pecados por temor de Deus, porque pelo pecado perdemos a recompensa de Deus, o
Céu, e merecemos seu castigo, o inferno ou o purgatório.
Na contrição imperfeita, fixamo-nos principalmente em
nós e nas desgraças que, segundo a Fé nos ensina, nos acarretou o pecado. Na
contrição perfeita, fixamo-nos sobretudo em Deus, na sua grandeza, na sua
formosura, amor e bondade, vendo quanto o pecado O ofende, e que foi o pecado
que Lhe ocasionou tantos sofrimentos e dores para nos redimir. Na contrição
perfeita, não queremos unicamente o nosso bem, senão o bem de Deus.
Com um exemplo o verás melhor. Quando São Pedro negou
o Divino Salvador, saiu fora e “chorou amargamente” (Lc. 22,62).
— Por que chora São Pedro?
É, porventura, pensando na vergonha que vai ter
diante dos outros apóstolos? Se assim fosse, a sua dor teria sido puramente
natural e sem mérito. É porque receia que seu Divino Mestre lhe tire, como ele
merece, o cargo de Apóstolo e Superior e o expulse do seu reino? Então seria
boa contrição, mas somente imperfeita. Mas, não; Pedro arrepende-se e chora,
antes de tudo, porque ofendeu a seu amado Mestre, tão bom, tão santo, tão digno
de ser amado e por ser tão desagradecido ao seu imenso amor por ele. Tem, pois,
verdadeira e perfeita contrição.
Agora dize-me: tens tu também, cristão de minha alma,
algum fundamento, algum motivo, parecido com o de São Pedro, para te
arrependeres dos teus pecados por amor, e por amor perfeito e agradecido? Sim,
certamente, pois os benefícios que Deus te tem feito são mais que os cabelos da
tua cabeça, e, considerando-os, podes dizer, em cada um deles, o que dizia São
João: “Amemos a Deus já que Ele nos amou primeiro” (I Jo 4,19). E como te amou?
“... amo-te com eterno amor, e por isso a ti estendi o meu favor.” (Jer 31,3).
Sim, com amor eterno te amou. Desde toda a
eternidade, desde quando ainda não havia nem um átomo de ti sobre a terra, te
olhou com aqueles seus olhos amorosos e que tudo penetram, e te preparou alma e
corpo, céu e terra, com o amor com que uma mãe prepara todo o necessário para o
filhinho que ainda não nasceu.
Ele deu-te a saúde e a vida, Ele te deu e te dá, em
cada dia, todos os bens naturais. Consideração esta que até aos pagãos pode
fazê-los chegar ao conhecimento e amor perfeito de Deus; quanto mais a ti,
cristão, que conheces outro gênero muito diferente de amor e de bondade, o amor
e bondade sobrenatural de Deus para contigo; porque Deus se compadeceu de ti; e
quando, com todo o gênero humano, estavas condenado pela culpa original, Deus
enviou o seu Unigênito Filho, e Ele se fez teu Salvador e te remiu com seu
sangue, morrendo na Cruz.
E em ti pensava com entranhado amor quando agonizava
no horto das Oliveiras, e quando derramava o seu sangue com os açoites e os
espinhos, e quando subia arrastando a pesada Cruz pelo longo e áspero caminho
do Calvário; e quando, cravado nela, se desfazia em sangue entre indizíveis
tormentos. Em ti pensava com entranhado amor, como se tu foras o único homem da
terra.
Que tens a concluir daqui?
“Amemos a Deus já que Ele nos amou primeiro” (I Jo
4,19).
E Deus te atraiu a Ele pelo batismo, graça capital e
primeira da tua vida, e pela Igreja, em cujo seio foste então admitido. Quantos
há que, só a força de trabalhos e canseiras, conseguem encontrar a verdadeira
Fé, e a ti te a ofereceu Deus desde o berço, por puro amor. Atraiu-te a Ele e
te atrai sempre pelos sacramentos e pelas inumeráveis graças interiores e
exteriores de que te enche todos os dias, pois, em verdade, estás nadando, como
em imenso mar, na bondade e amor de Deus. E este amor, quer ainda coroá-lo
colocando-te consigo no Céu e fazendo-te eternamente feliz. Que lhe deves por
tanto amor? Não é verdade que deves corresponder a ele? Amemos também a Deus já
que Ele nos amou primeiro.
Pois, vamos a contas e dize-me: Como tens pago a
Deus, tão bom e amoroso, o seu amor e bondade para contigo? Dir-me-ás, sem
dúvida, que com ingratidão e pecados. E pesa-te essa ingratidão? Sem dúvida que
sim e queres ressarcir a tua pesada ingratidão, amando quanto possas tão grande
e amoroso benfeitor. Pois, olha, se assim é, já tens contrição perfeita,
contrição de amor de Deus. Para facilitar, chama-se a esta contrição de amor de
Deus, contrição de amor ou de caridade.
Na mesma contrição de caridade, há uma mais
levantada, que é quando alguém ama a Deus porque Ele é em si infinitamente
formoso, glorioso, perfeito e digno de amor, prescindindo do seu amor e
misericórdia para conosco. Há estrelas — e com esta comparação julgo que
entenderás melhor — que, por estarem muito longe de nós, não as podemos
distinguir, e, contudo, são tão grandes e formosas como o sol, que tão
prodigamente nos dá o calor e a vida.
Pois assim, ainda quando o homem não tivesse visto
nem gozado nunca do amor de Deus, eterna estrela do céu, ainda quando Deus não
tivesse criado o mundo nem criatura alguma, seria apesar disso grande, formoso,
glorioso e digno de ser amado, porque é em si mesmo e para si, o bem mais
excelente, o mais perfeito e digno de amor. Isto e não outra coisa quer dizer
essa expressão que, mais de uma vez, terás encontrado nos devocionários e nas
fórmulas do ato de contrição e te terá parecido talvez algum tanto obscura.
Detém-te, pois, agora e contempla o amor de Deus;
contempla-o, sobretudo, nos amargos sofrimentos do Salvador, a cuja luz o
compreenderás tão facilmente como facilmente te arrebatará o coração.
Eis aqui o modo de alcançar praticamente a contrição
perfeita.
COMO SE EXCITA A CONTRIÇÃO PERFEITA?
Hás de
pressupor que a contrição perfeita é graça e grande graça do amor e misericórdia
de Deus; e, se assim é, hás, portanto, de pedi-la com instância. Porém, não te
contentes com fazê-lo somente quanto trates de excitar a contrição, porque o
desejo de alcançá-la deve ser um dos mais ardentes anseios de tua alma. Pede-a,
pois, dizendo: Senhor, dai-me a graça do perfeito arrependimento, da perfeita
contrição dos meus pecados. E Deus não te faltará com a sua graça, se tiveres
boa vontade.
Posto
isto, repara como poderás facilmente conseguir a contrição perfeita. Põe-te
diante de um crucifixo, na igreja ou na casa de tua habitação, ou senão imagina
que o tens diante de ti, e, chorando de compaixão à vista das feridas do
Senhor, pensa uns momentos com fervor: Quem é este que está pendente da Cruz e
sofrendo nela?
— É Jesus, meu Deus e Salvador.
— Que sofre?
— As mais terríveis dores no corpo, tem-no
ensangüentado e coberto de feridas; a alma, tem-na lacerada pelas dores e
afrontas. Por que sofre tudo isso?
— Pelos pecados dos homens e... também pelos meus
pecados; em meio de suas amarguradas dores, também pensa em mim, também sofre
por mim, também quer expiar os meus pecados.
— Entretanto, deixa que o sangue redentor do
Salvador, quente ainda, caia sobre ti, gota a gota, e pergunta a ti mesmo como
tens correspondido ao teu Salvador, tão atormentado por ti.
Pensa um momento, recorda teus pecados, e esquece-te,
se quiseres, do Céu, do inferno, e arrepende-te principalmente porque são eles
que a tão miserando estado reduziram o teu Salvador; promete-lhe que não tornarás
a crucificá-Lo com mais pecados e, por fim, reza, pausadamente e com fervor,
acompanhando com sentimento interno, as palavras, a fórmula da contrição.
Esta
oração ou fórmula pode ser diversa e ainda pode cada um servir-se para ela de
suas próprias palavras. No fim do livrinho, encontrarás algumas; contudo
juntarei aqui uma bastante vulgar:
“Senhor meu e Deus meu: pesa-me, do mais íntimo do
coração, de todos os pecados de minha vida, porque com eles tenho merecido que
a vossa divina Justiça me castigasse na vida e na eternidade; porque tenho
correspondido ao vosso amor com tanta ingratidão, sendo como Sois o meu maior
benfeitor; porém, sobretudo, porque com eles Vos tenho ofendido a Vós, meu bem
supremo e digno de todo o amor. Proponho firmemente emendar-me e não mais
pecar. Dai-me, meu Jesus, a graça para cumpri-lo. Amém.”
Três
porquês contém esta oração, e a cada porquê acompanha um motivo de contrição,
primeiro da imperfeita, depois da perfeita; pois, da imperfeita se passa mais
facilmente para a perfeita e é por isto conveniente unir as duas espécies de
contrição. Em outras palavras, convém que se excite em primeiro lugar a
contrição imperfeita e depois a perfeita. Dize, pois:
1—
“porque com eles, tenho merecido...” Isto é ainda contrição imperfeita.
2— “porque tenho correspondido...” Esta vai já se
aproximando da contrição perfeita e até se reduz a ela; porque, se deveras
sinto ter correspondido com ingratidão e com pecados ao amor e bondade de Deus,
necessariamente hei de querer ressarcir com amor esta ingratidão; e o sentir
por amor a ofensa do benfeitor, a quem até agora se desconhecia, é já contrição
perfeita, contrição de caridade para com Deus.
3— “porém, sobretudo, porque com eles Vos tenho
ofendido...”
Se
voltares a ler o capítulo I, entenderás o que isto significa e, entendendo-o,
verás mais claramente expressado aqui o amor perfeito e a contrição perfeita.
Para consegui-lo mais facilmente, podes acrescentar, mentalmente ou por
palavras, o que segue: “porém, sobretudo, porque com eles Vos tenho ofendido a
Vós, meu bem supremo e digno de todo o amor. Salvador meu que, por meus
pecados, morrestes na Cruz”.
Depois
vem o propósito: “Proponho...” — Porém, padre, dir-me-ás talvez — para outros,
será isso muito fácil, mas para mim, é coisa muito difícil, quase impossível.
— Parece-te isso? Pois não o julgues tal.
É DIFÍCIL EXCITAR A CONTRIÇÃO PERFEITA?
Antes de
tudo, é verdade que, para a contrição perfeita, se requer mais do que para a
imperfeita, que é a de que se necessita para a Confissão. Contudo, porém,
ajudado com a graça de Deus, pode qualquer um alcançar a contrição perfeita,
bastando que deveras a deseje, porque a verdadeira contrição está na vontade e
não no sentimento.
Tudo se
reduz a termos o devido motivo de arrependimento, quer dizer, que nos
arrependamos porque amamos a Deus sobre todas as coisas e, por seu amor,
detestamos os nossos pecados; nisto, e não na duração ou intensidade da dor,
está a contrição perfeita. Digo isto, porque muitas vezes se confunde a contrição
perfeita com certa contrição que há, altíssima e sublime, não se advertindo que
a contrição perfeita tem seus graus e degraus, e que, para que o seja, não é
necessário que chegue à contrição altíssima e firmíssima de São Pedro, de
Madalena, de São Luiz Gonzaga e de outros santos: muito bom seria isso, mas não
é necessário; um grau mais baixo de contrição perfeita e verdadeira basta para
perdoar os pecados.
Além
disso, advertirás uma coisa, que me parece te animará e te dará confiança para
poderes alcançar a contrição perfeita. Antes de Jesus Cristo, na Lei antiga,
por espaço de 4.000 anos, foi a contrição perfeita o único meio que tiveram os
homens para alcançarem o perdão dos pecados e entrarem no Céu. E hoje mesmo a
milhões e milhões de pagãos e hereges que só e unicamente pela contrição
perfeita, podem sair do pecado.
Portanto,
se é verdade, como é, que Deus não quer a morte do pecador, parece natural que
não haja exigido para a contrição perfeita ato demasiadamente difícil, mas
antes que esteja ao alcance de todos. Pois, se podem alcançar a perfeita
contrição tantos e tantos que vivem e morrem afastados, é verdade que sem culpa
sua, da corrente da graça e da Igreja Católica, ser-te-á isto a ti difícil, a
ti, que tens a grande dita de ser cristão e católico, a ti, que tens muito mais
graças e estás mais instruído do que eles?
E ainda
te digo mais: muitas vezes, sem o saber ou sem o pensar, tens realmente
contrição perfeita; quando, por exemplo, ouves piedosamente a santa Missa,
quando fazes com devoção a Via-Sacra, quando meditas com fervor diante de uma
imagem de Jesus crucificado ou do Sagrado Coração, ou assistes à pregação da
palavra divina.
Além
disso, muitas vezes pode-se exprimir com poucas palavras o amor mais ardente e
a mais profunda contrição, atendendo só ao sentido e ao motivo (o amor de
Deus). Por exemplo, com estas jaculatórias: “Deus meu e meu tudo!”; “Meu Jesus,
misericórdia!”; “Ó meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas!”; “Meu Deus,
compadecei-Vos de mim pecador!” E...
“Pequei, já minha alma
Sua culpa confessa;
Mil vezes me pesa
De tanta maldade.
Mil vezes me pesa
De haver, obstinado,
Teu peito rasgado,
Ó suma Bondade!”
Finalmente, se tão soberanos efeitos obra Deus pela
contrição perfeita, sinal é de que quer que a excitemos e de que Ele nos
ajudará para consegui-la.
— E que
efeitos são estes que produz a contrição perfeita?
Efeitos
verdadeiramente admiráveis!
Se és pecador, perdoa-te imediatamente os pecados e
isto de cada vez e ainda antes de receberes o sacramento da Confissão;
necessário é, porém, que tenhas vontade de confessá-los mais tarde (vontade
esta que já está incluída na contrição perfeita). E este efeito é produzido
pela contrição perfeita e verdadeira não só em perigo de morte, mas sempre e
quando a excitamos no coração; de modo que o pecador, ao mesmo tempo que lhe
são remitidas as penas do inferno, recobra os méritos passados e, de inimigo de
Deus, se faz seu filho e herdeiro do Céu.
Se és
justo, a contrição perfeita assegura-te e aumenta-te o estado de graça,
apaga-te os pecados veniais que, pelo ato de contrição de caridade, detestaste;
perdoa-te, sobretudo, as penas dos pecados, firmando e robustecendo-te no
verdadeiro e sólido amor de Deus.
Tais são
as maravilhas que o amor e a misericórdia de Deus obram na alma do cristão pela
contrição perfeita.
Tão grandes são que, talvez, te pareçam incríveis;
tratando-se do perigo de morte, já terás ouvido que se devem pedir a contrição
e a dor; mas que também, em tempo de saúde e em qualquer tempo, a contrição
perfeita obre tais maravilhas, mal te atreverás a acreditá-lo.
— Será,
pois, certa e segura esta doutrina da contrição perfeita?
Digo-te
que é tão firme e tão segura como a própria palavra de Deus.
No Concilio ecumênico de Trento, onde a Igreja
declarou e explicou os principais ensinamentos divinos que já eram correntes
nela e eram combatidos por muitos hereges, diz-se na Sessão 14, cap. 4: “A
contrição perfeita, a contrição que procede do amor de Deus, justifica o homem
e reconcilia-o com Deus ainda antes de receber o sacramento da Confissão”.
Como o
Concilio não diz que isto seja só em tempo de necessidade e em perigo de morte,
segue-se que a contrição perfeita produz sempre este efeito. E, para o afirmar,
apóia-se a Igreja na palavra e ensino de Jesus Cristo, que diz entre outras
coisas: “Se alguém me ama (e isto só o faz o que tem verdadeira contrição no
coração), meu Pai o amará e Nós viremos a ele e faremos nele morada” (I Jo
14,23).
Para
que, porém, Deus possa habitar na alma, é preciso que o pecado tenha
desaparecido; logo, o apagar o pecado é um dos efeitos da contrição perfeita,
da contrição de caridade.
Assim
também o tem declarado sempre a Igreja infalível, chegando a condenar como
herege, Baio, por dizer o contrário.
O mesmo
ensinam os Santos Padres e Doutores sagrados sem exceção e o mesmo confirma a
razão, porque se, como já disse, tão grandes efeitos produzia a verdadeira
contrição no Antigo Testamento, quando ainda imperava a lei do temor, quanto
maior produzirá no Novo, em que impera a lei do amor!
—
Dir-me-ás, talvez, porém, se a contrição perfeita destrói os pecados, a que vem
confessá-los depois?
Sim, é
verdade; a contrição perfeita faz o mesmo que a Confissão, faz com que
desapareçam da alma os pecados; não o faz, porém, com independência do
sacramento da Confissão, porque é necessário ter vontade de confessar mais
tarde os pecados destruídos ou apagados pela contrição perfeita.
E isto porque é lei de Jesus Cristo que se confessem
todos os pecados, pelo menos todos os mortais, e esta lei, de forma alguma, se
pode mudar. Verdade é que, se alguém não quisesse depois confessar os pecados
que lhe foram perdoados pela contrição perfeita, não os contrairia novamente;
mas é certo que perderia de novo o estado de graça, precisamente por faltar à
obrigação de confessá-los.
— E
devemos confessar os pecados logo que o possamos fazer depois da contrição de
caridade?
Em
rigor, não é necessário; porém, de todo o coração, aconselho-te e recomendo-te
que o faças; assim estarás mais seguro de ter alcançado o perdão e conseguirás,
por sua vez, as grandes graças que traz consigo o sacramento da Confissão e que
se chamam graças sacramentais.
Talvez
que alguém, tentado pelo demônio, vendo os grandes efeitos da contrição
perfeita, diga: “Pois se é tão fácil alcançar o perdão dos pecados com a
contrição perfeita, já não preciso mais me confessar; peco quanto quiser,
arrependo-me depois com contrição perfeita, e estou pronto. Não é assim?”
Não, de
forma alguma; porque quem assim pensa não tem nem sombra de contrição. Não ama
a Deus sobre todas as coisas logo que não queira em tudo e por tudo romper com
o pecado mortal, nem trata seriamente de emendar a sua vida, coisa que tanto se
requer para a Confissão como para a contrição perfeita; em uma palavra,
falta-lhe boa vontade e, faltando-lhe esta, faltar-lhe-á a graça de Deus, sem a
qual a contrição perfeita é absolutamente impossível.
Poderá
enganar-se a si mesmo, jamais, porém, enganará a Deus Nosso Senhor. Aquele que
tem contrição perfeita, está inteiramente resolvido a romper com o pecado
mortal; receberá logo que possa e com mais fervor do que dantes, os santos
sacramentos, e com a sua boa vontade, ajudada da graça de Deus, conservar-se-á
livre de pecado e se firmará mais e mais no feliz estado de filho de Deus.
A quem,
de modo especial, a contrição perfeita auxilia, é aos que leal e sinceramente
querem adquirir e conservar o estado de graça e, sobretudo, aos que pecam por
costume, isto é, aos que, ainda que tenham boa vontade, a força dos maus
hábitos e a própria fraqueza os fazem cair de vez em quando; porém, de forma
alguma, a contrição perfeita ajuda aos que se acolhem a ela para pecarem mais à
vontade. E estes convertem o celestial remédio do perfeito arrependimento em
narcótico fatal e em infernal veneno.
Não
sejas, pois, destes, leitor amado; não consintas, incauto, que graça tão
preciosa como a contrição perfeita te sirva para o mal, senão para o bem, já
que tão grandes bens produz na alma do cristão.
— E que
bens são esses que produz a contrição perfeita? Por que é tão importante e até
necessária a contrição perfeita?
É importante na vida e na morte.
I — É importante na
vida
Porque: que precioso não é o estado de graça!
A graça não adorna somente a alma, mas invade-a e
penetra-a toda, e transforma-a em uma nova criatura, em filha de Deus e
herdeira do céu. Além disso, faz com que todas as obras e trabalhos do cristão
sejam meritórios para o Céu; a graça é a varinha mágica que tudo converte em
ouro, porém em ouro de méritos celestiais.
Pelo contrário, que triste é o estado do cristão que
jaz em pecado! Todos os seus trabalhos, todas as suas orações, todas as suas
boas obras ficam inúteis e sem mérito para o Céu; é inimigo de Deus e, no
momento em que o tênue fio da vida se parta, cairá precipitado no inferno. Não
será, pois, importante e necessário o estado de graça para o cristão?
Pois, se o perdeste, podes recuperá-lo,
principalmente de duas maneiras:
1º Pela Confissão.
2º Pela contrição perfeita.
A Confissão é o meio adequado e ordinário para
alcançar a graça santificante. Como este meio, porém, nem sempre está ao nosso
alcance, Deus deu-nos outro extraordinário, que é a contrição perfeita.
Imagina que, um dia, tens a imensa desgraça de
cometer um pecado mortal. Quando, passada a agitação do dia, vem o sossego da
noite, a tua consciência angustiada levanta-se e clama com voz poderosa. —
Confessarse agora... não é possível.
Como remediar este estado? Pois olha, Deus põe em
tuas mãos a chave de ouro que te vai abrir as portas do Céu; arrepende-te de
teus pecados por verdadeiro amor de Deus, protesta-lhe firmemente não tornar a
cometê-los, promete confessá-los quanto antes, e podes acreditar que estás
reconciliado com Deus; deita-te tranqüilo.
Porém, se o cristão não conhece nem pratica a
contrição perfeita, que triste estado o da alma! Em pecado mortal se deita e se
levanta, e assim vive dois, três, quatro meses e mais, até a Confissão seguinte.
E talvez que, neste estado, continue por anos
inteiros, sem que a profunda noite do pecado seja interrompida, nem um momento
sequer, na sua alma pelos raios do sol da graça depois da Confissão. Triste
estado! Viver quase sempre em pecado, inimigo de Deus, sem mérito para o Céu e
em perigo de eterna condenação!
Mais; quando alguém, antes de receber um sacramento,
por exemplo, o da Confirmação, o do Matrimonio, se lembra de um pecado grave
não perdoado, pode, pela contrição perfeita, fazer-se digno de receber o
sacramento. Somente para a Comunhão, isso não basta; é necessária a Confissão.
Também para o cristão que está em estado de graça, é
importante o uso freqüente da contrição perfeita. Antes de tudo, nunca podemos
estar completamente seguros de que estamos em estado de graça. Porém, esta
segurança aumenta e se confirma com cada ato de verdadeira contrição perfeita.
Sucede, além disso, que alguém tenha dúvida sobre se
consentiu em alguma tentação; estas dúvidas acovardam e desalentam a alma no
caminho da virtude. Que há a fazer nestes casos? Examinar se consentimos ou
não? Isso de nada aproveita. Excita-te à contrição perfeita e fica tranqüilo.
Porém, ainda que tivéssemos toda a certeza possível
de que estamos em graça, que preciosa não é a contrição perfeita!
Por cada ato de contrição perfeita, aumentamos este
estado de graça na alma, e cada grau de graça vale mais do que todas as
riquezas do mundo.
Por cada ato de contrição perfeita e caridade,
destroem-se os pecados veniais e as faltas que mancham a alma, e esta fica cada
vez mais formosa diante de Deus.
Por cada ato de contrição perfeita, são perdoadas as
penas temporais dos pecados (*).
Recorda-te do que o Senhor disse à Madalena:
“Perdoados lhe são muitos pecados, porque amou muito” (Lc 7,47). E se tanto
apreciamos, e com razão, as indulgências, as boas obras, as esmolas, incluamos
entre estas a caridade, a rainha das virtudes.
Por cada ato de contrição perfeita vai a alma
confirmando-se mais e mais no bem e robustecendo-se contra o mal, de modo que,
com razão, pode esperar a suprema graça da perseverança final. Já vês, pois,
que é importante a contrição perfeita na vida. Porém, de modo particular;
II — É importante na morte
Sobretudo em perigo de morte repentina.
Houve um grande incêndio numa cidade, e neste
pereceram centenas de pessoas. Entre muitas que gemiam no pátio de uma casa,
via-se um menino de doze anos que, de joelhos, pedia em voz alta a graça da
contrição; explicou depois porque o fazia e suplicou que orassem com ele em voz
alta.
Talvez que, por seu intermédio, muitos daqueles
infelizes se salvassem para sempre.
Perigos como este sem conta te cercam e, quando menos
o penses, podes ser vítima de uma desgraça repentina: podes, por exemplo, cair
de uma árvore; podes ser atropelado por um carro na rua; podes ser surpreendido
de noite, pelo fogo, na tua habitação; podes colocar mal o pé em uma escada;
pode ser que, enquanto trabalhas, te falte repentinamente os sentidos e
caias... levam-te moribundo à casa, vão a correr chamar o sacerdote; este,
porém, tarda em chegar, e urge tanto!... Que fazer? Excita-te em seguida à
contrição perfeita, arrepende-te por amor e gratidão para com Deus, e Jesus
Cristo paciente salvar-te-á por toda a eternidade; a contrição perfeita terá
sido para ti a chave do Céu no último momento e no último e supremo transe para
a alma e para o corpo.
Com isto, não desejo que alguém se aventure a deixar
tudo para o último momento, à mercê de um ato de contrição perfeita, julgando
ficar já por isso livre de pecado, pois é muito duvidoso que a contrição
perfeita possa servir aos que têm pecado à sua sombra. O que deixo dito vale,
antes de tudo e sobre tudo, para os que têm boa vontade.
— Porém,
haverá tempo — dir-me-ás — em tais circunstâncias, para fazer um ato de
contrição perfeita?
Com a
ajuda de Deus, sim; porque, para a contrição perfeita não se requer muito
tempo, sobretudo quando antes, em tempo de saúde, nos temos exercitado nela; em
um momento a podemos excitar e penetrar na alma. E como, em casos tão
extraordinários, tem mais eficácia a graça de Deus, e o espírito, mais
atividade no transe tremendo da morte, dos momentos se fazem horas. Lembra-te
de que falo por experiência própria.
Uma vez, a 20 de julho de 1886, estive em grande e
terrível perigo de morte, seria coisa de oito ou dez segundos, o espaço para
meio Pai-Nosso. Pois, em tão curto espaço de tempo, mil pensamentos cruzaram-se
em minha mente; a minha vida inteira passou diante de minha alma, com rapidez
incrível, e, atrás dela, o que seria de mim depois da minha morte; tudo isto,
como disse, num espaço de tempo insignificante, o suficiente para meio
Pai-Nosso. Por dita minha, porém, e grande favor de Deus, a quem rendo graças,
não foi aquele momento para morte, mas sim para vida; — do contrário, não teria
podido escrever a Chave de ouro.
Pois, a
primeira coisa que fiz, em tão terrível momento, foi o que, segundo o
Catecismo, deve fazer todo o cristão em perigo de morte: excitar-se à contrição
e recorrer a Deus pedindo-a e implorando-a a seu favor. E a verdade é que,
naquela ocasião, creio que aprendi a amar e apreciar o valor da contrição
perfeita; desde então tenho difundido, quanto me tem sido possível, o seu
conhecimento e estima. E esta misericórdia, que podes exercitar na tua alma no
último momento, podes exercitá-la também com os demais cristãos, teus irmãos. E
quão triste é que, em tão apurado transe, não seja isto melhor compreendido!
Acode
muita gente, choram e gritam desordenadamente, e, sem saber que fazer, correm à
procura do médico e do sacerdote, trazem todos os remédios que têm em casa e,
entretanto, o enfermo agoniza, e... Naqueles breves mas preciosos momentos,
talvez não haja quem se compadeça da sua alma imortal e lhe proponha que faça
um ato de contrição perfeita e o salve para sempre.
(*) Quer dizer que se perdoam sempre algumas penas
e até todas, se o ato for mui intenso (N. do T.).
Se te
apresentar ocasião, vai com sossego e tranqüilidade para o lado do moribundo
ferido ou enfermo; se te for possível, põe-lhe o Crucifixo diante dos olhos e,
com voz firme mas tranqüila, pede-lhe que pense e repita com o coração o que tu
vais rezar; e, feito isto, vai dizendo compassada e claramente o ato de
contrição, ainda que te pareça que ele nada ouve nem entende. Com isto, terás feito
uma obra sumamente boa, e o moribundo te agradecerá eternamente no Céu. Sim,
até mesmo a um herege, podes ajudar desta maneira em seus últimos momentos; não
lhe fales, se queres, de Confissão, porém excita-o a que faça um ato de amor de
Deus e de Jesus Crucificado e dize-lhe compassadamente o ato de contrição.
III - Quando se deve excitar a contrição
perfeita?
1. Se,
com fidelidade e bom desejo, me tens seguido até aqui, cristão leitor, deixa
que, olhando-te afetuosamente e apertando-te a mão, te diga de todo o coração e
com a maior insistência: dá este prazer a Deus e à tua alma: fase devotadamente
todas as noites, com tuas orações, um ato de contrição perfeita. Não deixes
passar noite alguma sem exame de consciência e contrição, como não deixes
passar manhã alguma sem purificar a intenção. Não pecarás, é claro, se o
deixares de fazer alguma vez; porém tem por bom e saudável o conselho que te
dou.
E não me
digas que isso de exame de consciência e contrição é coisa própria de
sacerdotes e homens perfeitos e não para ti; não te escuses com o “não há
tempo”; “está a gente tão cansado quando chega a noite...”
Quanto
tempo julgas que é necessário? Meia hora? Não. Um quarto de hora? Também não;
alguns poucos minutos bastam. Não costumas recitar algumas orações antes de te
deitares? Pois, em seguida à tua pequena oração, pensa uns momentos nas faltas
e pecados do dia que acaba de passar, e reza, pausadamente e com fervor, diante
do Crucifixo, o ato de contrição. Depois podes recolher-te tranqüilo. Deste ao
Senhor as boas noites, e ele te respondeu: “Boa noite, filho”. Ele perdoou-te
misericordiosamente os teus pecados. Que te parece? Fá-lo desde esta noite e
jamais te arrependerás.
2. Se,
nesta vida, tiveres a imensa desgraça de cometeres um pecado mortal, não
permaneças mergulhado em tão grande miséria; levanta-te pela contrição
perfeita, levanta-te imediatamente, ou, o mais tarde, logo que faças as tuas
orações da noite; depois não demores muito em confessar-te.
3.
Finalmente, cristão da minha alma, mais tarde ou mais cedo, terás que morrer, e
se, o que não te desejo, a morte te colhesse de improviso, já sabes onde está o
remédio, já sabes onde está a chave do Céu.
Chama
imediatamente por Deus com íntima e perfeita contrição, e, se em vida te
exercitares nela gostosa e devidamente, não te faltarão então tempo, vontade e
graça de Deus para teres firme contrição perfeita, e a contrição perfeita te
salvará.
4. Porém,
se antes de morrer, tens tempo para prevenir-te e preparar-te para o caminho da
eternidade, que a última coisa que na terra penses e faças, com conhecimento,
seja um ato de entranhado amor de Deus, teu Criador, teu Redentor, Salvador e
Juiz; um ato de sincera e perfeita contrição de todos os pecados da tua vida.
Feito isto, lança-te com confiança nos braços da misericórdia divina e Deus
será para ti bondoso Juiz.
Com
isto, me despeço de ti, amado leitor; vê e faze o que neste livrinho tens lido.
Ama e pratica a contrição perfeita, meio esplêndido de graça que a divina
misericórdia põe em tuas mãos para saíres do pecado mortal em qualquer momento,
e não só em perigo de morte; meio fácil, que tão grandes efeitos produz; meio
supremo e único que, em caso de necessidade, salvará a tua alma; fonte, enfim,
de graças na vida e na morte — verdadeira chave de ouro do Céu.
ATOS DE CONTRIÇÃO
1. Senhor meu Jesus Cristo,
Deus e homem verdadeiro, Criador e Redentor meu, por serdes Vós quem sois, e
porque Vos amo sobre todas as coisas, pesa-me de todo o coração de Vos ter
ofendido; proponho firmemente nunca mais pecar, confessar-me, cumprir a
penitência que me for imposta, e afastar-me de todas as ocasiões de Vos
ofender; ofereço-Vos a minha vida, obras e sofrimentos em satisfação de todos
os meus pecados, e confio na vossa bondade e misericórdia infinitas que os
perdoareis pelos merecimentos do vosso preciosíssimo Sangue, Paixão e Morte, e
me dareis graça para emendar-me e perseverar em vosso santo serviço até o fim
da minha vida. Amém.
2. Senhor meu e Deus meu!
Do íntimo do coração, me pesa de todos os pecados da minha vida. Pesa-me porque
com eles mereci o purgatório ou o inferno; porque tenho desprezado o céu e
porque tenho sido tão ingrato para convosco, o meu maior benfeitor. Pesa-me,
sobretudo, porque, com os meus pecados, Vos tenho açoitado e crucificado, a Vós
meu amabilíssimo Salvador. Agora, porém, amo-Vos, meu maior benfeitor, meu pai
amabilíssimo e misericordiosíssimo Redentor; amo-Vos de todo o coração e sobre
todas as coisas, e, porque Vos amo, me pesa e me arrependo de Vos ter ofendido,
Deus meu, que sois infinitamente formoso, bom e digno de ser amado. Proponho
firmemente emendar a minha vida e não mais pecar. Ó meu Jesus! dai-me a vossa
graça para cumpri-lo. Amém.
3. Senhor meu Jesus Cristo,
Deus e homem verdadeiro, Vós me criastes à vossa imagem e semelhança, Vós me
remistes com infinito amor, morrendo na Cruz e me quereis levar ao Céu para me
fazer eternamente feliz. Eu, em troca, tenho-Vos ofendido tantas vezes com meus
pecados e tenho merecido justos castigos nesta vida e na outra.
Sim, sou culpado do vosso Sangue e de vossas feridas;
tenho afligido e amargurado o vosso amantíssimo Coração de Redentor com meus
pecados e minha ingratidão. Detesto esta ingratidão e, para compensá-la,
amo-Vos com mais ardente amor, sobre todas as coisas. E, porque Vos amo,
pesa-me de todo o coração e sobre todas as coisas, de Vos ter ofendido, Senhor
meu e Deus meu. Perdoai-me, eu Vos peço. Quero desde este momento emendar-me
com fervor. Dai-me, Jesus misericordioso, a vossa graça para isto. Amém.
Ato de amor perfeito e contrição perfeita, atribuído a São Francisco Xavier
Não me move meu Deus, para querer-te,
O Céu que me tens prometido,
Nem me move o inferno, tão temido,
Para deixar por isso de ofender-te.
Tu me moves, Deus meu, move-me o ver-te
Cravado em uma cruz, escarnecido;
Move-me o ver teu Corpo tão ferido,
Movem-me tuas afrontas e tua morte;
Move-me, enfim, teu amor e de tal maneira
Que, ainda que não houvesse Céu, te amaria,
E, ainda que não houvesse inferno, te temeria.
Nada tens que dar-me porque te quero;
Porque, se não esperasse o que espero,
Te queria o mesmo que te quero.
Resumo do ato de Contrição que usava o Ven. Marcos de Aviano, religioso
capuchinho, morto em odor de santidade.
Eu, ruim
e indigna criatura, me lanço a vossos pés, Deus meu, e, com o coração contrito
e aflito, reconheço e confesso diante de Vós, Redentor de minha alma, que,
desde o instante em que nasci até agora, tenho cometido inumeráveis
negligências e pecados.
Tenho-Vos ofendido, Deus meu! Pequei, Senhor! Porém,
detesto os meus pecados e me arrependo do íntimo do coração. Por isso, prometo
solenemente não mais pecar. Porém, se Vós, em vossa altíssima sabedoria,
preveis que posso novamente ofender-Vos e cair outra vez no vosso desagrado, de
todo o coração Vos peço que me leveis agora desta vida, em vossa graça.
Oxalá a minha dor fosse tão grande que o propósito de
não mais Vos ofender permanecesse sempre imutável! Porque Vos devo infinito
agradecimento pela vossa divina bondade e porque mereceis que Vos ame sobre
todas as coisas, arrependo-me de meus pecados, não tanto para livrarme dos
tormentos eternos que por eles mereci, nem para gozar das delicias do Céu, que
tão inconsideradamente desprezei, como porque vos desagradam a Vós, Deus meu,
que, por vossa bondade e infinitas perfeições, sois digno de infinito amor.
Oxalá todas as criaturas vos mostrem sem interrupção,
amor, reverência e agradecimento. Amém.
Ato de contrição usual no Brasil
Senhor
meu Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro, Criador e Redentor meu, por serdes
Vós quem sois, sumamente bom e digno de ser amado, e porque Vos amo e estimo
sobre todas as coisas: pesa-me, Senhor, de todo o meu coração, de Vos ter
ofendido; pesa-me, também, por ter perdido o Céu e merecido o inferno; e
proponho firmemente, ajudado com os auxílios de vossa divina graça, emendar-me
e nunca mais Vos tornar a ofender. Espero alcançar o perdão de minhas culpas
pela vossa infinita misericórdia. Amém.
Disposição do Código de Direito Canônico sobre a contrição perfeita.
Cânon 916 — Quem está
consciente de pecado grave não celebre a missa nem comungue o Corpo do Senhor,
sem fazer antes a confissão sacramental, a não ser que exista causa grave e não
haja oportunidade para se confessar; nesse caso, porém, lembre-se que é
obrigado a fazer um ato de contrição perfeita, que inclui o propósito de se
confessar quanto antes.
A propósito deste cânon, os canonistas espanhóis da
Universidade de Navarra, Pedro Lombardia e Juan Ignacio Arrieta, fazem o
seguinte comentário, na edição anotada do Código de Direito Canônico promovida
pela mesma Universidade:
“Este cânon se refere ao celebrante ou ao que recebe
o sacramento. Um ato de contrição perfeita, com efeito, perdoa o pecado mortal;
porém — como lembra o segundo mandamento da Igreja — permanece a obrigação de
confessar-se previamente à recepção da Eucaristia; obrigação que só se dispensa
a iure quando coincidem, suposta a contrição perfeita, estas duas condições:
1) causa grave: perigo de morte, ou de infâmia se não
celebrar ou comungar;
2) impossibilidade de confessar-se previamente, por
falta de confessor idôneo (cfr. Concílio de Trento, Sessão 13, cap. 11).
Naturalmente, o ato de contrição, como parte
integrante de sua perfeição, exige o propósito firme de confessar-se, que deve
satisfazer-se tão logo seja possível”.
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