Wednesday, 3 September 2014

“A Volta da Primavera” by Castro Alves (in Portuguese)



Aime, et tu renaítras; fais-toi fleur pour éclore,
Après avoir souffert, il faut souffrir encore;
Il faut aimer sans cesse, après avoir aimé.
A. DE MUSSET


AI! Não maldigas minha fronte pálida,
E o peito gasto ao referver de amores.
Vegetam louros — na caveira esquálida
E a sepultura se reveste em flores.

Bem sei que um dia o vendaval da sorte
Do mar lançou-me na gelada areia.
Serei... que importa? o D. Juan da morte
Dá-me o teu seio — e tu serás Haidéia!

Pousa esta mão — nos meus cabelos úmidos!...
Ensina à brisa ondulações suaves!
Dá-me um abrigo nos teus seios túmidos!
Fala!... que eu ouço o pipilar das aves!

Já viste às vezes, quando o sol de maio
Inunda o vale, o matagal e a veiga?
Murmura a relva: "Que suave raio!"
Responde o ramo: "Como a luz é meiga!"

E, ao doce influxo do clarão do dia,
O junco exausto, que cedera à enchente,
Levanta a fronte da lagoa fria...
Mergulha a fronte na lagoa ardente ...

Se a natureza apaixonada acorda
Ao quente afago do celeste amante,
Diz!... Quando em fogo o teu olhar transborda,
Não vês minh'alma reviver ovante?

É que teu riso me penetra n'alma —
Como a harmonia de uma orquestra santa —
É que teu riso tanta dor acalma...
Tanta descrença!... Tanta angústia!... Tanta!

Que eu digo ao ver tua celeste fronte,
"O céu consola toda dor que existe.
Deus fez a neve — para o negro monte!
Deus fez a virgem — para o bardo triste!"

Tuesday, 2 September 2014

"O Sorriso do Tio Pavel Pleffel" (Chapter VII) by José Thiesen (in Portuguese)



No dia seguinte, acordei com vozes no meu quarto, coisa extraordin]aria, pois dormia pois sempre dormi só, por ser filho único.
Abri os meus olhos, preguiçoso, e levei um susto ao ver o sr. Pavel sentado na minha cadeia, conversando com um boneco que ganhara quando bebé, um elefane de pano xadrez, branco e preto.
- Como o sr. entrou aqui? perguntei.
- Pela porta.
- O sr. falava com meu boneco?
- Eu? Falando com um boneco? Ainda tens muito que aprender, menino!
- Mas eu...!
- Olhe: vim assim de surpresa por causa da pressa.Hoje hoverá festa no céu e todas as aves foram convidadas, inclusive eu. Como permitiram que levasse acompanhante, pensei em convidar-te.
- Uma festa no céu? Quer dizer, o céu, lá em cima?
- Quantos outros há?
- Mas o senhor não é uma ave; porque foi convidado?
- Porque sou quem sou. Mas afinal, vamos ou não vamos? É para já!
- Mas e minha mãe, a escola?
- São muitos “mas”! De um lado, há um mundo abrindo-se diante de ti; por outro, já deves ter percebido que eu jamais te deixaria em maus lençóis. Não é de minha natureza prejudicar ninguém.
Olhou-me com sua habitual severidade e perguntou: 
- Vens comigo ou não?
E estendi-lhe minha mão!

Saturday, 30 August 2014

The Hunting Of The Snark an Agony in Eight Fits (Preface) by Lewis Carroll (in English)




PREFACE

If—and the thing is wildly possible—the charge of writing nonsense were ever brought against the author of this brief but instructive poem, it would be based, I feel convinced, on the line (in p.4)

               "Then the bowsprit got mixed with the rudder sometimes."

In view of this painful possibility, I will not (as I might) appeal indignantly to my other writings as a proof that I am incapable of such a deed: I will not (as I might) point to the strong moral purpose of this poem itself, to the arithmetical principles so cautiously inculcated in it, or to its noble teachings in Natural History—I will take the more prosaic course of simply explaining how it happened.

The Bellman, who was almost morbidly sensitive about appearances, used to have the bowsprit unshipped once or twice a week to be revarnished, and it more than once happened, when the time came for replacing it, that no one on board could remember which end of the ship it belonged to. They knew it was not of the slightest use to appeal to the Bellman about it—he would only refer to his Naval Code, and read out in pathetic tones Admiralty Instructions which none of them had ever been able to understand—so it generally ended in its being fastened on, anyhow, across the rudder. The helmsman used to stand by with tears in his eyes; he knew it was all wrong, but alas! Rule 42 of the Code, "No one shall speak to the Man at the Helm," had been completed by the Bellman himself with the words "and the Man at the Helm shall speak to no one." So remonstrance was impossible, and no steering could be done till the next varnishing day. During these bewildering intervals the ship usually sailed backwards.

As this poem is to some extent connected with the lay of the Jabberwock, let me take this opportunity of answering a question that has often been asked me, how to pronounce "slithy toves." The "i" in "slithy" is long, as in "writhe"; and "toves" is pronounced so as to rhyme with "groves." Again, the first "o" in "borogoves" is pronounced like the "o" in "borrow." I have heard people try to give it the sound of the "o" in "worry". Such is Human Perversity.

This also seems a fitting occasion to notice the other hard works in that poem. Humpty-Dumpty's theory, of two meanings packed into one word like a portmanteau, seems to me the right explanation for all.

For instance, take the two words "fuming" and "furious." Make up your mind that you will say both words, but leave it unsettled which you will first. Now open your mouth and speak. If your thoughts incline ever so little towards "fuming," you will say "fuming-furious;" if they turn, by even a hair's breadth, towards "furious," you will say "furious-fuming;" but if you have the rarest of gifts, a perfectly balanced mind, you will say "frumious."

Supposing that, when Pistol uttered the well-known words—

              "Under which king, Bezonian?  Speak or die!"

Justice Shallow had felt certain that it was either William or Richard, but had not been able to settle which, so that he could not possibly say either name before the other, can it be doubted that, rather than die, he would have gasped out "Rilchiam!"










Thursday, 28 August 2014

“12 Angry Men” by Reginald Rose (in English)



Juror #8: [taking a cough drop that Juror #2 offered him] There's something else I'd like to talk about for a minute. Thanks. I think we've proved that the old man couldn't have heard the boy say "I'm gonna kill you", but supposing he did...

Juror #10: [interrupting] You didn't prove it at all. What're you talking about?

Juror #8: But supposing he really *did* hear it. This phrase, how many times have all of us used it? Probably thousands. "I could kill you for that, darling." "Junior, you do that once more and I'm gonna kill you." "Get in there, Rocky, and kill him!"... See, we say it every day. That doesn't mean we're gonna kill anyone.

Juror #3: Wait a minute, what are you trying to give us here? The phrase was "I'm gonna kill you"; the kid yelled it at the top of his lungs... Don't tell me he didn't mean it! Anybody says a thing like that the way he said it, they mean it!

Juror #2: Well, gee now, I don't know.

[Everyone looks at #2]

Juror #2: I remember I was arguing with the guy I work next to at the bank a couple of weeks ago. He called me an idiot, so I yelled at him.

Juror #3: [pointing at #8] Now listen, this guy's tryin' to make you believe things that aren't so! The kid said he was gonna kill him, and he *did* kill him!

Juror #8: Let me ask you this: do you really think the kid would shout out a thing like that so the whole neighborhood could hear him? I don't think so; he's much to bright for that.

Juror #10: Bright? He's a common, ignorant slob. He don't even speak good English.

Juror #11: [looking up] He *doesn't* even speak good English.

"Saudade da Bahia" by Dorival Caymmi (in Portuguese)



Ai, ai que saudade eu tenho da Bahia
Ai, se eu escutasse o que mamãe dizia:
"Bem, não vá deixar a sua mãe aflita
a gente faz o que o coração dita
mas esse mundo é feito de maldade e ilusão"

Ai, se eu escutasse hoje não sofria
Ai, esta saudade dentro do meu peito
Ai, se ter saudade é ter algum defeito
eu, pelo menos, mereço o direito
de ter alguém com quem eu
possa me confessar

Ponha-se no meu lugar
e veja como sofre um homem infeliz
que teve que desabafar
dizendo a todo mundo
o que ninguém diz.

Vejam que situação
e vejam como sofre um pobre coração
pobre de quem acredita
na glória e no dinheiro
para ser feliz.

 "Saudade da Bahia" sung by Dorival Caymmi

Tuesday, 26 August 2014

“O Sorriso do Tio Pavel Pleffel” (Chapter VI) by José Thiesen (in Portuguese)



       Houve um momento de silêncio e os nadas voltaram para o obscuro dos cantos onde se escondiam. O gato se pôs a ronronar, roçando-se em minha perna.
            - Vamos embora, ordenou o sr. Pleffel, já indo para a porta.
            O tio lhe seguiu os passos, dizendo:
- Mas Pavel, quase conseguiste... Talvez se...
- Sim, eu “quase” consegui sorrir, ecoou o Pavel.
A porta abriu-se para sairmos mas o tio Clóvis pegou-me pelo braço e com um sorriso bondoso me disse:
- Não te assustes e cuide de meu sobrinho.
Beijou-me a testa e corri para junto de Pavel que já se andiantara bastante.
Deixamos a casa e o sr. Pavel estava muito sério, o tempo todo. Eu estava profundamente intimidado com tudo o que vira na casa do tio Clóvis, os nadas, eu pisando o universo e, mais que tudo, o misterioso sorriso que não nascera.
Qual o significado de tudo aquilo?
Não falamos um com o outro, pelo caminho, imerso que estávamos em nossos pensamentos.
Finalmente chegamos em frente da pensão onde ele morava. Ele parou por um momento, agachou-se à minha frente e disse:
- Trazes-me sorte, menino. Como jamais imaginei que um dia teria. Estás confrontado com algo que é muito maior do que tu, mas não te assutes, pois ainda tens muito que aprender e tudo virá ao seu tempo.
Beijou-me a testa e continuou:
- Volte para casa, antes que tua mãe se preocupe contigo.
Obedeci-lhe, pensando em como poderia eu, pirralho de nove anos, cuidar de um homem tal como Pavel Pleffel.