Wednesday 24 September 2014

“A Uma Atriz” by Castro Alves (in Portuguese)



 (no seu benefício)


Branco cisne, que vogavas
Das harmonias no mar,
Pomba errante de outros climas,
Vieste aos cerros pousar.
Inda bem. Sob os palmares
Na voz do condor, dos mares,
Das serranias, dos céus...
Sente o homem — que é poeta.
Sente o vate — que é profeta
Sente o profeta — que é Deus.

Há alguma cousa de grande
Deste mundo na amplidão,
Como que a face do Eterno
Palpita na criação...
E o homem que olha o deserto,
Diz consigo: "Deus 'stá perto
Que a grandeza é o Criador".
E, sob as paternas vistas,
Larga rédeas às conquistas,
Pede as asas ao condor.

Inda bem. A glória é isto...
É ser tudo... é ser qual Deus...
Agitar as selvas d'alma
Ao sopro dos lábios teus ...
Dizer ao peito — suspira!
Dizer à mente — delira!
A glória inda é mais: É ver
Homens, que tremem — se tremes!
Homens, que gemem — se gemes!
Que morrem — se vais morrer!

A glória é ter,com o tridente
Refreada a multidão,
— Oceano de pensamentos
Que tu agitas co'a mão!
— Montanha feita de idéias,
Que sustenta as epopéias
Que é do gênio pedestal!
— Harpa imensa feita de almas,
Que rompe em hinos e palmas,
Ao teu toque divinal.

Mas esqueceste... Não basta
"Chegar, olhar e vencer"
Do gênio a maior grandeza
O ser divino é sofrer.
Diz! ... Quando ouves a torrente
Do entusiasmo na enchente
Vir espumar-te lauréis;
Nest'hora grande não sentes
Longe os silvos das serpentes,
Que tentam morder-te os pés?

Inda é a glória — rainha
Que jamais caminha só.
Aí! Quem sobe ao Capitólio
Vai precedido de pó.
Porém tu zombas da inveja...
Se à noite o raio lampeja
Tu fazes dele um clarão!
Pela tormenta embalada
Ao som da orquestra arroubada
Vais-te perder n'amplidão.

Tuesday 23 September 2014

"O Sorriso do Tio Pavel Pleffel" (Chapter X) by José Thiesen (in Portuguese)



            Quando foi uma vez, duas cacatuas muito alegres e tagarelas chamadas Cacatuca e Cacatéia acercaram-se de mim.
            - Pois sim, menino!
            - O Dôdo faz essa festa uma vez por ano.
            - Sempre assim...
            - Muito animadas e alegres.
            - É verdade que por vezes há penetras.
            - Como em toda a festa.
            - Exatamente!
            - Pobrezinho do Urubú!
            - Tem má fama!
            - Tão burrinho!
            - É sempre ele quem traz os penetras.
            - Deixa-se enganar.
            - Mas toca o violão como ninguém!
            - Uma vez foi o Jabuti quem veio.
            - O Urubú o percebeu escondido no seu violão...
            - ...quando voltava pra terra, depois da festa...
- ...e o deixou cair do céu!
- Por isso o jabuti tem o casco quebrado daquele jeito!
- Muito quebrado!
            - Foi o que eu disse!
            - Exatamente!
            - Da outra vez foi o Sapo!
            - Comeu tanto...
            - ...com aquela boca tão grande...
- ... que ficou todo pesado e quando se escondeu no violão do Urubú...
- ... o Urubú não aguentou e deixou o violão cair!
- O Sapo caiu e esborrachou-se todo no chão!
- Por isso o Sapo é achatado.
- Antes ele era todo esticadinho!
- Bem esticadinho!
- Foi o que eu disse!
- Exatamente!
Mas as duas tagarelavam tanto que meus ouvidos começaram a arder e acabei por deixá-las.

Sunday 21 September 2014

Letter from Guigo I to a Friend About the Life in Solitude (translated into Portuguese)


    Ao Reverendo…, Guigo, o menor dos servos da Cruz que estão em Chartreuse: « Viver e morrer por Cristo » (Cf. Fl 1,21).
    Um imagina feliz o outro. A meu ver, aquele que o é verdadeiramente não é o ambicioso que luta para conseguir honras altivas num palácio, mas aquele que escolhe levar uma vida simples e pobre no deserto, que gosta de aplicar-se à sabedoria no repouso, e deseja com ardor permanecer sentado e solitário no silêncio (Cf. Lm 3,28).
    Porque, brilhar nas honras, estar elevado em dignidade, é, a meu ver, cosia pouco tranqüila, exposta a perigos, sujeita a cuidados, suspeita para muitos, e para ninguém segura. Alegre no princípio, equívoca com a prática, é triste no seu termo. Aplaude os indignos, indigna-se contra os bons, e a maioria das vezes, zomba de uns e de outros. Fazendo muitos infelizes, não faz ninguém feliz, nem satisfeito.
    Em compensação, a vida pobre e solitária, pesada no começo, fácil no seu curso, torna-se no fim celeste. Está firme nas provas, confiante nas incertezas, modesta no êxito. É frugal na alimentação, simples no vestir, reservada nas palavras, casta nos costumes, e objeto dos maiores desejos porque não deseja absolutamente nada. Sente muitas vezes o aguilhão do arrependimento pelos seus pecados passados, evita-os no presente e previne-se contra eles no futuro. Espera na misericórdia, mas não contam com os seus méritos. Aspirando vivamente aos bens celestiais, rejeita os da terra. Esforça-se por adquirir uma conduta provada, mantém-se nela com perseverança, e guarda-a para sempre. Entrega-se aos jejuns pelo hábito da Cruz, mas aceita alimentos por exigência do corpo. Dispõe uma e outra coisa com a mais perfeita medida; com efeito, domina a gula sempre que decide comer, e o orgulho, sempre que quer jejuar. Dedica-se ao estudo, mas sobretudo das Escrituras e de obras religiosas nas quais o miolo do sentido a mantém mais ocupada que a escuma das palavras. E, o que é mais surpreendente e mais admirável, permanece sem cessar no repouso, e, ao mesmo tempo, nunca está ociosa. Multiplica as suas ocupações, de modo a faltar-lhe a maioria das vezes o tempo mais que atividades diversas. E lamenta-se mais freqüentemente da falta de tempo que do aborrecimento do trabalho.
    E que mais dizer? É um belo tema aconselhar o repouso, mas semelhante exortação exige um espírito senhor de si que, cuidadoso com o seu próprio bem, desdenhe intrometer-se nos assuntos públicos ou alheios; um espírito que sirva sob Cristo na paz de forma a evitar ser simultaneamente soldado de Deus e defensor do mundo, e que saiba perfeitamente que não pode gozar aqui com este século e reinar no outro com o Senhor.
    Mas estas coisas e outras semelhantes são muito pouco se te lembras do que bebeu sobre o patíbulo Aquele que te convida a reinar com Ele. De bom ou mal grado, importa-te seguir o exemplo de Cristo na sua pobreza, se queres ter parte em Cristo nas suas riquezas. « Se participamos nos seus sofrimentos, diz o Apóstolo, « reinaremos também com Ele » (Rm 8,17), « Se morremos com Cristo, viveremos também com Ele » (2Tim 2, 11-12). O próprio Mediador respondeu aos dois discípulos que Lhe pediam para se sentarem um à sua direita e o outro à sua esquerda : « Podeis beber o cálice que Eu vou beber? » (Mt. 20, 21-22). Mostrava-nos deste modo que se chega aos festins prometidos dos Patriarcas e ao néctar das taças celestes pelos cálices das amarguras terrestres.
    E porque a amizade já alimenta a confiança e que tu, meu apreciado amigo em Cristo, sempre me foste caro desde o dia em que te conheci, exorto-te, animo-te e peço-te, visto que és prudente, ponderado, sábio e muito hábil, que subtraias ao mundo esse pouco da tua vida que ainda não foi consumido; não tardes em queimá-lo para Deus, como um sacrifício vespertino (Ps 140,2), depondo-o sobre o fogo da caridade (Cf. Lv 1,17), a fim de que, a exemplo de Cristo, sejas tu próprio sacerdote e também « Vitima (em sacrifício de) agradável odor para Deus » (Ef 5,2) e para os homens.
    Mas, a fim de compreenderes mais plenamente para onde tende o ardor de todo este discurso, indico brevemente à prudência do teu juízo qual é o voto do meu coração e ao mesmo tempo o seu conselho: como homem de coração generoso e nobre, abraça o nosso gênero de vida, tendo em vista a tua salvação eterna, e, feito novo recruta de Cristo, vigiarás, fazendo uma guarda santa no campo da milícia celeste, depois de teres posto à cinta a tua espada (2Tm 2,11-12), por causa dos temores da noite (Ct 3,8).
    Portanto, como se trata para ti duma coisa boa no seu empreendimento, fácil na sua realização e feliz no seu acabamento, peço-te que ponhas na consecução de um tão justo “negócio” tanta aplicação quanta a graça divina para tal te conceder. Onde e quando deves fazê-lo, deixo a escolha decisiva disso à tua sagacidade. Mas não creio de forma nenhuma que um prazo ou demora nisso seja algo vantajoso para ti.
    Mas não me alongarei mais sobre tal assunto, receoso de que este discurso rude e deselegante te moleste como freqüentador do Palácio e da Corte. Tenha, pois, esta carta um fim e uma medida, coisa que não terá nunca o meu grande afeto por ti.

Saturday 20 September 2014

“The Crosses Grow On Anzio” by Audie Murphy (in English)



Oh, gather 'round me, comrades; and
listen while I speak
Of a war, a war, a war where hell is
six feet deep.
Along the shore, the cannons roar. Oh
how can a soldier sleep?
The going's slow on Anzio. And hell is
six feet deep.

Praise be to God for this captured sod that
rich with blood does seep.
With yours and mine, like butchered
swine's; and hell is six feet deep.
That death awaits there's no debate;
no triumph will we reap.
The crosses grow on Anzio, where hell is
six feet deep.

1948

Friday 19 September 2014

“Rosa Morena” by Dorival Caymmi (in Portuguese)



Onde vais morena Rosa
Com essa rosa no cabelo
E esse andar de moça prosa

Morena
Morena Rosa

Rosa morena o samba está esperando
Esperando pra te ver
Deixa de lado esta coisa de dengosa
Anda, Rosa, vem me ver

Deixa de lado esta pose
Vem pro samba vem sambar
Que o pessoal tá cansado de esperar
Ó Rosa
Que o pessoal tá cansado de esperar
Morena Rosa
Que o pessoal tá cansado de esperar
Viu Rosa?

"Rosa Morena" sung by João Gilberto

Thursday 18 September 2014

“A Esmola” by Belmiro Braga (in Portuguese)



Ao pobre dando esmola não procuro
transformar o meu ato num troféu,
porque ela apenas representa o juro
de quantia maior que devo ao céu.

À minha esmola, muito embora pouca,
junto palavras de consolação:
assim como alimenta o pão à boca,
alimenta o carinho ao coração.

A esmola sempre deve ser oculta
aos olhares do próximo, porque,
quanto mais a escondermos, mais avulta
ela aos olhos de Deus, que tudo vê...